TRÊS

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   A primeira coisa que eu via, logo que chegava no bar para trabalhar, era a enorme poltrona feia e mal cheirosa que Hector, meu chefe, havia afirmado, com convicção, que era bonita e que claramente não era. Logo depois, havia o som da música que Oscar, o cara que trabalhava comigo e que há tempos tinha-o como um grande e importante amigo, costumava escutar. O som da música clássica preenchia toda a extensão do ambiente enquanto meu amigo remexia no estoque de bebidas e serviu dois copos. Um para ele, e outro para mim. Ele sorriu ao me ver. Era alto, lindo, muito musculoso e, quem não o conhecia, costumava teme-lo.

Eu costumava mudar a música só para irritá-lo. Estávamos apenas ele e eu naquele horário. Caminhei até ele, tomando a dose que ele deixou para mim rapidamente.

 — Como foi seu dia, anjinho? — ele questionou. As sobrancelhas grossas e loiras se erguendo em minha direção em tom de dúvida.

A minha face não o enganava, eu sabia. Oscar já me conhecia bem demais para saber quando eu estava, simplesmente e totalmente, exausta. Eu o encarei. Meu cabelo estava terrível e meus olhos eram extremamente fundos. Resultado de noites mal dormidas. Ele sorriu e colocou um prato com um sanduíche enorme à minha frente. Eu estava mesmo com fome. Agradeci silenciosamente, sentando-me no banquinho em frente a ele.

Houve um tempo em que fomos algo a mais. Quando comecei a trabalhar no bar, jurei que aquele era o homem mais bonito que já havia visto em toda a minha vida naquele ponto. Com os músculos saltando maliciosamente através da blusa branca. As tatuagens adornando seus braços. A sobrancelha grossa, o rosto imponente, o cabelo loiro até a altura dos ombros e o sorriso, capaz de fazê-la derreter. Ele devia ter, mais ou menos, uns dez anos a mais que ela e, no início, deixava-a extremamente desconfortável. Como alguém podia ser tão bonito?

A sensação de desconforto foi passando assim que eu comecei a conhecê-lo melhor e vi que era uma pessoa incrível e se estar perto. E bem, bem perto mesmo. Algum tempo depois, era bem ali naquele estabelecimento escuro que transavamos quase diariamente. Sem sentimentos. Somente por prazer e porque sabíamos que éramos bons em fazer isso. Depois passou e vimos que, era principalmente como amigos que nos dávamos bem.

Voltando a realidade, apanhei meus cadernos. Enquanto o bar não abria, eu podia ficar ali, revisando o que precisava e adiantando algumas coisas importantes.

— Talvez o meu anjinho precise de outra dose, estou certo? — sugeriu.

Sorri maliciosamente, apenas por diversão. Era algo que fazíamos. Nos provocar, até que o outro, finalmente, desistisse.

— Aliás, já comentei o quão você está bonita hoje, anjinho? — deu uma piscadela, devolvendo o flerte.

— Isso é porque não tomo banho desde de manhã, Oscar. — abri um sorriso em sua direção.

— Ah, mas você, doce Ayla, é uma beleza sempre. — continuou, piscando um dos olhos travessamente.

Em outro momento, numa época não muito distante, era ali onde as primeiras faíscas de um incêndio que quase nunca parecia conseguir ser contido, começavam. Tudo acabava com Oscar e eu queimando, em cada canto daquele bar escuro. Sem nada nos impedindo. Corpos colados e quentes, pedindo por um alívio que éramos muito bons em conceder um para o outro.

Voltei meus olhos para os livros, sabendo que, ainda que não fizessem mais aquilo, a lembrança acendia, tanto nele quanto em mim, uma vontade grande que latejava em cada canto de nossos corpos sedentos.

— Ah, quase esqueci de te perguntar, anjinho. — Oscar capturou minha atenção mais uma vez para si. — O chefinho perguntou se não desejaríamos fazer hora extra no sábado. Paga em dobro. A casa vai estar cheia para uma despedida de solteira tosca. E aí?

— Claro. — nem me dei espaço para pensar. De qualquer forma, o dinheiro seria muito bem-vindo.

Ele sorriu em resposta.

— Ainda não mencionei de quem vai ser a festa. De um babaca completo organizada por um cara ainda mais babaca.

— Eu ouvi isso, seu merdinha. — uma terceira voz, masculina, preencheu o âmbiente.

Voltei-me para trás, surpresa. Não o tinha visto entrar. Mas, de qualquer forma, ele estava vindo de dentro do estoque. O que me pareceu estranho, já que eu nunca o tinha visto.

— E por acaso eu falei alguma mentira? — o outro brincou.

Fiquei ainda mais curiosa, porque Oscar se portava com o estranho como se já o conhecesse há tempos.

— Não esqueça de que agora serei seu chefe. — o outro provou, com um sorriso ainda mais malicioso.

Continuaram se provocando e não pareciam realmente notar minha presença naquele espaço. Até que, virando-se em minha direção, o estranho franziu a testa levemente e um sorriso travesso brincou no canto de seus lábios avermelhados.

— E quem é essa?

Foi a minha vez de franzir a testar.

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bjxs,

trixie

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