Ele riu, mas não havia alegria naquele som. Era um riso oco, cheio de ironia e algo muito mais sombrio — ressentimento, dor e uma pitada de triunfo amargo. Seus olhos, fixos em mim, brilhavam com uma intensidade assustadora, carregados de anos de mágoa.
— Sabe, Rebeca, eu espero há muito tempo por esse momento. Esperei muito pelo dia em que você ficaria cara a cara com o que deixou para trás, com o que abandonou. — Ele deu um passo em minha direção, sua postura rígida. — Eu era só uma criança quando você me deixou... e foi viver sua "vida perfeita".
As palavras dele caíram sobre mim como uma chuva de punhais. Eu senti o peso de cada sílaba, o rancor pulsando em seu tom.
— Mas, para ser sincero, sabe por que resolvi aparecer agora? Por que estou aqui? — Ele inclinou levemente a cabeça, os lábios formando um sorriso amargo. — Porque eu cansei do jogo. Eu te dei um prazo, não foi? Seis meses. SEIS MESES para você descobrir tudo. Achei que você não usariam nem metade desse tempo, que dois meses seria suficiente. Achei que você e sua "brilhante" equipe já teriam chegado a mim nesse ponto.
Ele balançou a cabeça lentamente, como se fosse um professor frustrado com um aluno medíocre.
— Mas vocês são tão... devagares. — Sua voz ganhou um tom de desprezo, como se cuspisse as palavras. — A única que chegou perto de alguma coisa foi sua namoradinha, a delegada. Vou dar esse crédito a ela. Ela tem insistido há tempos que eu estava vivo, mas, claro, ninguém levou realmente a sério, não é? Insistiam em tentar achar outras opções.
Meu coração apertou ao ouvir aquilo. Simone... ela sabia, ela sempre soube.
— Foi então que eu resolvi que bastava. Que eu mesmo ia encerrar essa brincadeira. — Ele deu outro passo, me cercando como um predador. — Mas sabe o que é engraçado? Eu quase estraguei tudo. Naquele evento... você quase me pegou.
Minha respiração falhou ao lembrar do encontro que ainda parecia um pesadelo distante.
— Eu... perdi o foco. Falei mais do que devia. — Ele sorriu com desdém, como se zombasse de si mesmo. — Era pra ser só um encontro breve, só o suficiente pra te deixar desconfortável, pra mexer com sua cabeça. Não era o momento do xeque-mate ainda.
Ele parou, seu olhar ficando mais sombrio, mais duro.
— Mas aí você foi àquela entrevista. — Sua voz era baixa, carregada de uma raiva quase palpável. — E você teve a audácia de dizer que ser adotada foi a melhor coisa que te aconteceu. Que você foi feliz com sua família. Que era filha única.
Eu prendi a respiração, as palavras dele se cravando em mim.
— Filha única... — Ele repetiu, como se as palavras fossem veneno. — Aquilo me tirou do sério, Rebeca. Me tirou do sério de um jeito que você não tem ideia. Você... apagou a minha existência, como se eu nunca tivesse estado lá.
Ele se inclinou levemente para frente, seus olhos queimando nos meus.
— Eu não podia tolerar isso. Não podia deixar você continuar fingindo que eu nunca existi.
Ele respirou fundo, endireitando a postura, mas sua voz continuava carregada de raiva.
— Foi aí que eu soube. Que o jogo tinha acabado. Não havia mais porque esperar.
Eu finalmente reuni forças para falar, minha voz saindo trêmula, mas firme o suficiente para cortar o silêncio carregado:
— Matheus... Eu não sabia. — Ele estreitou os olhos, mas eu continuei, tentando manter a calma. — Eu era apenas um bebê quando fomos separados. Eu não lembrava de você. Ninguém nunca me contou. Não tinha como eu saber...
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Conexões Perigosas
Mystery / ThrillerHomicídios frequentes e de uma violência extrema assolam a cidade de São Paulo. O Departamento de Homicídios da Polícia Civil monta uma força tarefa para investigar e solucionar esses crimes, antes que uma crise seja estabelecida. A jornalista inves...