Capítulo II

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Passava da meia noite quando Craig e eu enfim terminamos de discutir sobre quem iria dirigir e saímos do Forte em direção a Birden, uma cidadezinha que fica há mais ou menos duas horas de Arnnen. O trabalho não é difícil já que tudo que devemos fazer é ir até lá e tentar não chamar muita atenção. Bem, seria fácil, se não fosse Birden. Lá tem uma fama meio ruim. Talvez seja o fato de alguns deles se alimentarem de carne humana de vez em quando ou talvez o fato de se irritarem com muita facilidade. Assim como Craig e eu.

Me encolho no banco do carona - eu perdi a discussão -, apertando os braços contra o peito para amenizar o frio. Eu deveria ter vestido algo quente antes de vir.

— Fez algo de interessante hoje? — Pergunto, entediada o suficiente para iniciar uma conversa.

Craig passa a mão pela barba distraído, provavelmente decidindo se vai se dignar a responder ou não.

—Nada de mais. Passei o dia fazendo rondas.

— Rondas? Pensei que você fosse o favorito dela — Eu sorrio com implicância, apesar de a dúvida ser genuína. Ficar dando voltas e voltas pela cidade não é exatamente o melhor passatempo do mundo e esse serviço é geralmente prestado pelos vigias que estão abaixo de nós.

— E você? — Ele retruca, ignorando o meu sarcasmo — Onde conseguiu a garota? Aposto que a tirou de algum pai violento ou quem sabe do seu leito de morte. Qualquer coisa para se sentir melhor, não é mesmo?

Não respondo e fecho a cara, irritada. Não perco muito tempo pensando nas coisas horríveis que faço, mas quando acontece, a sensação de culpa queima em meu estômago. Eu sei que preciso proteger meu irmão, mas o que eu faço não é exatamente justificável. E hoje foi só mais um dia. Eu sabia que tinha que conseguir alguém saudável dessa vez. Se Anabele se intoxicasse novamente por minha causa, ela poderia descontar em Isaac. E a vida do meu irmão nunca foi negociável.

— Vamos, Juliet — ele insiste — Qual o problema em contar? Omitir os detalhes sórdidos não faz de você uma pessoa muito melhor.

Penso em mandá-lo calar a boca, ou melhor, fazê-lo calar, mas mudo de ideia e ao invés disso, proponho:

— Conto onde encontrei a garota se você contar porque Anabele está diminuindo a segurança. Hoje os portões estavam fechados e eu não vi ninguém além de dois vigias. Tem algo rolando?

Craig sorri e parece pensar no assunto.

— Tudo bem, eu conto o que eu sei — Ele responde, desviando a atenção da estrada para me encarar — Mas você começa.

Respiro fundo e então começo a falar, deixando as palavras saírem da minha boca, deixando um gosto amargo no lugar.

— Faz alguns dias que Anabele não se alimenta ou faz qualquer coisa importante. Não que eu saiba pelo menos — acrescento. Todo mundo sabe que ele é o preferido dela. Mas Craig não morde a isca, então eu continuo — Há alguns dias ela me mandou buscar uma pessoa, jovem de preferência. Então eu tive a ideia de ir até um dos acampamentos nômades que ficam perto das montanhas. Observei por algumas horas, de longe, obviamente. Não queria ser vista. Reparei quando a garota se separou do seu grupo, então a segui, amordacei e levei para o Forte. Sem grandes surpresas. Foi isso.

Ao contar a história, tomo o cuidado de tirar qualquer emoção da minha voz, fingindo que nada disso me afeta. Craig usaria isso contra mim mais tarde, nem que fosse somente para se divertir.

— Mas e quanto à família dela e seus amigos? Eles vão procurá-la. Devia ter ido em algum lugar mais distante — Ele opina.

— Como se eu fosse uma amadora. Eles não me viram, Craig. Não têm por onde começar. Além do mais eles não sabem sobre Anabele. Eles não sabem de nada. Pare de fiscalizar meu trabalho e diga logo o que sabe.

Lionheart - Livro IWhere stories live. Discover now