2° Não confie em mortais

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Não estou exagerando quando digo que o lugar que vocês chamam de Terra, eu chamo de inferno. Muita gente para pouco espaço, pouco espaço para muita gente. Agora eu andava pelas calçadas apertadas com Megumi ao meu lado, claro, ele não tiraria os olhos de mim nem por um segundo, eu era o que chamavam de “rebelde”. Já que me chamavam assim, por que não fazer jus ao título, não é?

O Sol da Terra era muito quente, os ruídos ocasionados pelo engarrafamento eram altos demais e as pessoas mal-educadas, pareciam sempre estar com pressa. Pelo menos a loja de doces localizada em uma esquina ao lado de uma barbearia era a melhor e mais bonita que eu já tinha visto.

Eu andava com meu pirulito na boca, sem rumo e sem a mínima ideia de onde eu estava e para onde eu iria.

— Para onde você está indo? — a voz irritante da minha sombra surgiu atrás de mim.

— Não sei — dei de ombros — Quero comprar alguma coisa mais bonita para vestir.

Em uma das minhas desviadas de olhar me deparei com uma loja de roupas, olhei-me no reflexo da vitrine, eu ainda usava aquele uniforme hor-ro-ro-so e não tive tempo de fazer as malas. Em outras palavras, eu estava deplorável.
As pessoas passavam por mim fazendo careta, como se eu fosse algum tipo de maluco que fugiu do hospício, o que eu estranhei, deveriam estar admiradas por me ver, então me virei para trás e tirei o pirulito da boca:

— Eu tô cagado? — questionei Megumi, que abriu um sorriso.

— Não, mas está falando com um fantasma — ele deu de ombros e arrumou a mochila preta que levava nas costas.

Aquele maldito...

— Você está invisível?!

Ele apenas deu de ombros outra vez e olhou para a vitrine de uma barbearia local, onde havia homens barbudos e enfeites que giravam. Eu não disse mais nada, afinal, aquele malditinho estava invisível para quem não fosse uma criatura mágica e eu não queria passar mais vergonha.

Depois de mais um tempo andando pelas calçadas sujas da cidade, meu estômago roncou, reclamando de fome, então comecei a prestar mais atenção a minha volta, procurando algum lugar para comer que não parecesse que haviam ratos ou algum outro tipo de transmissor de doenças, não sei o quanto de benefícios de cupido foram tirados de mim quando eu fui arremessado para esse fim de mundo.

Minha linha de raciocínio foi cortada no susto quando senti alguém vir de encontrão com meu braço. Olhei para baixo e vi uma mulher alta — mas não tão alta como eu —, com os cabelos castanhos cortados em um chanel e um cigarro entre os lábios.

— Ah, sinto muito — ela resmungou dando um passo para trás. Era bom que estivesse sentindo mesmo, quase derrubei meus óculos por causa de sua desatenção. — Tem um isqueiro?

Engasguei com o ar, não era possível que alguém olhasse minha pele reluzente, meus dentes alinhadinhos e meu cabelo perfeito e deduzisse que eu fumava.

— Não — respondi atravessado, amargurado pelo pré-julgamento equivocado.

A mulher suspirou e guardou o cigarro que tinha entre os lábios de volta no maço. Encarei um pouco ela, uma pinta abaixo de um dos olhos me chamou atenção, ela se mexia quando a mulher falava e era tão escura que parecia ser feita de caneta.

Ela me encarou de volta.

— Tudo bem?

Antes que eu respondesse, minha barriga roncou outra vez, tão alto como a carteira de Utahime quando estávamos no “Instituto de ensino para cupidos” e eu desfiz o laço no cabelo dela pela... qual era? Quinta vez?

𝐄𝐬𝐭𝐮́𝐩𝐢𝐝𝐨 𝐜𝐮𝐩𝐢𝐝𝐨Where stories live. Discover now