CAPÍTULO CINCO - A Garota Do Espelho

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A semana passa numa lentidão que me deixa irritada. O fato de Lua parecer cada vez mais estranha, especialmente quando eu tentava tocar no assunto do meu professor novo, ajuda também minha falta de paciência. Para piorar tudo, por onde eu ando no prédio de História, Pedro está lá com um sorriso muito estranho e me cumprimentando. Claro que ele parecia cumprimentar todos os outros alunos que passam por ele, mas nenhum parecia ganhar um sorriso esquisito de brinde nessas interações. Nem precisavam lidar com um engasgo discreto na hora da chamada.

Eu queria voltar no tempo para bater em quem disse que, na faculdade, professor não se importa com seu nome ou perde tempo esperando você gritar presença. Se eu soubesse que seria uma propaganda tão enganosa assim, nem teria me matriculado.

Não é de se espantar que meu humor estivesse do demônio na sexta-feira e que não melhorava nenhum pouco porque parecia que todos os habitantes de Ponte Belo resolveram tirar aquele dia para beber café e jogar papo fora dentro do meu trabalho. Pelo amor da deusa, eu merecia uma diversão depois de uma semana tão estressante!

— Nossa Senhora das Mulheres Loucas Por Uma Transa – resmungo, quando o Mundo da Lua continua lotado. – Eu só quero curtir minha sexta-feira de caloura!

Lua arqueia a sobrancelha para mim, mas evito encará-la para não compreender a mensagem subliminar de seu olhar. Ela detesta que reclame na frente dos clientes e provavelmente ela tem razão. Mas é um pouco difícil não reclamar quando você tem que atender a população inteira da sua cidade.

— Ei! – a voz masculina me faz erguer os olhos e eu abro meu maior sorriso pelo anjo salvador do meio da noite.

Caio arqueia as duas sobrancelhas para mim quando vê meu olhar, mas estou muito contente por vê-lo para me importar. Não que existisse algum dia na vida que uma mulher ficasse triste por colocar os olhos nele: Caio é bonito demais para não apreciar, com seus um metro e oitenta de altura, cabelos quase pretos, olhos castanhos, corpo de quem corria duas vezes por dia e um sorriso capaz de derreter metade das calotas polares. É uma pena que ele seja o crush eterno da minha patroa e melhor amiga, se não eu provavelmente já teria dado um jeito de ir para a cama com ele. Não que isso fosse difícil – ele parecia ter o mesmo critério que eu para transar com alguém.

— O que estou perdendo? – Caio cruza os braços sobre o peito, me encarando.

— Ah, nada – Lua diz, dando o troco para o cliente a sua frente. – Quem está perdendo é Vênus, sendo obrigada a trabalhar em vez de ir a uma festa.

— Não posso culpá-la pelo mal humor. As festas são as melhores coisas da faculdade.

— Rá! – comemoro, enquanto Lua cerra os olhos para o melhor amigo. Mas ele continua sorrindo.

— Vá se divertir, Vênus. – Ele mexe a mão. – Eu ajudo sua patroa.

Não espero que ele ofereça uma segunda vez ou que Luana reclame – antes que uma das duas coisas aconteça, jogo meu avental para ele e passo pelo balcão.

— Você não trabalha aqui – Lua fala, por fim. – Não é função sua.

— O que eu posso dizer? – Ele dá de ombros, sorrindo. – Amigos são para isso, não é?

A alfinetada é para mim e eu sei disso. Mas sinto a dor pela minha amiga ouvir, pela milionésima vez, que o cara que ela gosta só a considera amiga. Dar dois tiros no coração doeria menos do que se apaixonar por alguém como Caio Bittencourt, que foge de relacionamentos sérios quase tanto quanto eu. E, para piorar, não enxerga um palmo a frente de seu próprio nariz – porque só mesmo sendo muito cego para não perceber que Luana é louca por ele.

Tudo Aquilo Que Eu Não Sou (REPOSTANDO)Where stories live. Discover now