Despertar

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"Haverá um tempo em que o reino precisará de você, Clarissa. Danian significa 'acender'. Lembre-se disso. No dia em que acordar, você entenderá e saberá o que fazer."

As palavras, ditas havia tantos anos, ecoavam na mente da jovem Clarissa Whitaker enquanto ela tentava sair do casulo

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As palavras, ditas havia tantos anos, ecoavam na mente da jovem Clarissa Whitaker enquanto ela tentava sair do casulo. Aquilo era um casulo, não era? Os braços estavam apertados junto ao corpo, mas aos poucos ganhavam espaço. Frestas finas deixavam feixes de luz entrar. Seus olhos doeram. Ela não se lembrava de ter ido parar naquele lugar. Ela não se lembrava de quase nada, na verdade. Inspirou e expirou com força algumas vezes. Aos poucos, mexeu os membros.

Clarissa estava deitada. Sobre seu corpo, cascas duras e de cor castanha que pareciam madeira. Levantar foi difícil. Quando conseguiu, pisou com os pés descalços na terra úmida e analisou o entorno. Ela estava dormindo dentro de uma noz gigante? No meio da floresta?

_ Isso não faz sentido. - murmurou e sentiu a garganta arranhar, como se estivesse enferrujada.

Olhou para baixo e percebeu algo diferente em
si mesma. Reconheceu o vestido azul que usava. Recordava até de ter bordado as mangas com flores para que ficasse mais bonito, mas não entendia porque ele estava tão apertado e puído, porque seu colo tinha estourado os botões do corpete, porque as costuras pareciam sufocá-la.

Vasculhou o interior da noz em busca de alguma pista, mas só encontrou seus sapatos, que como todo o resto, não cabiam mais nela.

No dia em que acordar, você entenderá e saberá o que fazer.

Pôde ouvir claramente a voz da velha senhora Hexe. Como se a curandeira estivesse falando com ela naquele segundo. Mas Clarissa não entendia nada. E definitivamente não sabia o que fazer.

O que tinha acontecido? Clarissa forçou a mente, mas, quanto mais tentava, menos resultado parecia ter. Ela precisava voltar para casa, para o castelo. Mais uma vez deu uma volta em torno de si mesma. Não sabia onde estava. Não sabia.

Um segundo antes de ser tomada por completo pelo pânico, ela ouviu o som calmo e relaxante de água corrente. Com a certeza de estar perto da cachoeira, correu o mais rápido que os pés sem proteção e a roupa apertada permitiam.

Foi só quando chegou à beira da lagoa que percebeu que tinha sede. Agachou-se entre as pedras e bebeu do líquido cristalino com as mãos em concha. Ela ainda não compreendia o que estava acontecendo, mas o pequeno lago lhe dava uma boa pista de onde estava e era um ótimo ponto de partida para voltar à aldeia e ao castelo de Danian. Levantou-se e desfrutou do frescor em seus pés. Assistiu a água tremular em seus tornozelos até se tornar plana e brilhante como um espelho.

O problema era que esse espelho não refletia a menina de 13 anos que Clarissa acreditava ser e, sim, uma mulher. Apesar do susto, ela tomou cuidado para não se mover e continuar analisando a si mesma. Não eram só os cabelos que estavam longuíssimos. Seu rosto parecia mais afinado, e ela tinha seios. Seios reais! Clarissa ofegou com o espanto e deu passos desencontrados para trás até sentir que pisava em terra firme.

Mas teve pouco tempo para ponderar o que tinha acabado de ver. Ao olhar para suas costelas percebeu que algo a tinha amarrado. A corda estava frouxa, mas Clarissa tinha sido laçada e não conseguia se desvencilhar. Ainda mexendo os braços, sentiu que um capuz cobria sua visão. Que pesadelo terrível era aquele?  Antes de apagar por completo com o novo susto, ela ouviu uma voz grave:

_ Peço desculpas, senhorita Whitaker. Estou cumprindo ordens.

Era a segunda vez que Clarissa despertava naquele dia, mas, ao menos agora, não estava apertada dentro de uma noz

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Era a segunda vez que Clarissa despertava naquele dia, mas, ao menos agora, não estava apertada dentro de uma noz. Não. Ela estava livre. O que não a impediu de acordar sobressaltada, com um aroma muito doce em seu nariz que a fez tossir.

_ Onde eu estou?

Foi a primeira coisa que conseguiu falar, e novamente sentiu a garganta doer. Dessa vez, porém, não precisou de resposta. Ela sabia onde estava. Dentro da botica da senhora Hexe. Estava tudo ali: os pequenos frascos empilhados em prateleiras de madeira em uma linda uma bagunça organizada, as várias ervas, as ferramentas. Ela conhecia bem aquele lugar, já havia estado ali tantas vezes. Ao olhar para o lado, viu a face redonda e muito enrugada da velhinha, como se fosse uma árvore centenária. Pela primeira vez no dia, sentiu algum alívio. A senhora sorriu e, muito séria, berrou, como se tivesse um amplificador de som na boca:

_ Nossa menina acordou!

O que veio a seguir assustou Clarissa mais do que o grito que a boticária dera em seu ouvido. Ela puxou o tecido que a cobria até o pescoço enquanto assistia atônita. Uma dezena de pessoas adentrou a pequena sala. Eles carregavam uma tina imensa, espelhos, caixas, tecidos e toda sorte de apetrechos. Era um entra e sai enlouquecedor. E a senhora Hexe no meio de tudo, comandando a desordem como uma maestra.

_ Como eu vim parar aqui? O que está acontecendo? - ela gaguejou.

_ Ah, sim, menina Clarissa. Peço desculpas pelo jeito um pouco bruto com que trouxemos você até aqui, mas foi necessário. 

_ Desculpa novamente, senhorita Whitaker!

Era a mesma voz que ouvira na floresta, mas o moço que a dizia parecia tão simpático. Clarissa piscou e procurou a senhora Hexe, ávida por uma explicação.

_ Ah, sim! Pedi ao jovem Isaac, nosso fiel caçador, que a trouxesse para mim. Pedi que ele fosse o mais gentil possível. Foi necessário. Não temos muito tempo!

Isaac, que não parecia nem tão mais velho assim do que ela, piscou, deu um aceno e continuou movendo objetos, conforme os pedidos da velha.

_ Não temos tempo para quê?

A senhora Hexe, que direcionava uma mesa de trabalho ao lado do espelho ao mesmo tempo que em abria caixinhas de contas brilhantes, espanou a mão no ar e sorriu. Falou como se fosse elementar.

_ O casamento, cara Clarissa!

Quem iria casar? Por que ela precisava ir a esse casamento? Por que não tinham tempo? Clarissa sentiu a cabeça rodar e levou uma das mãos à testa.

_ Que casamento?

Dessa vez, a apotecária pareceu mais aborrecida, apesar de manter o sorriso benevolente. Ficou claro para Clarissa que a senhora Hexe realmente estava no que acreditava ser uma missão da maior importância.

_ Do Príncipe Taylor com Missy de Forstland. Agora, se levante! Vamos! Precisamos deixá-la apresentável!

O príncipe Taylor.

De repente, os fatos caíram sobre Clarissa, como pedras rolando uma ribanceira.

Taylor.

Meu Deus.

Sim. Ela se lembrava.

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