Simples palavras - Capítulo 4

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Naufrágios de palavras vagas, cheias de sentimentos.

O pior dos pecados, não, o pior dos pecados para mim. Uma opinião jogada por terra, logo que o cometi. A forma que trocamos os olhares, foi o estopim. 

Isso é o que chamam de paixão?

A batalha por sentimentos. Penso que estou começando a me tornar o que mais temo. Foi nesse momento olhando para o lugar que seria o início do meu jogo, que percebi que a profecia estava se cumprindo para mim. Um flashback  trouxe a tona do que aconteceu.

(...)

— Torna-se anjo caído não combina a você. — Falei, ainda próximos estávamos.

— Torna-se humana não combina com você. — Rebateu ele.

— ...

O vento uivou, passara em questão de segundos, as portas e janelas da pequena cabana do alto da colina se rebatiam. Meu capuz caiu por conta do vento, arriando-se aos meus ombos. Viktor conteve uma visão melhor de meu semblante.

Ele se aproximou ainda mais, esquecendo-se talvez de seus reais objetivos. Ele não podia, isso era tão errado. Eu também estava errada, pois, não me afastava. Sua mão se enroscava sobre meus cabelos, ele me fazia aproximar-se também. Como ele conseguia ser tão calmo?

O tocar de seus lábios aos meus, fez-me explodir internamente, milhares de novas sensações, poderia descrever uma síntese de sentimentos, mas não fiz, apenas curti o momento. Talvez, só talvez, esse fosse meu único motivo de querer viver.

Senti suas mãos em minha cintura, ele a apertava fortemente. Desprendemos, para resgatar o folego que nos fora retirado pelo momento tenso.

— Samaele... Você ainda quer morrer?

Não que eu não gostasse, mas o meu verdadeiro nome me fez acordar, não que eu estivesse dormindo, mas sim porque não acreditava no que tinha acontecido. 

Me afastei dele, pegando a minha foice encostada próximo da janela, a coloquei nas costas, virei-me à sua frente, abri a boca para respondê-lo, porém, reprimi as palavras. Não existia mais nada que poderia dizer que não machucasse ele e isso de alguma maneira me preocupava. 

Coloquei o capuz devidamente em seu lugar e fui em sua direção, ele que ainda esperava uma resposta.

— Essa situação só prova o que você disse, Viktor, estou me tornando a mesma coisa que o antigo anjo da morte, — suspirei — não somos humanos, apesar de que, com esses corpos na terra, tenhamos tal semelhança. Então sim, eu quero morrer, mas não vou levar você comigo. 

Silêncio.

Dor.

Sentimentos.

***

Sábado, 14 de fevereiro.

05:45 PM.

Sábado um dia de farra, festa e confusão. Essa era a programação de Dylan Lefebvre, mas como eu disse era. Seu pai estaria em casa pela primeira vez no mês, porque é piloto de avião, então quase não possui presença, o que fez tornar seu filho emancipado. Entediado, sem muitas alternativas, resolveu tocar violão no parapeito da janela — ela está ali de novo — pensou e decidiu, ele tinha a paleta do violão na sua mão, seria fácil arranjar outra. 

— Ei, você! — jogou para o outro lado da janela. Escutou um pequeno chiado de lá, a garota estava perdida tentando entender o que tinha acontecido, porque caiu alguma coisa na cabeça dela, — Aqui — ela olhou e se apoiou na janela — E aí, o banho tava quente?

— Que banho? AH! Droga! — Apolline se lembrou do dia que sua toalha caiu, já tinha se esquecido desse detalhe. Logo, surgiu um rubor no seu rosto, estava completamente envergonhada. Sabia que ela iria se arrepender de não ter tanto cuidado, deveria deixar a janela fechada mais vezes, assim não vai ter tantas distrações para lidar diariamente, querida.

— É brincadeira, não precisa levar a sério. — ele esperou ela ficar mais calma, achando graça da situação e continuou — E aí, você está bem depois daquele dia?  

— Eu acho que sim... — Apolline tentou formular palavras para agradecê-lo, quando finalmente conseguiu encaixar as palavras certas para isso, foi interrompida por batidas na porta de seu quarto. Dylan apenas observava, esperando que ela tomasse a iniciativa de continuar a conversa — Já vai — respondeu as batidas na porta e olhou novamente para Dylan, suspirou e abriu um sorriso — preciso ir agora, Dylan. 

Qual a dificuldade de agradecer? Não consigo entender os humanos, enxergam complicações em tudo, seja para pedir ajuda, agradecer e principalmente se desculpar. Estão sempre pensando em como falar e não em dizer de fato e quando veem, já é tarde demais para qualquer atitude do gênero. Entretanto, quando estão com raiva não medem palavras e soltam tudo que pensam e aí... entro em ação, sendo assim, ninguém mais tem tempo de desfazer o que já foi feito. 

— Então... tchau. — Respondeu ele. Por um tempo continuou ali, pensando consigo: "como ela descobriu o meu nome?".  No entanto, interrompeu seus pensamentos, porque, para Dylan, era perda de tempo.

Ao abrir a porta, Apolline se deparou com sua mãe.

— Algum problema, mãe?

— Estava conversando com alguém?

— Não estava conversando com ninguém. 

— Sei. De qualquer forma, vim avisar a você que eu já conversei com seu pai sobre o colégio.

— E o que ele disse? — Esperou a resposta ansiosa.

— Nós decidimos que vamos matricular você no colégio St. Mary. — Apolline na mesma hora pulou de alegria, abraçou sua mãe que quase caiu com a reação espontânea da filha que sempre quis estudar com Maria.

Uma coisa que eu sei, é que Apolline ainda vai se arrepender de estar tão feliz agora. Aproveite garota, são seus últimos dias felizes até o inferno que vai passar, St. Lucy não será um lugar de boas lembranças se depender de mim. Acredite, você vai preferir ter morrido do que passar por esse seu clichê de mocinha salva pelo garoto bonito da esquina e continuar no meu caminho. Não se preocupe, não é a única que fugiu de mim, não está sozinha, entretanto, poderá ficar.

Cada dia, cada hora, o jogo fica mais próximo de começar.


Continua...

DESTINATÁRIO DAS COVASWhere stories live. Discover now