IV. O Pequeno Príncipe, Antoine de Saint-Exupéry

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"Só se vê bem com o coração.
O essencial é invisível aos olhos"

"O amor é a única coisa que cresce à medida que se reparte" – Suri leu no exato instante em que ouviu o som discreto da chave eletrônica do quarto, seguida do clique quase silencioso da porta se abrindo e então se fechando. Wonwoo era discreto até mesmo naquele aspecto e isso a fez sorrir, porque a tornava mais que atenta aos detalhes que faziam dele quem era.

Não era a primeira vez que se deparava com aquela frase – além de se tratar de uma releitura, tinha plena certeza de já tê-la visto em algum lugar, talvez estampando uma camiseta... ou seria uma caneca? Mas havia algo sobre a obra aclamada de Antoine de Saint-Exupéry que fazia com que cada vez que a lesse, descobrisse novos significados para a história singela de um pequeno príncipe de um planeta distante, a descobrir o amor.

Aos 8 anos, sob a luz do didatismo dos pais, compreendera repartir o amor como algo próximo ao sentido bíblico, da prática da caridade. Aos 16, quando seu o material escolar era decorado com as famosas aquarelas temáticas do livro, escrevia aquela frase com olhos apaixonados voltados para o colega de classe por quem suspirava de paixão adolescente.

O que sentia aos 23, contudo, era muito diferente. Imersa na água quente da banheira daquele luxuoso hotel de Jakarta, lendo a obra em seu idioma original e ouvindo os sons discretos que anunciavam a presença de Wonwoo no cômodo ao lado, Suri compreendia, enfim, o amor expansivo que parecia crescer muito além dela, desde que o conheceu. Desde que partilharam da primeira forma de amor – aquela que nutriam pelas histórias.

— Achei que tivesse fugido. – Wonwoo escorou um dos ombros na porta, sua voz deixando transparecer o cansaço, mas também a satisfação de chegar de um dia feito aquele e se deparar com ela lendo na banheira, o corpo envolto em espumas aromáticas e vapor quente. Era uma exceção absolutamente rara – drástica, até – que permitissem a presença da namorada no hotel. Mas após os últimos acontecimentos durante a turnê, considerando o bem-estar e a saúde de todos, algumas concessões foram feitas: Suri era a sua. Seu ponto de paz e reequilíbrio físico e emocional.

— Pra onde eu fugiria? – a garota abriu um sorriso divertido, apoiando o livro sobre a pequena mesa de mármore ao lado da banheira para indicar que ele tinha sua atenção plena. Wonwoo se aproximou, abaixando-se o suficiente para tocar os lábios dela com os seus por um instante demorado, que terminou com um suspiro longo.

— Não sei. – respondeu em um meio sorriso, a testa ainda colada à dela – Só estou feliz por estar aqui. – completou, a voz ainda mais grave como sempre que falava tão baixo.

— Eu também, meu amor. – Suri deixou um carinho no rosto dele, sentindo-o fechar os olhos sob seu toque, flagrantemente sentindo falta daquilo – Como foi seu dia? – perguntou quando ele se sentou na beirada da banheira, com uma das mãos brincando com a espuma espessa que envolvia o corpo dela. Ela o conhecia o suficiente para saber que às vezes Wonwoo precisava de algum estímulo para dizer o que se passava detrás daqueles olhos, especialmente quando a maré mansa se transformava em noite tempestuosa, como era o caso.

— Bom. – respondeu, sucinto, e Suri apenas aguardou em silêncio que prosseguisse. O rapaz sorriu de canto, levando o indicador até o nariz da garota, sujando-o como retaliação àquele superpoder irritante dela, de lhe arrancar qualquer verdade com nada além de um piscar daqueles olhos afetuosos – Foi cansativo. Bem cansativo. – confessou, respirando fundo: o afastamento do líder do grupo no meio da turnê, as entrevistas que giravam apenas em torno disso, a mudança em todas as performances para cobrir a falta dele, a insegurança.. Tudo era exaustivo, e o deixava a flor da pele. – Os ânimos estão começando a melhorar, ao menos. – ponderou com um sorriso tristonho, que fez a namorada entrelaçar os dedos aos seus.

GOYA • Jeon WonwooOnde as histórias ganham vida. Descobre agora