Ausências

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Kalvin Giorno

— Tudo o que você ouvirá será a minha voz... Somente a minha voz. Nada mais importa. Se concentre na minha voz e esteja atento ao que vou lhe pedir. Quando eu contar até três, você terá 21 anos novamente. 1, 2 e...

Era incrível pensar em tudo o que me aconteceu para chegar aqui. E não era do meu feitio recorrer a extremos. Porém, eu já estava muito afetado. Desesperado por respostas e temendo, a cada dia, pela verdade que se tornava, ao mesmo tempo que mais clara, sombria.

Trabalho nas empresas Giorno há 7 anos, empresa da família. No início deste ano fui nomeado o novo presidente, cargo passado por meu pai. Ele já não tinha tanto vigor, e nos últimos meses, a debilidade parecia estar lhe vencendo. Ao menos, foi o que me contaram...

Enfim, sempre trabalhei com muito afinco, dedicação quase que total. Ou seja, não tinha tempo para relacionamentos amorosos, nem nada do tipo, algo que minha mãe não poderia conceber. No último do ano, eu só me deixava para encontros persuadido por ela, que queria logo me ver casado e com filhos. Ah, eu já não aguentava mais aqueles encontros à cegas, mas eu nunca conseguia lhe negar nada. Só acho que eu deveria...

— Kal — chamou-me dona Marieta, minha mãe. — Largue desse computador, meu filho, e se apresse! Você não pode perder o encontro de hoje. Tenho certeza que, desta vez, será a garota certa.

Antes de observá-la, suspirei, desliguei o computador, peguei meu paletó e me direcionei a ela, beijando-a na testa, enquanto terminava de me aprontar, dizendo:

— A senhora sempre diz a mesma coisa. Já faz quanto tempo que passamos por isso? Uns... Oito meses?

— Ora, filho. Não seja aborrecido. Sorria mais. Você é tão bonito, inteligente... O melhor partido da cidade! Está na hora de arrumar um compromisso sério e eu sei que desta vez...

— Ok, ok, mamá — falei por fim. — Estou saindo.

— Seja educado e...

Ainda ouvia algumas de suas chamadas, quando me senti paralisar e tudo o mais deixou de existir.

— Senhor! Senhor!

Recobrei-me num susto, tendo a Mônica, minha secretária, me perfurando a bolha.

— O senhor está bem?

— Ah...Sim! Eu acho...

— O que aconteceu? — apareceu minha mãe, cobrindo nossas vozes. — Você está pálido, meu filho.

Sacudi a cabeça rapidamente e sorri, me voltando para ela, tentando desanuviar. Não que a ideia de me fazer de doente não soasse bem, a fim de me poupar do encontro daquela noite. No entanto, dona Marieta não me deixaria mais e se mudaria para o meu apartamento de vez. Eu não queria a minha mãe tão perto de mim assim... Ninguém merecia isso!

— Fique tranquila, mamá. Eu estou ótimo. Só me lembrei de uma solicitação urgente, mas posso resolvê-la amanhã de manhã.

— Ah, é bom que seja assim — resmungou. — Não vai ficar mais nenhum minuto aqui trabalhando. Vamos logo.

Enquanto ela chamava o elevador, Mônica se aproximou e falou, com um semblante lívido, quase num sussurro:

— Foi mais uma ausência, senhor. Já é a quarta vez nesta semana. Te chamei por cinco vezes até me atender. O que está acontecendo?

— Não se preocupe, Mônica — respondi no tom, mas ainda na tranquilidade fingida. — É apenas cansaço.

— O senhor deveria se alimentar melhor.

PERDIDA NA MEMÓRIA | Embaixador Secreto 2020Where stories live. Discover now