A Casa do Bosque

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Ontem foi o último dia de sua antiga vida, hoje é o começo de uma incrível jornada. A aventura que irá mudar definitivamente o rumo de tudo. É sempre assim: sem anúncios, sem pedir licença, sem aviso algum para que possamos nos preparar; as mudanças vêm, e o melhor que podemos fazer é estar preparados para elas.

Lana percorria os bosques próximos à sua casa. Era tarde, um dia muito quente, e o brilho do sol refletia nas folhas das copas das grandes árvores. Filetes de luz chegavam ao chão e ajudavam a jovem de vestido branco a distinguir as melhores ervas a serem colhidas. Ela selecionava diferentes tipos de flores, de cores e tamanhos variados, pegava também raízes e sementes quando encontrava alguma que fosse útil. Depositava tudo no cesto que estava sobre um toco de árvore.

Era possível perceber pela meticulosidade na escolha que ela sabia exatamente o que fazia. De fato, não era a primeira vez que estava lá. Detinha um bom conhecimento a respeito de plantas, e colher ervas era o que a jovem mais havia feito nos dois últimos anos.

Em sua face, um misto de serenidade e preocupação. Tentava manter a concentração, mas invariavelmente era pega por pensamentos que lhe afligiam a alma. Então sua expressão mudava automaticamente, franzindo a testa sem que, entretanto, em momento algum interrompesse a coleta.

Com seus 17 anos, Lana se viu responsável por cuidar da mãe, que se tornara inválida, vítima da grande praga. Esta era a doença que varria o lado oeste do continente. Com a precariedade da higiene no atual período de guerras, a doença se alastrava, atingindo grande parte dos habitantes do país. Se não perdessem pela guerra, perderiam pela doença. Isso era praticamente um consenso.

Elas fugiram para os campos, para longe das grandes cidades, mas já era tarde. Helena sucumbiu à doença, que não tinha cura. Nos estágios mais avançados, minava toda a disposição da pessoa, que passava a maior parte do tempo em repouso. Horas dormindo durante o dia, noites febris, delírios, cansaço e falta de apetite, até que a vítima definhava, entregando-se totalmente à doença. Desistir de viver era a opção de muitos.

Para a filha restou tratar de forma paliativa a enfermidade de sua mãe. Aliviar o cansaço e a fraqueza com chás e sopas. Verdade que remédio algum era eficaz, mas ela fazia o melhor que estava ao seu alcance. De negligente, Lana jamais poderia ser chamada.

Era a enfermeira de sua mãe. Isoladas do restante das pessoas, se alimentavam de vegetais que ela mesma plantava numa pequena horta e de frutas que colhia no bosque, assim como bebiam da água de um pequeno poço ou de um riacho que ficava a alguns quilômetros da casinha em que viviam.

Raramente ia à cidade, inclusive fazia muito tempo desde a sua última visita. Roupas, comidas, pessoas, tudo o que fosse proveniente de lá deveria ser evitado. Ninguém sabia ao certo como a doença se espalhava; então, o isolamento naquela época era uma prática comum.

Enquanto colhia, as horas passavam e os pensamentos voavam. Ela voltava ao tempo anterior à guerra, antes da doença, na época em que moravam na cidade, quando seu pai estava presente. Eram uma família completa e feliz. A guerra tudo tirou.

Restara ao menos a esperança. Seu pai estava em algum lugar na guerra, e sua mãe... Nesse momento, Lana olhou para o céu e percebeu que era hora de ir para casa, a cesta estava cheia, já possuía o necessário para dias, pensou.

A jovem pegou o cesto e foi em direção à casinha. Seguia em passos lentos, não estava muito longe. Sairia do bosque, passaria por um declive descampado e chegaria ao seu lar.

*** ** * ** ***

Vindo de direção oposta, por uma estrada auxiliar, um reduzido contingente militar marchava. Alguns batedores à frente notaram a pequena construção e para lá rumaram. Eram três soldados.

Lana - Uma Aventura de Fantasia MedievalOnde as histórias ganham vida. Descobre agora