Paradoxos

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Era domingo. Domingos naturalmente são dias ruins. É o fim do final de semana, um dia cansativo porque no outro é segunda-feira e ninguém gosta de segundas. A programação da TV no domingo é chata, a programação da rádio é chata, tudo fica muito mais estressante nos domingos. Por exemplo, hoje era um dia quente em Santa Cecília. Dias quentes, no geral, já são chatos e cansativos e causam um estresse adicional à tudo que se precisa fazer no dia, mas hoje era um domingo quente. Era praticamente um crime os dois acontecerem juntos, porque a probabilidades de jovens quererem cometer suicídio quase dobra. Esse era um dos muitos fenômenos sociais que deveria ter mais atenção. Os outros se dividem entre o estranho sumiço de meias e que o uso de determinadas drogas tem uma certa ligação com a ideologia política do usuário, porque não é segredo para ninguém que maconha é de esquerda e cocaína de direita. Talvez tenha algo a ver com o preço e a classe social, o que realmente merecia um estudo mais detalhado, que eu poderia fazer se eu não estivesse tão mau humorado com os 32°C que estava fazendo.

— Está tão quente que eu acho que vou derreter e me fundir a sua cama, César. — Reclamei, enquanto ele continuava concentrado na tela do computador, terminando alguma campanha do jogo. Acho que estar na casa do meu melhor amigo é a única coisa boa que tem neste domingo.

— Isso é impossível, Davi. O corpo humano é um sistema complexo demais para mudar de estado físico. — Ele disse, estranhando meu comentário.

— Eu sinto como se fosse derreter, está muito quente. — Falei, encarando o teto do quarto dele. Estar na casa de César era sempre legal, porque evitava que eu pensasse demais em coisas que não deveria pensar. Entre essas coisas, estava Ana. — É uma metáfora, eu sei que não é possível meu corpo derreter, mas eu sinto como se ele fosse porque eu estou todo suado e grudento... e molengo, porque está quente.

— Espera, você tá todo suado e grudento na minha cama? — Ele perguntou, olhando para mim rapidamente por cima do ombro. — Se você não fosse meu melhor amigo eu te colocaria para fora da minha casa e jogaria fogo nesse jogo de cama, porque isso é muito nojento.

— Então eu vou abusar da sua boa vontade e rolar na sua cama para espalhar melhor todos os germes e bactérias que meu corpinho suado tem. — Falei, começando a rolar de um lado para o outro na cama de casal que ele tinha.

— Davi, não me faça levantar daqui e ter que te matar a base do soco. — Ele avisou, num tom bem sério. Fingi sentir medo ao me sentar lentamente. César pareceu notar. — É brincadeira, uma metáfora, não é literalmente o que vou fazer mas é o que tenho vontade... Mas eu jamais faria, você é um cara legal. Menos agora que está sujando todo meu edredom, mas você é legal.

— A gente não pode mesmo ligar o ar condicionado? — Pergunte, de novo, devia ser a terceira vez.

— Ele não está funcionando, já te disse isso, está pingando, meu pai disse que iria arrumar.

— Ele disse isso quando?

— Domingo passado.

— Você realmente não está sentindo calor?

— Eu estou, mais ficar reclamando disso não vai fazer com que São Pedro magicamente mande uma chuva porque o senhor Davi Luan está derretendo na minha cama.

— Viu só, você entendeu a metáfora. — Falei, me deitando de novo da cama. — Quando tempo vai levar para essa missão ai acabar?

— Está quase, okay? Já está terminando.

— Você está aí desde que cheguei, isso são tipo horas.

— Faz só dez minutos, Davi.

— Viu só? Até o tempo é afetado com o espírito de lentidão que o calor causa.

ORENDAWhere stories live. Discover now