Legado INCONTROLÁVEL

CAPÍTULO 4

Cicék, Tanrisa, presente

O vestido preto ajustava-se com perfeição ao corpo de Carla e dessa vez aquela cor não representava nenhum luto.

Depois de seis anos desde a morte de seu pai, muita coisa tinha mudado. Agora ela não era mais uma adolescente amedrontada, mas sim uma mulher. E como a Vice Líder mais jovem na cúpula, Carla tinha se consolidado como uma das maiores e mais temidas administradoras da Ordem.

E naquele dia em particular, Carla parecia estar empenhada em parecer mais provocante e amedrontadora que o normal enquanto penteava os densos cabelos em um rabo de cavalo muito alto, destacando seu rosto perfeito. Uma beleza intimidadora.

— Senhora Moretti, com licença. Os relatórios que pediu para a transição de cadeiras da cúpula estão prontos. — A secretária tinha anunciado ao adentrar no closet de Carla.

Os olhos verdes de Carla, marcados pela maquiagem escura em um delineado esfumado, brilhavam em ansiedade e seus lábios não paravam de esfregar uns nos outros o batom vermelho encarnado. Ela assentiu ajustando os últimos detalhes de seu cabelo.

— Diga.

— Senhora, há 56% dos votos da cúpula tendendo à ala burocrática. — A secretária disse enquanto dava toques em seu tablet: — Com certeza a família Vertheimer vai propor o filho mais velho, Fabrício, para substituir o pai.

— Esperado. Ele é praticamente um burocrata, apesar de ser um gângster. — Carla esfregou os lábios e passou a limpar o canto da boca com a ponta do mindinho, inclinada da direção do espelho.

A secretária continuou:

— Os Walton estão perdendo poder de voto... É possível que, por pressão dos anciãos, um deles saia da mesa.

— Claro, a família Walton é mais envolvida com a ala legal, mas apoia os negócios ilegais. — Carla deu uma última encarada em si mesma diante do espelho, satisfeita e finalmente saiu, sendo seguida pela mulher que, apressadamente tentava terminar o raciocínio.

— Ainda não sabemos quem vai assumir no lugar de um dos Walton, mas muito provável que seja alguém forte na ala burocrática. E se os dois Walton saírem...

Carla balançou uma mão para que ela se calasse e sorriu:

— Não interessa quem entre na mesa. Eu já tenho planos para um dos lugares dos Walton. — Ela disse e seguiu silenciosa até o lado de fora de sua casa, entrando no carro parado que tinha o motorista particular aguardando-a com a porta aberta.

Quando o carro deu partida, a ansiedade tornou a fazer seu coração palpitar intensamente, e a paisagem do sul de Tanrisa, rumo ao centro, agora parecia uma grande mancha diante de seus olhos. Não importava a política da cúpula, ou o futuro da Ordem.

Três anos. Fazia três anos que não via Thiago desde que ele tinha ido para a Itália participar do treinamento para se tornar um Elite Púrpura. E muita coisa já tinha mudado desde a primeira vez que o conhecera, na adolescência, até aquele momento.

Mas mais coisas ainda haviam mudado nos três anos que estiveram separados.

Sim. Muita coisa tinha mudado...

A memória parecia fresca como a manhã do lado de fora:

O tiro acertou com precisão no alvo. O estalo da realocação da outra bala foi alto, e Carla segurou a espingarda na posição com violência, atirando mais uma vez cheia de ódio. O ruivo fumava em silêncio, observando-a, quase entediado.

— Isso não vai fazê-lo voltar mais rápido. — Felipe disse.

— Cala a boca, Felipe. Você mal voltou da Itália e já está enchendo meu saco? — Carla retrucou enfiando outra bala de grosso calibre nos canos, bateu-os e ajustou sua mira.