12 - O que te impede?

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Ester era uma fonte de amor incondicional. Os seus cabelos marcados por fios prateados contavam histórias de suas lutas, enquanto seu corpo pequeno contrastava com sua imensa força interior. E sua voz suave, como uma melodia tranquila, poderia ser um bálsamo para a alma de Luan naquele momento, se ele não estivesse tão constrangido.


- Filho, juntos podemos encontrar um caminho, e eu estarei ao teu lado para te ajudar no que precisar. - disse Ester enquanto observava o filho que não via há tempos, e com sua alma fervorosa suplicou: - Confia em mim e em Deus, Luan!

- Deus? Cadê Deus, mãe? Se Deus existe já me esqueceu faz tempo! Além disso, meus caminhos são tortuosos demais... - Luan teve suas palavras revoltosas interrompidas por sua mãe, que carinhosamente tentou lhe consolar:

- Não diga isso, Deus ama seus filhos, mas não os impede de passarem por suas provações. E meu coração de mãe não vê seus caminhos tortuosos, só te vê como meu pequeno Luan, aquele que encheu a casa de alegria quando nasceu. Você tem um valor inestimável para mim e para Deus, meu filho.

Luan, comovido, segurou as lágrimas e suspirou fundo para não ceder aos sentimentalismos, se afastando quando Ester tentou abraçá-lo.

-Não, mãe, estou sujo, não está vendo? Volte para casa com seu Deus e não me procure mais. - disse com certa aspereza na voz, mas por dentro, tudo o que queria era se jogar em seus braços e chorar como um garotinho.

-Você não gostaria ao menos de almoçar comigo hoje em casa? Faço aquela comidinha que você gosta tanto, sem alho, como você prefere. - disse Ester com um suave sorriso e continuou: - Depois você segue seu caminho sem a minha inconveniente interferência.

Com a consciência pesando toneladas, Luan se envergonhou diante da gentileza de sua mãe que até pensava em seus caprichos, sem saber que atualmente ele comeria qualquer coisa, até mesmo com alho ou sendo restos encontrados no lixo. Há muito tempo essa sensação de amparo, pertencimento e cuidado não fazia parte de sua vida.

- Tá bom mãe, mas não gosto que você me veja assim, depois não me procure mais! - aceitou demonstrando frieza, como defesa de sua imensa comoção.

Luan pegou sua mochila, chamou Luke e seguiu com Ester numa caminhada que levava menos de meia hora.

- Luan, onde está seu carro? - puxou qualquer assunto para quebrar o gelo, após alguns metros caminhados num silêncio constrangedor.

- Vendi, o dinheiro me ajudou a sobreviver um bom tempo nas ruas, depois vendi meu celular também, faz pouco tempo que fiquei totalmente zerado. - disse relembrando as inúmeras vezes que rejeitou as ligações de sua mãe e suas mensagens cheias de preocupação.

- Que pena, você gostava tanto daquele carro. - disse Ester e relembrou: - Você o conquistou com seu primeiro trabalho, ficamos tão admirados! E quando você chegou com ele em casa naquele dia, buzinando todo animado, a primeira coisa que fez foi me chamar para dar uma volta, lembra?

Luan apenas deu um sorriso penoso, permanecendo calado diante das recordações de quando ainda se sentia "gente".

Sem obter uma resposta, Ester o questionou:

- Filho, entendo que não queira morar em casa, mas por que você não tenta ao menos pedir seu emprego de volta? O pessoal da farmácia gostava tanto do seu trabalho, sempre te elogiavam quando falavam comigo.

Fechando a cara, Luan respondeu ríspido: - Você não vai entender, por isso prefiro me afastar, isso me constrange!

- Desculpa filho, não precisa me contar nada. - Ester logo mudou de assunto para tentar alguma interação com Luan: - E esse cachorrinho bonitinho, como se chama?

- Luke, ele não desgruda de mim. - Luan comentou aliviando a expressão e olhando para o cão, que parecia saber que agora estavam falando dele.

- Eu achava que você não gostava de cachorros. - comentou Ester relembrando os gostos do filho.

- Nas ruas as coisas são diferentes, mãe, a gente não escolhe, apenas aceita.

Ester se calou, olhando para o outro lado, disfarçando as lágrimas ao imaginar seu único filho sofrendo e passando necessidades nas ruas. Quantas noites frias, quanta fome, quantos perigos ele estaria enfrentando? Quantas lutas travou para estar assim tão magro, com olhos fundos, exalando cheiro de bebida e de desesperança?

- Luan, quero que saiba que eu nunca desisti e nem vou desistir de você! E saiba também que te procurei muito, eu só não imaginava te encontrar aqui tão perto. - confessou Ester.

- Faz um tempo que voltei para cá. Na verdade, voltei só para visitar o túmulo da Ísis e acabei não conseguindo mais sair desta cidade. Algo me prende aqui, parece uma maldição! - exclamou irado.

- Não diga essas coisas, filho. Se houver qualquer maldição na sua vida, eu repreendo agora em nome de Jesus! - rogou a mãe fervorosa.

Luan olhou esquisito e, querendo rir, disse: - Você e essas crendices!

- Você precisa encontrar a fé em algo, meu filho. Não precisa acreditar na minha religião, mas ter fé em algo que te dê forças! Desde que sua amiga morreu, você ficou muito abalado. - enfatizou Ester, e apontando para uma casa com jardim florido, comentou: - Aliás, olha lá a casa em que a Ísis morava como está diferente! Você já tinha visto?

Casulo - Os ReencarnadosOnde as histórias ganham vida. Descobre agora