Prejuízo

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Depois de uma semana inteira, a primeira completa, Roselynn havia notado algumas coisas. A primeira, enquanto estivesse ali, devia dar adeus à sensação de ficar até mais tarde na cama, pois graças ao café da manhã, que começava a ser servido às sete e meia, tinha de estar em pé e disposta a partir das seis da manhã. A segunda: ninguém cozinhava no raio da cidade. Isso explicava o fato de o lugar estar sempre cheio. E a terceira, apesar dos tantos rostos que passavam por ali, havia um grupo que poderia considerar fixo.

O homem que no outro dia esperara o troco e a loira oxigenada faziam parte deste grupo. No setor atendido pela Celeste estavam sempre duas adolescentes, deviam ter pouco mais de quinze anos. Elas chegavam à tarde e ficavam até anoitecer, indo embora um pouco antes de o jantar ser servido. Roselynn achou estranho não haver nenhum adulto responsável por elas, mas se os outros achavam normal, não seria ela quem iria reclamar. Notara também dois homens, quase da mesma idade e que ficavam no setor da Patty. A impressão é que disputavam a atenção dela, com pedidos a cada cinco minutos, quase enlouquecendo a mais jovem e bonita das garçonetes. Meg lhe informara que trabalhavam em setores rivais também, já que Emmett era o empreiteiro responsável pelas obras que iriam "modernizar" a cidade e Luke, o mais novo, era o representante da sociedade protetora do meio ambiente.

Por fim, notara uma mulher que vira todos os dias lá, sentada no mesmo lugar. Pedia um café e ficava lendo um jornal; na hora do almoço comia apenas a sobremesa e no jantar, pedia uma sopa, sempre mandando um recado para o cozinheiro, com sua apreciação.

- De quem se trata? - Roselynn quis saber, perguntando para Meg - Alguma crítica gastronômica? - achou a própria pergunta tola, o que uma crítica faria ali?

- Sei tanto quanto você, Rose... Lynn. Acho que não é da cidade, pois não me lembro dela, deve estar apenas de passagem.

- Como eu... - Roselynn suspirou, olhando de modo disfarçado para a mulher, vestia roupas caras para estar ali.

- Talvez seja uma admiradora do Brian - Meg sorriu e Roselynn fez uma careta.

- Com aquela educação toda? Duvido - ela negou com a cabeça - Refinada demais para ele.

- Não seja cega, Roselynn. Muitas mulheres dão em cima dele, apesar do jeito rústico.

- Hum hum - ela concordou irônica e olhou para o relógio. No primeiro dia, não havia prestado atenção ao relógio logo acima da porta, agora, no entanto, ele era o endereço dos seus olhares. Resolveu mudar de assunto - Felizmente daqui a pouco a janta é servida e quando menos se esperar, um dia a menos.

- Conta os minutos para fechar - Santiago disse aparecendo do fundo do bar - Que tipo de comerciante é você? Clientes comendo... Bar lucrando... É uma equação simples.

- Você sempre aparece do nada, Santiago? - ela quis saber, virando-se para ele.

- Acho que faz parte da função do faz tudo, estar sempre em todos os lugares, como um fantasma - ele sorriu. Seus cabelos compridos, presos num rabo de cavalo.

- E ser intrometido também? - ela quis saber - Não tenho culpa em ficar feliz por ter dado tudo certo e mais um dia ter chegado ao fim sem nenhum grande aborrecimento - ela sorriu - só os... - falou mais pra si mesma e nem bem acabou a frase, viu os homens no setor da Patty, do nada, levantarem a voz um para o outro e se erguerem de modo tempestuoso, avançando um contra o outro.
A garçonete, prevendo o pior, colocou-se no meio dos dois, mas parece que o fato de serem contidos por alguém muito menor que eles só fez piorar o clima. Tiraram-na de cena com um só movimento, antes de começarem a gingar com os punhos em riste. Patty lançou a Roselynn um olhar pedindo ajuda e assim que o primeiro soco encontrou o alvo correto, ela e as adolescentes fizeram um coro de gritos que só aumentaram a balbúrdia.

Roselynn ficou sem ação. Não sabia defesa pessoal, apesar dos um e setenta e quatro, ainda era bem menor e mais leve que os dois homens. Olhou para Santiago, esperando que ele tomasse alguma atitude, mas o rapaz tirou uma nota de cinco dólares do bolso e disse numa excitação fora do comum:

- Ansiei tanto por uma situação como esta! Aposto que o Luke vai pôr o outro a nocaute!

Roselynn olhou-o incrédula, enquanto ele se afastava para ter um melhor ângulo. Só queria que aqueles gritos parassem. Além dela, Meg e a mulher refinada eram as únicas que não estavam histéricas, já que a essa altura, com mesas e cadeiras sendo empurradas, todas as outras mulheres no recinto, respondiam do mesmo jeito à selvageria. Suas únicas reações foram se encolher a cada soco desferido e colocar as mãos na cabeça ao ouvir o som dos primeiros copos quebrados. Talvez estivesse sendo insensível ou prática, o certo é que só conseguia pensar no prejuízo.

Brian só teve tempo de apagar uma das frigideiras onde marinava um peixe, antes de largar sua cozinha. Ele passou pelo balcão, praticamente pulando-o e foi até os brigões tão rápido quanto possível. Diante do olhar surpreso de Roselynn, tentou separá-los de maneira amigável e quando isso falhou, usou da própria força, dando um golpe conhecido por gravata em Luke e, enquanto o segurava, atingiu Emmett na altura do estômago, fazendo-o dobrar-se diante da dor.

- Vocês enlouqueceram? - ele vociferou ofegante, ainda prendendo Luke, com apenas um dos braços - Em dias como esse, o xerife deveria estar por aqui, aí seriam jogados atrás das grades por promoverem essa desordem em um estabelecimento particular. Não veem que estão assustando as senhoras? - dizia como se estivesse falando com crianças - Vou soltá-lo, Luke, mas eu juro que se continuar, eu mesmo coloco os dois para fora. Entendeu?

Luke grunhiu um sim e Brian o soltou. O homem foi se acalmando aos poucos, tinha o nariz sangrando, enquanto, do outro lado, a boca de Emmett levara a pior. Depois de alguns segundos recuperando-se, Emmett conseguiu se erguer e arrumou as roupas, ainda ofegante.

- Se querem se matar é um direito que têm, mas que o façam longe daqui! - Brian disse com autoridade, antes que Emmett saísse do estabelecimento com a cabeça erguida e sem olhar para trás. Luke demorou-se um pouco mais, talvez para não encontrá-lo na rua. Pediu desculpas para Patty, antes de ir embora.

Somente após isso, Brian recuperou o fôlego e caminhou lentamente em direção ao balcão.

- Você deveria fazer algo, além de assistir - disse ao passar por Roselynn.

- Fazer o que? Não estou acostumada com isso - ela disse, antes que ele sumisse cozinha adentro, sendo ignorada. Quem ele era para ignorá-la? Podia ter salvo o dia, ou a noite, mas ainda era seu subordinado. Olhou para Meg - Você concorda com isso? Se vocês que já estão acostumados, agiram assim, como eu poderia agir diferente?

- Na realidade não estamos acostumados, Roselynn - Meg foi sincera, fazendo com que a moça a olhasse sem entender - Em anos, essa é a primeira vez que acontece uma briga aqui - disse a surpreendendo.

- Bem, espero que não diga que isso foi culpa minha - Roselynn, passada a surpresa, indignou-se.

- Claro que não. Só estou dizendo que é estranho, em todos os anos que trabalhei com o seu pai, nunca presenciei algo parecido - foi sincera - Vou ajudar Patty e a Celeste a arrumar a bagunça que ficou - disse deixando-a sozinha.

Rosas Para Você (Degustação) Where stories live. Discover now