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O relógio marcava 07h01min e o garoto ainda não havia pregado os olhos nenhum minuto sequer. Havia passado mais uma noite em claro.
Harry colocou a jaqueta roxa do time. Foi até o banheiro lavar o rosto e assim que encarou seu reflexo notou o quanto seus olhos estavam vermelhos. Suspirou. Seus pais iam perceber que ele não tinha tomado seu remédio e a chatice ia começar logo pela manhã.
Abriu o armário que ficava embaixo da pia e pegou o vidro de pílulas amarelas, eram essas as benditas que tinha que ter tomado à semana inteira para conseguir fechar os olhos e dormir. Jogou a metade das pílulas no vaso sanitário e deu descarga, ninguém nunca saberia que ele não as tinha tomado. Pegou seu boné e saiu do quarto.
― Bom dia querido. ― Sua mãe disse assim que ele chegou à sala.
― Bom dia mãe, estou atrasado, como qualquer coisa no caminho. ― Disse saindo apressado sem dar chance de sua mãe dizer algo.
Entrou no seu carro e logo estava a caminho da escola. Incrível como a cidade continuava a mesma desde nove anos atrás. As mesmas casas, as mesmas pessoas, as mesmas árvores no parque, o mesmo lago. Tudo.
Desejou nunca ter saído daquela cidade. Não se soubesse o que lhe esperava no futuro. Não se soubesse de toda a dor que iria sentir e que ainda sente. Apertou as mãos no volante e tentou dissipar todas as imagens que vinham a sua cabeça, mas era difícil, uma vez que sua mente viajava para aquela época, era impossível cessar as memórias.

― Eu te amo, mas isso não é o bastante.
― Como assim não é o bastante? O amor deveria bastar.
― Mas infelizmente para mim não funciona assim, é muito maior do que nós. É muito pesado.
― Eu sempre vou estar do seu lado, sempre! Me deixa te ajudar.
― Desculpe. Só me perdoa tá?
― Perdoar pelo quê?
― Diz que me perdoa, por favor!
― Eu te perdoo, não importa pelo que seja. Te amo acima de tudo.
― Obrigada.

― Droga de lembranças! ― Gritou freando o carro no meio da rua, por sorte não tinha carros circulando àquela hora por ali. Sua visão estava embaçada e sua respiração acelerada. Só depois que algo molhou suas mãos, que percebeu que estava chorando. Abaixou a cabeça no volante e chorou. Chorou por toda dor que estava sentido agora e por toda dor que iria sentir depois.
A dor que nunca iria lhe deixar.
Ela apenas se escondia em um lugar escuro e confortável e quando estava cansada de ficar sozinha, vinha para lhe infernizar e lhe lembrar de que ela estava ali.
De que ela nunca iria embora.

xx

― Bolachas da sorte! ― Disse Hilary animada assim que viu Zayn como um pacote de bolachas sabor chocolate nas mãos.
― Yep! Quer uma? ― O garoto perguntou sentando-se do seu lado no banco que ficava no pátio do colégio.
― Uma? Quero várias, preciso de sorte. ― Ela disse enfiando sua mão dentro do pacote e a enchendo.
― tsc, tsc, que coisa feia dona Hilary. Não se esqueça de fazer seu pedido antes de comer a primeira.
A garota abaixou a mão com a bolacha e rapidamente pensou em algo.
"Harry" foi tudo que lhe veio à mente no momento. Ok, era tudo que lhe vinha a mente o tempo todo.
No instante que ela abriu os olhos, o carro de Harry entrou no estacionamento do colégio que ficava em frente ao pátio onde ela se encontrava. Sorriu. O destino estava realmente lhe ajudando.
Acompanhou com os olhos o garoto sair do carro e bater a porta com certa violência, percebeu sua agitação nada normal e assim que ele olhou exatamente para o lugar onde ela estava, notou que seus lindos olhos esverdeados hoje estavam vermelhos e uma enorme tristeza tomava conta deles. Sem perceber abriu a mão com as várias bolachas da sorte e deixou todas caírem ao chão.
― Hilary! Isso custa dinheiro, tá? ― Zayn exclamou irritado. Até então não tinha visto o porquê da garota ficar paralisada, mas bastou seguir a direção do olhar dela, que viu Harry Styles. Claro tinha que ser.
― Oi? ― Ela perguntou voltando a realidade assim que o garoto havia passado pela porta dupla do colégio.
― Nada Hilary. Nada.
― O Harry tá estranho, notou? ― Ela disse preocupada.
― Não. Pouco me importa aquele garoto. ― Bufou jogando o resto das bolachas na boca.
― Tão insensível. ― Hilary empurrou de leve o ombro do garoto e sorriu pegando uma bolacha da mão dele.
― Insensível eu? Você sabe muito bem que não sou. ― Disse sugestivamente levantando uma sobrancelha.
― Ok! Hora de entrar. Nos vemos na hora do intervalo. ― A garota tratou de escapar de mais um momento constrangedor com Zayn, já estava ficando difícil ficar driblando suas investidas.
Enquanto ela caminhava pelo corredor notou Gemma e Harry conversando perto do armário dele. Notou também que eles estavam discutindo, ou aparentavam estar, já que as veias do pescoço do garoto estavam saltadas e Gemma gesticulava bastante com as mãos. Achou estranha aquela cena, raramente os via juntos na escola, e agora eles pareciam estar brigando. Abriu seu armário tentando disfarçar que estava bem atenta a conversa (que não podia ser ouvida) dos dois.
Harry encerrou a conversa/discussão falando um "já chega" em alto e bom tempo. Vários olhares curiosos foram direcionados para eles. Percebendo a atenção, Gemma tratou de encerrar o assunto e deu meia volta sem nem olhar para trás.
― O que foi? Vocês não tem o que fazer, não? ― Harry gritou fuzilando todos que estavam lhe fitando, rapidamente todos os alunos seguiram seus rumos cochichando. Harry Styles seria assunto da escola pelas próximas semanas, disso Hilary tinha certeza.
O garoto fez o caminho inverso da irmã e seguiu em direção ao campo de Baseball, ele não iria assistir aula. Hilary ficou com uma vontade enorme de seguir o garoto e... Bom ela não sabia o que ia fazer, mas quando chegasse lá, saberia. Ficou fitando seu livro de Álgebra e colocou na balança os prós e os contras.

Prós:
1. Estava com uma boa nota na matéria.
2. Álgebra tem todos os dias. Então perder uma aula não faria falta.
3. Essa seria sua chance de se aproximar de Harry.
4. Essa era sua única chance.

Contras:
1. Ele poderia ser super grosso com ela.
2. O professor poderia passar um teste surpresa. Bem típico dele.
3. O mundo conspira contra si, isso só já é motivo suficiente.
4. Quer saber? Quem se importa com listas?

Hilary fechou seu armário e seguiu a direção que Harry tinha tomado. Assim que chegou ao campo, procurou o garoto com os olhos pela arquibancada, mas não o encontrou, ao longe ouviu um som de batidas repetitivas, vinha da mata fechada que ficava em volta do campo. Olhou mais uma vez em volta, só para ter certeza que Harry não estava em lugar algum, e foi em direção à mata. Não demorou muito a avistar o garoto lançando a bola contra uma árvore velha que parecia bem deteriorada, ele fazia isso constantemente.
Ele nem ao menos notou sua presença, continuou com o processo de lançar e pegar a bola para então lança-la novamente. "Porque ele está fazendo isso?" perguntou-se fitando a cena sem entender como um garoto tão calmo como Harry aparentava ser, podia perder a paciência e ficar assim tão... raivoso. Suspirou, desistindo de tentar entendê-lo.
Esse som não passou despercebido pelo garoto que logo parou o que estava fazendo e olhou exatamente na direção em que ela estava. O sangue da garota gelou.
Pega no flagra!
― Me seguindo Hilary Oliver? ― Ele perguntou tirando as luvas de Baseball e guardando na mochila.
Hilary soltou o ar, que até então não percebeu que tinha prendido e disse:
― Não estou lhe seguindo, quis apenas me certificar que estava tudo bem.
Um dia um garoto ajudou uma garotinha que tinha caído e ralado o joelho, sei lá acho que queria retribuir o favor. ― Disse por fim se aproximando um pouco mais.
Harry contraiu o cenho, como para lembrar-se do que ela estava falando, mas nada vinha a sua mente.
― Como pode ver não estou ralado. Não preciso de sua ajuda Oliver. ― Ele pegou sua mochila do chão e começou a caminhar em direção a saída da mata.
As palavras saíram sem sua permissão:
― Mas quando precisar estarei aqui. ― O garoto parou no meio do caminho ainda de costas e apenas virou o pescoço.
― Obrigado, mas não precisarei. ― Disse e depois saiu.
Ela virou-se então e deparou-se com o vazio da mata, apenas o som dos passarinhos cantando podia ser ouvido, um vento gelado passou pela garota a fazendo estremecer e apressar o passo. Não tinha mais o que fazer ali.



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