1: Valentina

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Amsterdã, 1995

O restaurante é desses super chiques que tem se proliferado mais que os pub gourmet, absolutamente lindo e encantador, um luxo que nem tão cedo terei condições de bancar, ainda mais agora.

Estamos no segundo prato e Peter continua completamente silencioso, o que por si só já seria ruim, no entanto, muito pior é a forma como ele me olha e juro que não vou aguentar por muito mais tempo esse silêncio glacial.

Quando nos conhecemos cinco anos atrás, eu era uma menina recém-saída da faculdade de publicidade e exatamente como centenas de outros brasileiros vim tentar desbravar e ganhar o Velho Mundo. Muito esforço foi desprendido nessa empreitada e por uma questão de sorte e talento ganhei meu lugar ao sol, porém ainda não é a posição que desejo.

Hoje, sou alguém completamente diferente daquela menina e Peter não é apenas mais um empresário, é um dos representantes da Tweede Kamer* e tenho absoluta certeza que em breve será o Primeiro Ministro, junto com essa certeza está o prazo de validade do nosso relacionamento, que aparentemente acabamos de descobrir que já expirou.

Eu esperava um pouco de raiva, alguns gritos, algumas acusações, mas com certeza não esperava frieza, muito menos indiferença.

Ele termina sua taça de vinho tinto, sorri seu mais lindo e encantador sorriso para um casal que acena discretamente para ele, espera o garçom encher novamente sua taça para finalmente dizer alguma coisa.

- O que você pretende fazer, Valentina? - Espero um segundo para ter certeza que ele não tem mais nada a acrescentar e então digo tão calma quanto ele.

- Se você não quer ser pai do meu bebê, Peter, não tem problema, nós sabemos que sou perfeitamente capaz de ser pai e mãe, porém eu não aceito que você coma caviar enquanto estarei com o dinheiro contado da fralda, por tanto você tem duas opções, assume discretamente a paternidade e me ajuda a custear a criação do nosso filho ou podemos ir a justiça que te obrigará a fazer exatamente o que pedi com o bônus de um escândalo na sua vida perfeita. - Gostaria de saber se as pessoas ao nosso redor são capazes de sentir o frio que emana de nós.

- Então, você vai levar adiante...

- Sim, Peter, eu vou ter essa criança e se você me conhecesse como tantas vezes disse conhecer saberia disso. - Me levanto calmamente, mas borbulhando por dentro por toda a minha estupidez de ter acreditado que Peter Leonard Coetdyn fosse diferente. - Obrigada pelo jantar, Peter, eu espero que você não seja tão estúpido a ponto de tentar me intimidar, não se esqueça que tenho a mídia ao meu lado. - Sorrio para ele uma última vez. - Adeus, Peter. - Caminho a passos decididos para fora do restaurante mais badalado de Amsterdã, o maitre - que falha em não demonstrar sua surpresa por me ver saindo sozinha - se apressa em se oferecer para me pedir um táxi, agradeço, mas decido que preciso andar.

Peter simplesmente desaparece da minha vida, duas semanas depois ele envia Otto até meu apartamento para recolher tudo o que for dele e me dizer que se eu quiser falar com ele devo procurar Otto. Eu gostaria de dizer que fiquei surpresa, porém isso seria mentira; três anos de convivência com ele me mostrou que por trás dos olhos muito azuis e a pinta de galã de Hollywood Peter Coetdyn é um homem prático e Otto Fitzgerald, seu fiel cão de guarda, é responsável por limpar a bagunça que ele deixa.

Os meses passam, minha gravidez se torna aparente e as perguntas frequentes e, mesmo sendo uma mulher independente com uma carreira brilhante muitos me tratam com pena "pobre Valentina, tão talentosa, tão brilhante e tão burra, onde já se viu ser mãe solteira" ou "tinha uma carreira brilhante pela frente, mas apareceu grávida", faço questão de pegar as melhores contas da agência e mostrar para essas pessoas que não é só porque estou gravida que me tornei uma publicitária ruim, muito pelo contrário.

Instantes [CONCLUÍDA - Lolla&Rebeka]Where stories live. Discover now