6: Lolla

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Aliança, 2013

Alguns dias são mais fáceis que outros, alguns dias eu acho que estou ok, alguns dias tudo parece que vai ficar bem, mas na maioria deles tudo é eternamente cinza, sem cor, sem sabor e eu só quero me encolher numa bola e chorar até dormir.

Só que eu não consigo dormir.

Mas essa não é a pior parte, a pior parte é estar morrendo lentamente por dentro enquanto estampo um sorriso no rosto, por que existem bem poucos interessados em realmente saber se estou bem e essas pessoas estão tão bem, que me sinto horrível só de pensar em dizer que eu não me sinto tão feliz quanto digo que sou.

Eu me sinto pior ainda quando penso que provavelmente essas pessoas não vão entender isso e, com exceção da Beka, todas vão dizer que é normal ser assim porque eu tenho dezesseis anos e tenho a obrigação de ser estranha.

Porém, o quão estranho é normal ser?

Se todos fossem tão estranhos quanto eu, o número de suicídios seriam bem maiores, talvez sejam e apenas eu não saiba.

Não que eu esteja pensando em me matar, mas é que as vezes tudo é tão, tão sufocante e tão cruel que a morte parece uma coisa boa.

Ou talvez eu só esteja pensando tanto em morte por estar em um cemitério.

- Lolla. - Alguém me chama, finjo não ouvir. - Lolla. - Colocam uma mão em meu ombro, me forço a encarar quem quer que seja, me deparo com uma adolescente de olhos vermelhos e inchados, cabelo preso em um rabo de cavalo, tento me lembrar quem ela é, mas ultimamente me lembrar quem é quem tem sido difícil. - O Luke não vem?

- Estou aqui, Isabella. - Luke vestido de preto e com a expressão mais triste que já vi na vida aparece bem ao lado da menina que finalmente reconheço.

- Como está a sua irmã, Bella?

- Fora de risco, mas continua em coma. - Ela funga. - Luke, eu sinto muito mesmo. - Procura alguma coisa na bolsa preta que usa e tira de lá um papel amassado. - Desculpa ter amassado, mas é que... - Ela fulga novamente e derrama algumas lágrimas. - Eu achei no quarto da Annajú e pensei que você fosse querer ler. - Luke pega o papel da mão dela que se afasta chorando ainda mais. Meu irmão parece petrificado encarando o pedaço de papel.

- O que tá escrito?

- Não sei, mas é da Cecília. - O encaro esperando que ele diga algo mais, depois de um zilhão de anos ele dobra o papel e o coloca no bolso da calça e faz uma coisa surpreendente, me abraça, eu o abraço de volta e ficamos assim até anunciarem o enterro.

A cerimônia é simples e rápida, talvez porque Margarida está inconsolável e parece prestes a desmaiar a qualquer momento.

Permaneço ao lado de Luke até tudo acabar, algumas pessoas vem falar com ele, outras parecem fugir dele por não saber o que dizer, me entristeço ainda mais ao constatar que menos de um mês atrás muitas dessas pessoas estavam na minha festa de aniversário barra noivado dele.

Enterrada em um mar de tristeza caminho para o hospital, como se o acidente não fosse suficiente, Beka quebrou todos os recordes de bizarrice ao ser atropelada ontem por ninguém menos ninguém mais que Noé Miranda, o mesmo Noé Miranda que quase doze anos atrás atropelou e matou a tia Valentina.

E depois dizem que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar.

- Boa tarde, Simone. - Digo para a recepcionista que sorri para mim.

- Boa tarde, querida, sua irmã já ganhou alta, ela está com a sua mãe lá na lanchonete.

- Ah, obrigada.

Instantes [CONCLUÍDA - Lolla&Rebeka]Where stories live. Discover now