Frutos

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Kalimdor era relativamente calma, se você soubesse onde pisar. As cinco sentinelas, que há oito meses haviam partido de Hyjal certamente estavam entre os que sabiam. Alguns kobolds, um punhado de gnolls e uma ou outra tribo de murlocs foi tudo o que enfrentaram durante o verão, a primavera e a metade do outono, percorrendo, sempre em direção ao sul, toda a extensão, de leste a oeste, do continente ocidental.

Freja Lunagarra era do tipo que crê quando vê. Ela nunca pensava no perigo antes de encará-lo e jamais dava importância a bravatas e ameaças: se ela tivesse de temer, era o que estava à sua frente. Jamais o desconhecido. A capitã das batedoras, porém, não tinha porquê duvidar das previsões da Alta Sacerdotisa. Ela tinha a Visão e, mais importante que isso, tinha sabedoria para interpretá-las. Ela tinha certeza de que encontraria a ameaça de que Tyrande falara, mas nos primeiros meses de viagem não tivera qualquer indício da mesma. Chegando ao sul dos Sertões Setentrionais, porém, ela soube exatamente o que a sacerdotiza sentira: havia uma pressão no ar, como um zunido constante, mas quase imperceptível, uma presença incômoda... A partir de então, essa sensação só fez aumentar.

O ventre de Mayan agora estava perfeitamente redondo e havia algumas semanas que Freja a proibira de cavalgar na linha de frente. O grupo passara a montar acampamentos com maior frequência e as elfas se divertiam em fazer simpatias para descobrir o sexo da criança. A capitã, porém, não arredava pé da opinião de que era uma garota. "Vai ser uma guerreira, não resta dúvidas! Já conhece Kalimdor de cabo a rabo e ainda nem saiu da barriga da mãe!" - E repetia isso toda vez que a companheira reclamava dos movimentos bruscos do bebê. "Eu não disse?! Vai ser caçadora!"

Alannaria, com toda a paciência que lhe era de costume, transformara várias túnicas em roupinhas para aquele ou aquela que passaram a chamar apenas de "Lin", que, na língua dos kaldorei, significava algo como "pequeno". Mayan preferia não escolher um nome sem consultar o pai, achava que lhe devia essa consideração. Dairelle, apesar de jovem, além de uma talentosa batedora, era uma exímia herborista: era raro encontrar uma planta que não conhecesse por nome, usos e efeitos. Sempre que encontrava, recolhia folhas e frutinhas que Alannaria pudesse usar para tingir e decorar o enxoval da criança. Tinha na ponta da língua receitas de infusões para toda indisposição que pudesse acometer a nova mãe e todas as noites a fazia tomar chá de raiz telúrica para que seu leite fosse farto e nutritivo, quando a hora chegasse. E as conversas? Nenhuma delas passava uma noite sem trocar algumas palavras com o pequeno e Kailyn chegava até a contar-lhe longas histórias.

Ao fim do oitavo mês de viagem, num nicho em meio aos rochedos que circundavam Tanaris, a capitã decretou que aquele seria o último acampamento antes que "a nova sentinela" chegasse. Mayan tentou argumentar que ainda poderiam prosseguir, mas Kailyn foi veemente em afirmar que era questão de poucas noites para que o bebê nascesse.

"Não precisa se fazer de forte, Negraugúrio. Nós sabemos que você é. Não estou montando acampamento para te paparicar, só quero fazer o melhor que puder para receber a benção da Deusa."

No deserto, a sensação de ameaça que Freja detectara nos Sertões tornara-se quase palpável. Todas as batedoras podiam perceber o que Dairelle comparou a "um enxame de horríveis insetos escondidos sob sua cama, no quarto escuro". Ela não podia ter definido melhor: era como saber que eles estavam lá, o ciciar constante de suas asas, os cliques de suas carapaças, a impressão de que, na hora mais negra, eles deixariam seu esconderijo e subiriam por seu corpo, se arrastando, cortando e envenenando... Sim, pois não aquilo não tinha nada do ruído melodioso das cigarras no verão, não eram as delicadas patas dos insetos que polinizavam as plantas e viviam entre suas folhas: aquele era o murmúrio cruel, da destruição pela destruição, da pestilência, da morte que não conhece a vida. Elas estavam muito perto.

Augúrios da NoiteWhere stories live. Discover now