A Mulher da Tatuagem de Rosa

Uma Caminhada Sem Volta

O dourado do céu no fim de tarde, depois do Dia dos Reis, fora um dos mais espetaculares que Leona já vira. Em Tarancorne, a paz da brisa vespertina lhe despertou uma emoção até então jamais saboreada. Era o sentimento de finalmente se sentir útil para o reino, apesar do papel ínfimo que estavam atribuindo a ela.

Depois de ser informada sobre a sua soberania em Nirquel, Leona não parara mais. Estava participando de reuniões de Estado e tentando conter manifestações de repulsa sobre a sua liderança na Dinastia. Os nirquelinos jamais foram governados por uma mulher, era verdade, mas ela esperava dar ao povo a chance de ver a diferença entre um homem ser misericordioso e uma mulher ser uma boa líder.

Paralelamente, ela tentava organizar uma guarnição que pudesse levá-la para Stópolis. Queria verificar com os próprios olhos que seus filhos não estavam em um cativeiro comandado pelos elfos , ou pior, mortos nos destroços da nau élfica atacada por Wikah. Estivera, desde o dia em que fora informada de seu novo status como governante de Nirquel, tentando escrever uma carta para Danmai, a Manta d'Água. Queria deixar claro que ansiava por notícias de seus filhos, se eles teriam sido enviados junto ao corpo do pai, principalmente, entretanto até aquele dia a carta não fora concluída.

O brilho amarelado do sol refletiu em seus olhos e esquentou brevemente o véu carmesim que vestia. Saindo do Altar de Shazzar, Leona admirou a multidão descendo a Ladeira da Felicidade, balançando lenços vermelhos em sua direção. A Avenida da Harmonia também encontrava-se lotada, onde milhares de pessoas saudavam a nova governante de Nirquel.

Leona permitiu-se acenar para aquelas pessoas, sentindo em seus ombros o peso de uma nova responsabilidade, enquanto o sol esquentava seu véu e a pele clara por baixo. Sentia-se poderosa, ao mesmo tempo em que sabia não ter todos os poderes, como ocorreria a um governante homem. Até porque ela deveria concentrar seus esforços em recuperar seus filhos que, ela tinha absoluta certeza, estavam vivos em algum lugar. Ela sabia que sentiria algo se seus filhos realmente estivessem mortos.

Vermelha como uma pétala de rosa ao vento, Leona flutuava sobre a multidão quando entrou na liteira que a levaria em direção ao castelo. As pessoas, principalmente mulheres, desejavam tocá-la. Todas usavam vestes semelhantes à sua, porém com os rostos e parte dos cabelos a mostra. A realeza era dada à descrição, pois era poderosa ali a mulher que fosse misteriosa.

A caminhada ao palácio foi cansativa. Leona esticava sua mão sempre que desejavam tocá-la. Ela era solícita e sorria naturalmente, mesmo sabendo que ninguém jamais veria seu sorriso. Ao seu lado, Tobias Teufyn se mantinha atento a tudo e a todos. Uma hora ele conseguiu dizer a Leona.

— As pessoas não podem vê-la sorrir, majestade. Mas elas certamente lembrarão dos seus olhos neste dia... e em como eles estão felizes por entender o poder que você tem em mãos.

Leona sorriu e respondeu.

— Pois não há como disfarçar a felicidade de poder conseguir, de alguma maneira, ter o controle sobre minha própria vida e sobre a vida de meus filhos. Trazê-los seguros para casa é mais que minha missão. Certamente estou feliz por isso, já que é minha função e que depende muito de mim mesma.

— Apenas tenha cuidado, Majestade. — comentou Tobias. — O sorriso em seus olhos pode ser interpretado pelo povo de várias formas. Cuidado ao expressar felicidade em demasia, Vossa Majestade acabou de perder o marido e os filhos na artimanha dos elfos.

Leona desfez o sorriso imediatamente, de repente uma vontade avassaladora de chorar se apossou dela. Desde que fora informada de que teria de tomar o trono de Nirquel, ela não conseguiu mais pensar com clareza, agia automaticamente em situações que demandavam sua atenção. Não tivera tempo de chorar pelo sumiço dos filhos e muito menos de chorar na pira vazia do marido; que já estava pronta e preparada para ser acendida ainda naquela noite, numa cerimônia privada.