Capítulo 24 - Canção pra não dormir

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Quando percebeu, já tinha acontecido. Já havia passado um ano e seis meses desde o acidente! Três meses que estava fazendo terapia, onde passava do tempo estipulado com frequência! Tinha mais de um mês que seus amigos mal olhavam pra ele, quem dirá falarem! E, não sabia explicar como, já tinha, ao menos quinze dias que havia outra pessoa em sua casa, em sua cama, em sua vida! Miranda simplesmente tinha se mudado para lá, tão sutil e lentamente que, quando percebeu, já tinha acontecido.

Alexander não soube explicar a Francis o quê ou como tudo tinha se desenrolado. Sequer sabia explicar a si mesmo! Havia alguma explicação? Só restava aceitar, afinal era um maldito covarde, que nem coragem para contar a verdade à sua legítima esposa, inconsciente! Aquela impotência toda, só o enfraquecia, a cada dia. Suas forças estavam se esvaindo, cada vez mais rápido! Sua mente ficava cada vez mais perturbada e turvada.

Uma noite, enquanto estava com Luna, ficou sentado, em silêncio, no quarto escuro, iluminado apenas pelo brilho da máquina de monitoramento. Ás vezes, fazia isso. Ficava com medo de falar e acabar contando toda a verdade. A angústia era tanta que se escondia no silêncio e na escuridão, até seu coração se acalmar. Foi neste momento que ouviu o ruído da porta abrindo e um rastro de luz do corredor invadir o quarto por um instante. Acendeu a tela do celular e conferiu o horário. Eram três e quarenta. Só então ergueu a cabeça para ver quem estava entrando. Não se surpreendeu em ver que se tratava do Dr. Armstrong.

- Sabia que o encontraria aqui. - iniciou o médico em tom de voz o suficiente para ser ouvido. - Tem passado muitas noites por aqui.

Era verdade! Era proposital! Queria estar o maior tempo possível longe de casa. Só não passava 24 horas no hospital, por causa dos filhos. Sabia que quando voltasse para sua casa, encontraria uma mulher, que de alguma forma, era uma estranha. Mesmo que ela dormisse em sua cama e o abraçasse com força e que dissesse que o amava. Queria evitar aquela realidade distorcida que tinha criado para si.

- Alguma má notícia? - sussurrou Alexander baixando a cabeça, mais uma vez.

- Não exatamente. - sentando próximo dele. - Estamos ficando sem opção! - resumiu.

- E o que isso quer dizer?

- Já discutimos o caso inúmeros vezes. Esgotamos os testes neurológicos possíveis, exames laboratoriais, ressonâncias. E, de qualquer ângulo pelo qual olhamos, Luna está em perfeitas condições.

- Então? - erguendo brevemente os olhos.

- Ela deveria estar acordada! - disparou. - Não há nenhum motivo fisiológico, plausivel, para que ela ainda esteja inconsciente!

- E isso é bom ou... - a palavra ficou engasgada.

- Aí está! Não sabemos! - erguendo os ombros.

- E você veio me contar isso... por quê?

- Porque não sei mais quanto tempo isso pode levar!

- Ela ainda pode... - não conseguia verbalizar a possibilidade de que Luna morresse.

- Sou médico, Alexander! E vou responder de acordo! Não é impossível, mas é improvável. Consegue entender?

- Na verdade não! - agora erguendo a cabeça em definitivo.

- Como eu disse, não há motivos para ela estar em coma! E se há está apenas no psicológico dela! E esse é um terreno espinhoso. - suspirando. - Não podemos fazer uma avaliação psicológica sem que ela esteja acordada! - com um expressão desconcertada.

Alexander suspirou em silêncio, mas tão profundamente, que sentiu seu peito doer. Foi como se, naquele momento, de fato, seu corpo inteiro tivesse se partido em um milhão de pequenos pedaços e ele fosse apenas incapaz de os recolher. Sentiu como se seu espírito tivesse abandonado seu corpo, levando para trás apenas uma casca vazia. O corpo, oco e sem energia, escorregou na poltrona, pesado. O que é que tinha sobrado de si? O que restava a ser feito?

Noites Sem Luar - Livro II da Trilogia do Coração Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon