Capítulo 2

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*Ponto de vista da Laura

Eu levantei da cama como se o mundo pesasse em minhas costas. Como eu vim parar aqui? Reflexos da noite anterior surgiram em minha mente... Que loucura foi aquilo? Como não estou morta agora?

Meu quarto estava uma baderna. Fui até a janela, pisando nas roupas largadas no chão, e a fechei. O vento ainda estava gelado lá fora.

... Aguente só mais um pouco... Por mim... Por nós... Foi o que ele disse. O que ele quis dizer com isso, afinal? Quem era ele? Por que me salvou?

Eu estava horrível! O cabelo parecia mais um ninho de passarinho, nem tentei arrumar. Só água mesmo iria controlar. Deixei o chuveiro ligado para ir esquentando enquanto eu escovava os dentes. Dei uma nova examinada em minha aparência no espelho, quando reparei uma mancha roxa em meu braço magro. Era a marca dos dedos dele! Realmente eu não havia imaginado os acontecimentos da noite anterior. Aquele homem alado me apanhara no ar. O que era ele? Eu precisava descobrir!

Deixo a água quente do chuveiro lavar meus pensamentos. Como eu tive coragem de pular? Sabia que minha vida não era boa, mas deve ter gente pior por aí. Culpa das vozes em minha mente! Massageei meus longos cabelos com o restinho do shampoo que ainda restava. Ensaboei meu corpo desprovido de gordura. Eu havia perdido ao menos quinze quilos nos últimos meses.

A musiquinha do meu celular invade o banheiro e meus ouvidos.

- Quer ser demitida, garota? Cadê você? - Pergunta Lise.

Caramba! Com toda essa loucura, esqueci completamente que precisava ir para o trabalho. Eu não estava exatamente acostumada com a rotina da vida de adulta. Há poucos meses atrás, tinha os meus pais que davam conta das contas. Eu só precisava estudar e tirar boas notas. De repente, tudo virara de pernas para o ar. Eu não tinha mais os meus pais e eles não tinham me deixado bens além do próprio apartamento no qual morávamos e ainda moro. Tive que trancar a faculdade de pedagogia, que era o meu sonho, e comecei a trabalhar na padaria do seu Manoel.

- Já estou chegando. - Falo, já desligando.

Lise falava demais e eu precisa me apressar para não chegar ainda mais atrasada. Vesti o uniforme vermelho que encontrei no canto do quarto, amassei o cabelo dentro da touca de fios pretos, passei um batonzinho para disfarçar a palidez de meus lábios e saí apressada.

Depois da bronca que levei do seu Manoel, fui para o meu posto atrás do balcão. Felizmente ele não mencionara a palavra demissão. Apesar de odiar meu emprego, precisava dele.

Preparar lanches... Servir doces... Limpar prateleira... Como era luminoso e bonito! Eu já havia encontrado meu salvador em sonhos algumas vezes. Era o mesmo rosto com uma mecha de cabelos loiros caindo nos olhos. O mesmo olhar castanho esverdeado distribuindo pureza. Até a manchinha no nariz era igual à do homem em meus sonhos. Aquilo tudo era tão louco! Eu precisava voltar a encontrá-lo, mas como eu faria isso?

- Você tá escutando o que tô falando? - Lise me encarava com a mão na cintura.

- Desculpa, Lise. Estava pensando em outra coisa. - Eu guardo o paninho que usava para limpar as prateleiras.- Pode repetir o que estava falando?

- Você anda muito estranha, heim... Tava falando da academia, garota. - Ela senta na banqueta da parte de dentro do balcão, vigiando se nenhum cliente se aproximava.- ... Comecei ontem. Você precisa ir também! Tem um gatinho lá...

Claro que tinha um "gatinho" lá! Lise só achava graça em algo, se envolvesse homem bonito. Ela nem precisava malhar. Tinha um corpão naturalmente perfeito, digno do título de rainha de bateria que havia conquistado no último carnaval. Nunca me lembro o nome da escola de samba que ela frequentava. Não sou muito ligada nessas coisas. Jamais gostei de carnaval... De festa nenhuma, para dizer a verdade.

- Eu não sei, Lise... - Eu não estava muito afim de malhar.

- Vamo garota, você vai gostar, e... Você tá mesmo precisando, né? - Ela ri aquele sorriso debochado só dela.

Eu deixei um meio sorriso escapar. Realmente eu estava precisando! Depois dos quinze quilos perdidos, eu estava mesmo me sentindo meio flácida.

A chegada de um cliente interrompeu a conversa. Lise se apressou em atendê-lo. Eu voltei à minha incrível atividade de limpar prateleiras. Pelo menos eu podia sonhar acordada com meu salvador, que mais parecia um anjo protetor. Eu precisava pensar em uma forma de voltar a vê-lo.

Na saída do trabalho, só consegui me livrar da Lise depois que prometi à ela que a acompanharia na academia no dia seguinte. Hoje não... Hoje eu tinha outros planos!

Cheguei em casa chorando... Fazia parte do plano. Tomei um banho longo e fiquei horas no chuveiro. Se ele me conhecia bem e estivesse por perto, saberia que aquilo não era um bom sinal. Vesti meu pijama de manga comprida, já que não queria passar o frio que havia passado na noite anterior. Amarrei meus cabelos, deixando alguns cachinhos soltos no rosto. Caprichando sempre no choro encenado. Eu podia fazer teste pra atriz qualquer hora dessa. Até eu acreditaria que estava em crise depressiva se eu não fosse eu mesma. Contive a vontade de rir. Não iria estragar o plano.

Peguei o elevador em direção ao último andar do meu prédio. Aquela noite estava tão fria quanto a última. A noite estava igual, mas eu estava diferente. Estava de alma limpa. Não aparentemente, porque estava encenando, mas por dentro, estava leve. Felizmente aquelas vozes em meus ouvidos haviam me fornecido alguma trégua.

Sentei no parapeito como já havia feito antes. Deixei mais algumas lágrimas fingidas escorrerem em meu rosto. Olhei para o céu... Para minhas três marias... Chorei de verdade ao lembrar dos meus pais. Como eu sentia falta deles! Encarei a profundidade abaixo dos meus pés... Será que meu plano daria certo? Era agora ou nunca... Cadê você, ser alado? Cadê você para me salvar?

Eu precisei piscar algumas vezes para acreditar no que via... ele estava ali ao meu lado! Meu plano havia dado certo! Com toda sua majestade superior e olhar puro sobre mim. O clarão que emanava de sua pele era tão forte que clareou a sacada mal iluminada do meu prédio. As asas não estavam visíveis, mas estava evidente para mim que ele era, de fato, um anjo. O meu anjo! Eu não consegui manter minha fingida depressão e abri um enorme sorriso de felicidade. Ele era real! E estava bem ali ao meu lado!

Só o que consegui naquele primeiro momento foi olhar para ele... Admirar sua beleza extrema, sua perfeição... Ele era uma criatura divina, estava nítido para mim. Por isso, não achava correto o rumo que meus pensamentos estavam tomando, mas não era fácil evitar. A pele de tão alva, parecia se misturar à vestimenta. A boca tão vermelha e atraente... Eu queria muito tocá-la! Tocá-lo! Me sentia inevitavelmente atraída por tamanho esplendor. Seria meu sentimento um pecado?


#Ponto de vista do anjo

Ela achava mesmo que eu estava caindo naquela encenação fajuta? Como se eu não conhecesse cada detalhe dela. Cada lágrima verdadeira... Ou falsa. O banho demorado até que me preocupou a princípio, mas assim que vi sua aura clara e límpida, tive que rir de sua brilhante interpretação. Inteligente! Mas não o suficiente para me enganar. Precisaria de mais... Muito mais para chegar perto.

Mas se ela queria me ver... tudo bem! Não faria mal. Eu já estava respondendo por ter interferido, o que era muito pior.

A carinha de felicidade dela quando eu me permiti ser visto, e a aura mudando de cor foi incrível de se ver. Eu queria vê-la sempre assim... Era como me lembrava dela antes. Antes de toda essa loucura. Antes que minha Laura viesse parar nesse pré-inferno chamado Terra.


# Se gostou, coloca aí uma estrelinha pra mim... *-*

Viu quem é o anjo aí em cima? Gatinho, né? rsrs



Anjo Meu Where stories live. Discover now