Capítulo 4: Faísca - Leonardo Amorim

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O silêncio a mesa era carregado de uma angustia quase palpável. 

Martha fora a mais afetada por aquela tragédia. A morte de Aaron martelava em sua cabeça como uma terrível enxaqueca. Restaram tantas dúvidas e tão poucas respostas que tornava tudo ainda mais difícil de aceitar. Parecia que seu filho poderia atravessar a qualquer momento por aquela porta e se sentar ao seu lado com um sorriso estampado no rosto. 

Mas sabia que não iria acontecer e isso doía.

Um enorme nó em sua garganta era o que a impedia de derramar suas lágrimas sobre a sopa. Tentava se agarrar a Jonah e Cecilia, tudo o que lhe restara de mais precioso em sua vida. Isso a mantinha calma, centrada e com o que ainda lhe restava de sua sanidade mental.

Cecilia mexia a sopa com a colher com grande desinteresse. Estava ocupada demais divagando sobre as coisas que Elliot havia lhe falado na noite anterior para se preocupar em comer. Se quisesse que o Caranguejo Eremita ganhasse vida, precisaria de toda a ajuda possível e a única pessoa com capacidade intelectual para levar o projeto adiante era ele.

Ela não tinha muitas opções, na verdade, nenhuma. Ou confiava em Elliot ou desistia de realizar o sonho do irmão - e isso não estava em seus planos.

Se Arabella ao menos estivesse ali naquele momento, seria tão mais fácil enfrentar a realidade. Pelo menos ainda tinham uma a outra mesmo que não fosse em tempo integral.

Jonah limpou a garganta.

- Eu sei que esse não é um bom momento... - disse, quebrando o silêncio. Tossiu baixinho antes de prosseguir - Mas eu preciso falar.

O que tinha para dizer deveria ser realmente importante. Desde a morte de Aaron ninguém havia dito nenhuma palavra sequer durante os jantares. Era mais fácil ouvir os vizinhos fazendo suas atividades corriqueiras do que um pequeno barulho dentro daquela casa.

Embora estivesse com os olhos fixos no marido, a mente de Martha estava distante.

- Me despediram - disse, devagar, como se esperasse por uma bronca.

Por um micro segundo todos prenderam a respiração. Podia-se ouvir tudo com clareza a sua volta. O motor de ar para os peixes no aquário, algum translúcido andando de bicicleta pela rua, o barulho artificial do tritinar dos grilos e do canto doce dos pássaros lá fora. Mas aquilo só durou até que a informação fosse digerida com uma certa clareza.

- O quê? - Cecilia disse, incrédula - Não! Eles não podem fazer isso com você, pai! Você está lá desde... De sempre!

Martha se absteve da conversa, continuando em silêncio. Seu olhar perdido em algum pensamento doloroso demais para ser compartilhado. 

- Você ama aquele lugar! Aquilo é tudo pra você!

- A situação é mais complicada do que parece, querida...

- Complicada? Eles não podem despedir o melhor funcionário que possuem! Ainda mais agora que... Que... - e parou subitamente, as palavras entaladas em sua garganta. Eram dolorosas demais para serem pronunciadas.

Jonah abaixou a cabeça, sentindo o pesar do que não havia sido dito.

As mãos de Martha começaram a tremer involuntariamente, mas ninguém pareceu notar.

- Desde que Aaron... - ele começou a dizer e seus olhos se encheram de lágrimas - Desde o incidente com seu irmão e da decisão dos Grã-Arraias de que nenhum translúcido sairia da Concha, as coisas começaram a ficar feias.

O Caranguejo EremitaWhere stories live. Discover now