6.

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Raul me olhava todo contente. Eu sabia mesmo que ele adorou a novidade de morarmos juntos.

— Seu pai foi muito legal com a gente. Acho que ele imaginou o que estamos passando.

— É mais que isso, Raul — Olhei para baixo triste. — Eu não tenho mais a magia que tinha antes, sou praticamente uma laluli — Ele me olhou ferido. — Não quero te magoar. Não é por isso que estou falando isso. Mas é que tem uma regra muito clara que você conhece bem. Lalulis moram com lalulis e braites com braites. A energia da casa, bom, você sabe como isso é valorizado pelos braites, a leveza que precisamos cultivar para levitar, a importância das casas flutuarem nas alturas e...

— Eu sei, a tristeza nunca pode fazer parte — ele me interrompeu.

— Ela faz — respondi séria. — Mas temos que fazer de tudo para ela ir embora.

— Desculpe eu não quis te magoar — ele disse sem jeito.

— Eu sei. Meu pai não me disse nada. Mas eu desconfio que ele e minha mãe já se enfraqueceram desde que eu, bem, você sabe, desde que estamos juntos. Eu já colaborava com uma parte da energia de casa.

— E além disso seus pais estão tristes que você esteja comigo — ele reconheceu.

— Pois é. Se eu não sair de casa, eu nem sei o que pode acontecer a eles. O certo é eu trilhar o caminho que escolhi. Não tem jeito.

— Você parece triste — Raul disse chateado.

— Não vou mentir para você, Raul. Tudo aconteceu rápido demais. Tô assustada.

Raul me abraçou forte. Ele reconhecia o sacrifício que eu estava fazendo para tê-lo ao meu lado e sofria comigo, mas como eu odiava ter que fazer sacrifícios... Ver minha magia morrendo e meus pais sofrendo me fazia questionar minhas escolhas a cada minuto.

Eu não tinha dúvidas que eu era louca por Raul, mas será que eu estava certa? "O amor faria tudo valer a pena. O amor era a maior força que existia e dele brotavam sentimentos maravilhosos. O amor era transformador". São essas as lições que aprendemos como Braites sobre o amor, é a sua energia, a energia do que sentimos por aquilo que gostamos, que queremos, que somos agradecidos, que nos faz feliz e realizados, que tem poder para mudar o mundo à nossa volta, transformar e fazer magia. É a energia do amor que transforma tudo. É o nosso coração que é o responsável pela verdadeira magia. Por isso, nunca achei que tinha lógica em acreditar que amar um laluli era ruim. Mas agora, vendo meus pais sofrendo, eu exilada de meus amigos e da minha própria casa, eu me perguntava se tinha sentido tudo aquilo que eu acreditava de uma forma tão louca, quanto solitária. Talvez meu pai estivesse certo, lalulis e braites simplesmente não podem ficar juntos, podia ser uma regra da natureza que eu agora insistia em quebrar. Existiu um motivo que nos separou um dos outros no passado e esse motivo precisava ser honrado no presente. Eu desrespeitava essa regra e pagava o preço com minha própria vida que estava revirada do avesso.

Papai nos buscou na escola conforme prometido. Eu via a alegria extravagante de Raul e me culpava por não estar tão feliz quanto ele, mas nós estávamos sentados em lugares bem diferentes. Raul tinha a garota que amava, viveria onde sempre viveu. Eu, por outro lado, fui excluída da vida dos braites, dos meus pais e amigos, da minha própria casa e tinha a mesma magia que um laluli qualquer... E tudo isso só com dezesseis anos. Ainda bem que os braços de Raul me envolviam. Eles eram tudo que me seguravam para não sair correndo dali.

No caminho Raul e meu pai tinham se dado bem e conversaram sobre coisas triviais como se a vida pudesse simplesmente seguir adiante. Eu estava muda e já não conseguia disfarçar que sofria. Eram os braços quentes de Raul que me impulsionavam a seguir em frente. Só eles. Era tudo o que me apoiava e tinha. Só meu amor. Eu rogava aos sábios magos da antiguidade para ele ser suficiente.

#ACREDITE (VENCEDOR DO #THEWATTYS2018)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora