-Tudo que estou dizendo é que, alguém coloca a coroa na cabeça de um tolo e espera que um país continental como Russia, que Deus a tenha, funcione!-A voz de Peter ecoa pelo bar, ou melhor pelo porão do bar.
Era frio e bebiam vodka que descia quente. Fazia cinco meses que Maria Nikuli começou a trabalhar no palácio. Fazia cinco meses que Michel, o menino misterioso que cheirava a lavandas e cinzas mandava cartas em uma caligrafia caprichada, com rosas vermelhas.
As criadas fofocavam é claro, quem era o misterioso garoto que mandava flores para uma jovem tão estranha como a loira.
Maria não costumava dormir. Tinha uma vela tinha que ser reposta toda a manhã, descontada de seu salário é claro. Ela passava a noite adentro lendo. Não livros de romance ou poesia. Nikuli estudava medicina. Anatomia.
Peter e Ainer estavam sentavam juntos numa mesa de madeira velha e a luz vinda da vela era pouca. Pouca e amarelada. Ainer Lenin era uma figura curiosa, cabelos escuros e olhos verdes. Uma pele avermelhada por conta de um sol invernal que refletia numa neve constante onde ele costumava morar antes de partir para São Petersburgo ao lado do pai, alguns meses atrás. Filho de um comunista Ainer era um desbocado.
-Gracinha-disse o desbocado, levantando o chapéu para cumprimenta-los-Não tão Gracinha
-Lenin, Sr.Morovizt! Boa noite-diz como sempre o educado e formal Michel
-Boa noite-repetiu Maria.
Cinco meses depois e a voz dela ainda tremia, era suave e não parecia violenta o suficiente.
Nesse momento uma figura alta e imponente cruzou a sala. O homem era pálido, de cabelos ralos e olhos escuros. De perna esquerda manca que não retirava sua autoridade. Seu nome era
-Pai?-o jovem Ainer sussurrou ao se levantar, de coluna mais ereta que nunca.
Enquanto o escárnio se estampava no rosto do mais velho. Com seus olhos amarelados se ofuscando e lábios secos, machucados num vermelho podre, entortando em desgosto. O mais jovem tinha suas orbes verdes preenchidas por um vazio. Uma vergonha que ele não deixou subir até suas bochechas.
-Ainer-ele disse, quase surpreso- Não espera te encontrar aqui.
Lenin vê um menino que ele perdeu. Vê um garoto que já não pode fingir que há alguma escapatória, em livros ou trenzinhos. Um garoto que escapou pela ponta de seus dedos. Um garoto que é um homem.
Ainer vê um soldado da liberdade. A sombra de um homem que ele não pode ser. Os restos. As sobras. As cicatrizes de um herói. Ambos, naquela bar pútrido onde um água pestilenta pingava um piso que rangia, se tornaram espelhos um do outro.
-Não que você esperasse alguma coisa, até por que, não estava na Suíça?-exclamou Ainer
Lenin olhou para o chão, depois para a parede. Tentou fugir do olhar acusador de seu filho. Seu único filho.
Maria assistia a cena avidamente. Duas figuras que conhecia bem. Mas de jeitos diferentes.
Ainer deu de ombros e agarrou o pulso da jovem Nikuli. Arrastando a menina pra fora, antes mesmo que ela pudesse discutir salários, revoluções, direitos e voto.
O jovem Lenin largou o pulso dela quando o vento frio atingiu os dois e Maria pode ver o rosto dele. Lágrimas escorriam por mais que fosse evidente que ele lutasse contra elas.
-O que foi aquilo?-ela perguntou quando ele apenas sentou no meio fio.
-Posso te levar até em casa?-ele perguntou secando as lágrimas
Ela acenou que sim e ele a entregou uma fita vermelha.
-O que eu faço com isso?-ela diz
Ele se levanta e toma os cabelos da menina. Os prendendo num rabo de cavalo baixo.
-Você usa, gracinha-ele diz guiando ela pelas ruas de São Petersburgo. Eles andam em silêncio lado a lado. Maria entrou pela área de serviço. Tentando passar desapercebida mas sente mais uma mão gélida tocando seu pulso. Dessa vez uma mulher idosa e de vestes roxas.
-Você é Maria Nikuli? A estudante de medicina-ela acena que sim-Venha comigo

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⏰ Última atualização: Jul 18, 2019 ⏰

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