Hello Darkness | Romance Lésbico (Degustação)

19 | SR. E SRA. CUMBERBATCH

Meus dedos tocaram o vidro gélido, causando-me um arrepio momentâneo.

No lado de fora, uma chuvinha rala descia dos céus, a qual fazia com que o restante dos alunos procurasse um lugar coberto para se esconder. Havíamos perdido os fracos raios solares do início do mês, cujo lugar fora dado para o intenso frio.

Outubro se aninhava para chegar o quanto antes, logo ali na próxima semana, assim como a metade de outono. Mas a nossa maior expectativa não estava na entrega das notas dos trabalhos, embora os veteranos estivessem muito ansiosos. Os calouros em questão queriam a chegada do inverno, dos feriados, do término dos trotes. Tudo para nos manter o mais distante de Hamish.

O tumulto na porta do Red Devil não havia sido por acaso. Pelo o que ouvi da boca de Mabel e posteriormente de Charlize, um veterano espalhara algumas fotos de uma caloura nua pelas redes sociais e o namorado da garota fora tirar satisfações. Ninguém havia previsto que o pessoal saíria na mão, mas acontecera.

A partir daquele dia, uma onda de medo se instalara no campus. Antes os desaforos dos veteranos eram mais escondidos, disfarçados nos "trotes". Mas agora era praticamente uma lei que eles nos humilhassem abertamente. Era foda andar pelos corredores sem ouvir um comentário ou levar um empurrão.

O pior de tudo era que ninguém estava disposto a fazer nada. Eu havia enviado a terceira carta para zombar da valentia dos veteranos há mais ou menos uma semana, e estava realmente assustada com o rumo da situação, porque os calouros não estavam ajudando o autor anônimo. Enquanto isso, os veteranos estavam me caçando. Eles queriam saber quem estava fazendo aquilo de qualquer jeito, porque era uma afronta muito grande zombar da "realeza."

Eu sabia que daria ruim para mim se descobrissem, por isso decidi que não escreveria mais nada para o Talking to Hamish e esperaria outra pessoa tomar alguma iniciativa. Eu sentia o perigo me rondando, e aquilo não era um ambiente saudável. Simplesmente não dava para brincar com fogo, e eu tinha outras pendências para ocupar minha cabeça, tipo a minha análise.

Charlize Hancock estava sendo maravilhosa no último mês. Não nos encontramos em mais nenhum outro lugar senão na sua sala dentro do prédio da Literatura, mas estava tudo bem. Somente por ficar em sua presença, sentar em uma cadeira próxima ou dividir um lanchinho da tarde, já estava de bom tamanho. Eu não esperava que ela fosse ser tão simpática e prestativa, mas acho que algumas ocorrências meio que fizeram que a gente se aproximasse rapidamente.

Minhas amigas não acreditavam que estava sendo maravilhoso trabalhar com a Elsa do Frozen, e elas estavam quase suspeitando que eu tinha algum sentimento escondido pela minha monitora. Daphne, enquanto isso, estava me evitando desde o incidente do refeitório. Eu estava realmente chateada com sua atitude, tanto que não a procurei mais.

Eu não havia feito nada de errado, e mesmo que Mabel tentasse nos unir novamente, Daphne relutava em falar comigo. Qual é? Eu mal estava falando com Seth Ayde nos últimos dias. Era bobeira brigar por garotos, mas se ela queria assim, então beleza. Eu também sabia ser rancorosa.

Tirei meus olhos da janela e voltei-me para Charlize Hancock, a qual estava condensada na última página da análise que eu havia escrito ontem. Ela lia, corrigia e me dava dicas, além de indicar alguns materiais para ler. Ela me apresentara um texto teórico de Edgar Allan Poe, e mesmo que o amasse com todo o meu coração, achei bizarro algumas coisas que ele escrevera.

Basicamente, ele não acreditava em inspiração, e tal sentimento era a única coisa que me movia para escrever. Como assim não acredita em inspiração, Sr. Poe?, era o que eu me perguntava enquanto lia. Por exemplo: só de vir para sala de Charlize e olhá-la por tempo indeterminado me dava inspiração para escrever qualquer coisinha melosa — talvez uma poesia (embora eu odiasse poesia, algo que era bem irônico para uma estudante de línguas e literaturas).