⥇ EPÍLOGO: CARTA AOS VIVOS

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TRÊS MULHERES CANTAM A CANÇÃO

E O GRITO DE HORROR AGITA A MULTIDÃO.

AS CRIANÇAS BOAZINHAS DEVEM OBEDECER,

E AS MÁS, APODRECER.

          A MENSAGEM FORA ENCONTRADA no salão de festas. Sobre a tinta branca da parede, o vermelho-carmim brilhava como o próprio fogo do inferno. Os convidados, ansiosos e amedrontados,  amontoavam-se em grupos, abraçando uns aos outros. E, conforme o tempo passava, o murmurinho só aumentava. Detetive Chase parou em frente aos dizeres, observando cada letra com o máximo de atenção. Atrás dele, Burns esforçava-se para não vomitar. O cheiro de podridão e umidade que se alastrava pelo lugar começava a sufocá-lo aos poucos.

          — Acha que seu plano vai funcionar, Chase? — ele perguntou, tampando o nariz. Ao lançar um rápido olhar para os lados, notou que o Sr. e a Sra. Harrison escoltavam os convidados para o outro cômodo com a ajuda de Mila. O jovem William permanecia no mesmo lugar, inquieto.

          — Será um grande risco — confessou Chase , girando os calcanhares para a direção oposta. Apanhou a maleta da mão do companheiro e seguiu em frente. Burns correu para alcançá-lo. — Esse não é um caso comum...

         — Leu a mensagem. — não era uma pergunta. Chase olhou para os lados, os dedos corriam sobre os fechos da mala com agilidade. — O que os versos significam? 

          Chase suspirou.

          — Significa... que precisamos tirar as crianças daqui... precisamos tirar todos daqui. — ele apanhou um charuto e um livro do tamanho de sua mão com capa de couro do interior da mala, fechando-a logo em seguida. — Arrume um jeito de contatar a polícia e não conte a ninguém. Nesse momento suspeito até de mim mesmo — Burns soltou uma risada abafada, as feições de Chase continuaram sérias.  Antes que pudesse entregar a mala para Burns outra vez, o jovem William se aproximou. 

           — Detetive — o rapaz chamou. Chase arqueou a sobrancelha e fez um sinal com as mãos para que ele continuasse. — Acho que descobri uma pista.— Tanto Burns quanto Chase arregalaram os olhos,surpresos. Os dois homens se encararam e então retornaram sua atenção para o rapaz. As mãos de William estavam inquietas e o rosto pálido. 

          — O que está esperando? — Chase guardou livreto no bolso interno do paletó e gesticulou com a mão livre.— Leve-nos até lá.

          O rapaz assentiu e guiou o caminho até a cozinha, onde uma poça de líquido vermelho cobria o azulejo do piso. O rapaz continuou caminhando, ignorando completamente o vinho derramado. Os dois homens observavam o cômodo com atenção. Era a primeira vez que adentravam o espaço. Ao desviarem da poça, depararam-se com William parado em frente a porta da dispensa. Estava entreaberta.

          Ao abri-la, o horror.

          Olhos tão brancos quando neve tomavam o lugar das íris coloridas que antes expressavam vida. O corpo pálido, coberto por cortes e sangue, estava caído no interior do cubículo. Larvas e insetos mordicavam os pedaços de carne podre em decomposição, entrando e saindo dos buracos cravados na superfície da pele. A boca estava aberta. 

          — Ele morreu gritando — a face de Burns estava contorcida e, apesar dos esforços, não conseguiu conter o enjoo. Só teve tempo de girar o corpo para o lado, evitando atingir os restos mortais. O homem apoiou a mão esquerda na bancada e arqueou a coluna. O vômito saiu rápido, misturando-se ao vinho logo em seguida.

          Chase reprimiu o instinto de se afastar. Focava sua atenção no defunto à frente. Parecia estar ali há dias e, a julgar pelo tamanho dos ossos, era impossível ser o corpo de um homem adulto. Um suspiro pesaroso escapou de seus lábios antes dele gritar:

          — Chame o Dr.  Timlin — ele desviou o olhar, os buracos recheados de sangue e bichos ainda invadiam sua mente —, rápido. — ele acrescentou, e William disparou para fora, acelerado.

          Burns finalmente se recuperou e tossiu, assumindo uma posição ereta ao lado do companheiro. 

          — É uma criança? — Chase concordou, enquanto fitava o relógio em seu pulso — Preso na dispensa da cozinha... por tanto tempo... Como ninguém viu ou sentiu o cheiro? — Chase continuava em silêncio, fitando o relógio. — O que tanto está procurando aí? — Perguntou burns e o homem bufou, irritado.

          — Não estou procurando nada. — disse Chase, erguendo o olhar, ignorando os questionamentos de Burns. O homem ainda exprimia a mesma careta confusa. — Estou fazendo cálculos... contando as horas.

          — E? — Chase cogitou estapeá-lo. Será que nunca prestava atenção em nada? 

          —  Diga-me, Burns, o que vem depois do dia trinta e um de outubro? — ele perguntou, erguendo uma das sobrancelhas. E, aos poucos, a confusão deixou os olhos do companheiro. 

          — Primeiro de novembro — respondeu, com a voz arrastada —, o dia de todos os santos...

          

Continua...

Noite Das Bruxas | CompletoWhere stories live. Discover now