Capítulo 5 - Sobre festejos e maldições

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A Noite de Míria do quadringentésimo trigésimo segundo ano da herança de Káurea se aproximava, e dataria exatos 6 meses desde que o cozinheiro Belman havia se encontrado pela primeira vez com a ladra Lifa. Fora um encontro inesperado, de fato, mas que frutaria uma grande amizade que por vezes se confundiu em seu real propósito. Do dia em que Belman revelara sua história de perdas e renascimento à Lifa em diante, ambos moraram juntos por um período de 5 semanas e 3 dias. A partir de então, a garota com espírito individualista passara a alugar um quarto na parte nordeste da feira flutuante. Um lugar barulhento e pouco requisitado, mas que serviria para quem só pretendesse usar quartos para fechar os olhos e abrir. A garota agora trabalhava na taberna mais famosa de Mascapur, a Tantom's, que nem mesmo se estabelecia nos limites dos muros da cidade, mas que de qualquer forma precisava da assinatura do visconde para existir.

Como prometido pelo jovem cozinheiro que lá trabalhava antes dela, pudera fazer amigos, não aquelas amizades que se puxa da cartola e tem o prazo de validade de um vacilo, mas amizades verdadeiras, que também podem ser chamadas de família.

Belman pôde notar com o saltar dos meses que uma identidade ímpar se revelava no cerne de sua mais nova amiga. Apesar da personalidade recatada que Lifa apresentara nos primeiros dias e semanas, a garota se mostrava uma fonte de bom-humor e educação, e logo se transformou no novo rostinho bonito e simpático da casa. Com tudo isso, Belman não precisou mais se desgastar todo dia em duas profissões, e reservou suas habilidades apenas para a cozinha.

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No dia de Míria, os funcionários da taberna foram chamados por Tantom para se reunir antes do segundo sino. Nessa hora da manhã o recinto se encontrava desprovido de qualquer bebum em potencial, e os 7 sonolentos pouco entendiam o porquê de tal convocação. Até mesmo Edbert estivera presente, apesar de não ser de fato um funcionário.

Belman tivera sido o último a chegar. No momento em que adentrou a taberna e badalou a sineta da entrada, as cabeças que estavam ali se viraram para ele. Edbert se encontrava sentado na escada de dois degraus do palanque, conversando com Andros, em pé, enquanto limpava o alaúde com um pano de seda. Numa mesa circular, logo ao lado dos dois, as 4 adoráveis moças: Frida, Tuda, Bisca e Lifa, também conversavam antes de terem a atenção virada para o garoto recém-chegado. Quando o olhar de Belman pousou em Lifa, ambos sorriram intimamente.

– Eu não sei vocês – disse o cozinheiro, estralando as costas. – Mas estou sentindo que vamos ter de trabalhar até que os cabelos da perna desistam de viver e se joguem no abismo.

Edbert e Andros tossiram um par de risadas.

– Vendo você falar agora – disse Frida. – Tantom nunca nos fez reunir tão cedo assim, mas acho estranho que não tenha falado nada além disso.

– Deve ser porque é óbvio demais para se explicar – comentou Tuda. – Hoje é Míria, afinal, e lembro que da última vez os meus tornozelos ficaram tão inchados que eu tive de voltar descalça para casa.

– Mas afinal, onde está aquele urso? – perguntou Edbert. – Faz questão de chamar até o pobre bardo de manhã e nem se preocupa em chegar antes dele?

– Achei que o Tantom morasse aqui – disse Lifa. – Ele não é sempre o último a ficar e depois tranca as portas?

– Ele deve estar nos fundos, arrumando alguma coisa – disse Bisca, olhando carrancuda para Edbert. – Está vendo pobre bardo? Até Lifa que trabalha aqui a menos de um semestre sabe o mínimo sobre a vida dos colegas.

– Ei, não são vocês mesmos que adoram repetir que eu não sou funcionário? Pois bem, se quiserem eu posso passar a saber mais da vida da adorável Meliborgo.

A Caveira de LuzWhere stories live. Discover now