Capítulo 1

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Enjoy...

Aleksei

— Respeitável público, o Circo Gorkov apresenta a vocês o momento mais esperado do espetáculo. Ele... o destemido... o corajoso e... o invencível domador de leões... Vladmirovich Gorkov!!!!

O apresentador anuncia, exaltando demasiadamente para a grande plateia, a próxima atração. Sorrio ironicamente por Dória ser tão ingênuo ao achar que puxar o saco do insensível Adrik lhe garantirá alguma posição melhor dentro do circo.

Viedniylaga!!!! Não percebe que nunca deixará de ser apresentador aqui por causa da arrogância de Adrik, que não divide com quem quer que seja uma mínima possiblidade de poder, nem sua ambição o deixa sequer considerar dividir lucros. Até eu, um rapaz de apenas dezoito anos, posso ver isso...

Canhões liberam fumaças coloridas em direção ao centro da arena, que dançam entre as luzes, com o intuito de ocultar dos olhos da plateia as jaulas dos leões que adentram o picadeiro.

Tendo terminado meu show com meus colegas, tiro meus acessórios de trapezista, prestando atenção no orgulhoso Adrik, o domador e também dono do circo, que estufa o peito e acha que sua performance será a melhor atração da noite. Mas, se as pessoas pudessem ver como ele maltrata os animais do circo, decerto o abandonariam sozinho com seu show.

Um cheiro forte de plástico queimado faz arder meu nariz e lacrimejar meus olhos. Não me conformo que, com o grande lucro que o circo tem, o gimot não seja capaz de trocar os equipamentos de segurança ou até mesmo modernizar o processo de liberação dessa fumaça do espetáculo, que deve ser para lá de tóxica, de tão velhas que são as máquinas. Este circo está, há muito tempo, com lonas desgastadas, material vencido, estacas e mastros podres, entre outras coisas problemáticas! Isto sem falar dos artistas explorados, que nada podem fazer porque são ou ilegais no país ou parentes deles.

Assim como eu, a maioria é russa. Minha equipe de trapezistas não rende as melhores performances de que é capaz por falta de motivação e pela constante humilhação a que somos submetidos todos os dias pelo dono do circo. Os palhaços, meus grandes exemplos de artistas, como tais, conseguem tirar sorrisos lindos da plateia enquanto que, por dentro, choram pelas agruras e injustiças que somos obrigados a suportar diariamente.

Adrik chega a ser tão desumano que, em inúmeras vezes, pensei em várias maneiras de fazer com que sofra no bolso por sua crueldade – porque ter prejuízo ou não poder ganhar mais e mais dinheiro são as únicas coisas que o fazem sofrer —, já que conseguir um tratamento justo e digno para todos nós tem sido quase que impossível.

Desde que cheguei aqui, com dezesseis anos, venho substituindo todos os que ficam impossibilitados de se apresentar, tentando impedir que sejam punidos com as impetuosas retaliações de Adrik. Dou tudo de mim para ver o público aplaudir e sair satisfeito, ao mesmo tempo que quero aprender o máximo que puder para que, um dia, possa deixar este cárcere privado e, quiçá, levar alguns pobres coitados comigo.

É por isso que, nestes dois anos desde a minha chegada, exercito-me no trapézio por horas a fio, treino com muita concentração com Boris, o atirador de facas, faço exercícios com os contorcionistas e equilibristas, assim como também aprendo algumas atividades que me dão prazer, como os truques e brincadeiras dos palhaços e as peripécias audaciosas dos motoqueiros no globo da morte. Acabo sendo o que aqui, no Brasil, chamam de pau para toda a obra.

Faíscas saindo de um emaranhado de fios chamam minha atenção, dando início a um curto circuito na precária fiação do circo. O fogo começa a correr como num pavio em direção ao barril de pólvora, iniciando-se um incêndio que se alastra tão rapidamente quase tanto quanto o breve intervalo que levo para inspirar e expirar o ar de meus pulmões. Atinge a lona desgastada e ressecada, que começa a queimar.

A Fênix de FabergéOnde as histórias ganham vida. Descobre agora