Capítulo 5 e 6

499 48 11
                                    

Desde que era pequeno, bem criança mesmo, morando em cidades do interior, levado por um pai que nunca ficava satisfeito num lugar só e uma mãe aventureira e louca pelo marido, assistia a duas formas de viver o mundo muito diferentes, a que seguia todas as regras e convenções da sociedade e aquela que as transgredia continuamente, mostrando como a realidade acaba, muitas vezes, tendo limites frágeis e ridículos, principalmente quando o ser humano libera seu lado transgressor.

Por isso, ficava intrigado com o encantamento das pessoas, em determinadas situações, ao admirarem aqueles que "transgrediam" certos códigos normalmente estabelecidos. Ora, se eles seguiam as regras, aceitavam-nos e, muitas vezes as impunham aos filhos, familiares, empregados, colegas e a todos com os quais conviviam, por que admiravam e, muitas vezes, até riam das ditas "transgressões"?

Estaria na alegria das coisas descomplicadas a felicidade?

Esse enigma norteou minha infância e adolescência e, por incrível que pareça, teve influência numa das coisas que escolhi fazer, me permitindo revelar aquilo que mais quero esconder. Quando todos almejam vencer, não me importo de perder; quando todos ao meu lado voam, eu opto por cair; quando as feras são domadas, eu sou indomável e, quando todos tentam vencer usando o poder que têm, eu venço pela fraqueza... porque eu tenho uma grande vantagem, eu perco, mas sempre recomeço! Aparentemente um perdedor, eu crio e me recrio, capturando as pessoas por sua humanidade, não por sua capacidade de superação.

Sim, eu sou aquele que faz as pessoas ficarem felizes quando estão tristes, que distrai a atenção delas quando muitas coisas acontecem ao redor. Sou o que as tira de suas reflexões a respeito do que são, do que devem ser e do que querem ser, transportando-as para aquele espaço único e mágico em que podem apenas se sentirem bem e felizes, sem culpa e questionamentos.

Eu visto minha máscara, revelo meu sorriso, caminho e, com simples gestos e peripécias sempre desajeitados, torno o mundo das pessoas um lugar feliz, em que é certo rir das coisas mais simples e mundanas sem ser condenado ou ficar com dor na consciência por isso!

Riem apenas pelo prazer espontâneo de o fazer!

Riem porque essa é a primeira expressão involuntária que têm ao ver como sou e o que faço! Em poucas palavras, eu levo alegria sem culpa!

Quanto a mim?

Ah, como todos, ao vestir minha máscara, sou só júbilo, ela me esconde de mim mesmo e não revela a ninguém quem realmente sou.

Sim...

Tal como eles, ao olhar para mim mesmo, posso chorar ao ver o tamanho de minha imperfeição, mas, com minha máscara, torno-me aquele que, como dizia Eduard Blake, personagem de Watchmen, dos quadrinhos, "quando percebe que tudo é uma piada, O Comediante é a única coisa que faz sentido."

Eu sou, literalmente, O PALHAÇO.

Nasci Aleksei, que significa guerreiro ou guardião, mas sou conhecido, entre outros, como o Palhaço Bim Bom.

Ninguém pode nem chegar perto do que mais me motivou a representar a criatura que faz todos rirem até as lágrimas. Não podem, definitivamente, avaliar o monstro deformado que os leva às gargalhadas histéricas e à evasão do mundo real. Nesses momentos, nem mesmo eu posso! Eu, esta real e patética representação da metáfora do palhaço...

E foi assim que Kenya, mal tendo chegado, me encontrou, sem que eu estivesse preparado para isso, porque ela deveria ter chegado uma hora mais tarde do que chegou, o que teria me dado tempo suficiente para tirar a maquiagem e a roupa de palhaço e ir recebê-la. Se pudesse, teria cancelado meu compromisso anterior, mas decepcionar as crianças da Casa de Apoio à Criança com não era, definitivamente, uma opção, pois estavam aguardando o show do Palhaço Bim Bom há dias.

A Fênix de FabergéWhere stories live. Discover now