Março III

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A energia demorou a voltar - tanto do apartamento, quanto a nossa. Enquanto estivemos no escuro, ficamos quietos. Uns vinte minutos depois, quando a lâmpada do quarto piscou e depois uma coleção de alarmes disparou – da portaria do prédio, do portão da garagem, do prédio ao lado... – Renan se levantou para guardar o notebook direito dentro da gaveta da mesinha. E depois voltou a se sentar do meu lado.

Eu não fazia ideia de como ele estava se sentindo, mas comecei a me incomodar.

– Então – sua voz me fez encará-lo. Acho que o Renan estava aprendendo bem demais comigo como esconder as coisas, porque não dava para saber o que se passava na sua cabeça.

– Então... o que... o que achou? ­– gaguejei. De novo, mesmo tendo me preparado psicologicamente para aquilo, descobri que não havia preparo suficiente.

Renan encolheu os ombros, ainda me fitando. Sua mão esquerda foi parar na silhueta do pingente sob a camisa do uniforme. Ele o contornou com os dedos e se demorou um pouco no ato, respondendo bem depois. Mas foi completamente sincero, no fim das contas:

– Eu só quero que a gente seja feliz.

Ele não disse Sander, "eu quero que o Sander seja feliz". Também não disse "eu"... Não.

Ele incluiu nós todos na frase.

– Se ele tá a fim do cara e o cara tá a fim dele, que é o que parece, então eu não tenho que achar nada, né? Só torcer pra dar certo... – Renan esticou as pernas sobre o piso de madeira, fazendo um alongamento que o professor novo de Educação Física havia nos ensinado. Ajudava a manter a calma, eu me lembrei.

– Nossa, que maturidade. – me surpreendi sinceramente. Ele revirou os olhos na minha direção.

– Daniel, eu e o Sander terminamos em Dezembro passado, caso você não se lembre. Ano novo, vida nova. Ele está lá nos States, eu estou aqui embaixo, bem, bem distante. – no movimento que fez, o pingente pendurado na corrente em volta do pescoço ficou visível. Era uma plaquinha de metal com escritos. Renan guardou-a novamente por debaixo da blusa do uniforme antes de voltar a falar. – Não vou falar que não fiquei um pouco surpreso ou algo assim, mas ia acontecer mais cedo ou mais tarde, né? E o Sander nunca ficaria com ninguém sem me contar antes... sem nos contar antes.

– Você vai contar pra ele quando estiver com alguém também? – questionei, sem pensar muito.

– Sim, pretendo. – ele voltou a me olhar nos olhos. – Não fiquei com ninguém depois dele, mas se isso acontecer não vou deixar de contar. Ele gostaria de saber, assim como ele sabe que eu gostaria de saber sobre ele. – Renan fez uma pausa, ainda me encarando, e completou. – E sobre você.

Ele gostaria de saber sobre mim?

Ah, eu acho que não. Melhor não.

Não, definitivamente, não.

– Você ainda usa aqueles aplicativos, não usa? – ele perguntou, de supetão.

– Sim. – respondi, incapaz de mentir.

Pare, pare, pare....!

– Imaginei. – os lábios do Renan se comprimiram numa fina linha de amargura. – Não pretende parar?

– Não sei se consigo. – minha voz saía sem que eu percebesse.

O que estava acontecendo comigo?

Renan bufou.

– Como assim? Quer dizer que você prefere ficar com um cara desconhecido do que com alguém que você pode conhecer primeiro? Prefere nunca mais ver a cara dele depois? Ou que só tem cara interessante no virtual? Ou...

Ele foi emendando uma pergunta na outra, subitamente nervoso.

– Não foi isso que...

– Porque eu consigo ver gente interessante aqui fora, que às vezes vale a pena tentar... E tá cheio de lugar pra sair e conhecer gente nova, o tempo todo. Mas não é o bastante pra você? Tipo, tem que ser um cara com um carrão, a conta bancária de seis dígitos, e que você nunca mais vai ver depois de transar... é isso? – ele respirou rapidamente, quase perdendo o fôlego no meio do caminho. – Por que, né, como você me disse uma vez, "é só sexo" que você quer.

Nós nos encaramos. Balancei a cabeça.

– Você não entende.

Renan ficou calado por um tempo e depois soltou, entre os dentes:

– Se você me explicasse, talvez eu pudesse entender.

Um trovão soou ao longe, me fazendo arrepiar.

– Preciso ir embora. – foi a única coisa que eu disse. A tempestade caía com violência, mas já se passavam das cinco e meia. Eu realmente precisava ir embora para não chegar muito tarde e correr o risco de despertar a fúria do dono da minha casa. Eu não aguentaria...

Renan não interpretou bem a minha fala, porém, e só bufou em resposta, me acompanhando em silêncio sem a menor cerimônia até a porta do apartamento. Ele não insistiu pra que eu ficasse, não deu conselho algum, nem ofereceu para me pagar um taxi, como eu acho que normalmente faria. Ele sequer desceu ao térreo comigo.

Nos despedimos com um "tchau" seco e desonesto no corredor do sétimo andar, de frente à porta da sua casa.

No fim das contas, eu nem usei a sombrinha da minha mãe. Preferi deixar que a água da chuva tentasse lavar toda a podridão que eu via em mim no caminho para o ponto de ônibus.

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Feliz Natal pra vocês e espero que mesmo o capítulo tendo sido um pouco amargo, saibam que as águas limpam tudo pelo caminho ~


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Então CORRA porque a história é bem amorzinho do jeito que a gente tá precisando, vai <3

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Aprendendo a Gostar de Você {Aprendendo III}Where stories live. Discover now