CAPÍTULO 06

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— Até mais então, Sr. Broadbent — anunciei, a bolsa a tiracolo já no meu ombro enquanto eu abria a porta de seu escritório. Tínhamos encerrado a reunião há alguns minutos, onde tratamos do livro novo de Vincent e do andamento de Memorabilia, assim como fui elogiada a respeito da aprovação de Tyra Elisa aos nossos cuidados com sua obra. Depois de organizarmos a papelada, julguei-me livre finalmente para meu esperado descanso em casa e ao dia de home office que viria.

No entanto, Ez parecia ter outros planos. De novo.

Eu nunca gostara muito de sair e ter uma vida social ativa, por isso sempre tinha ótimas desculpas prontas para qualquer convite que não me interessasse, mas nunca havia precisado usar tantas delas quanto neste último mês. Apesar de ver Ez apenas quatro vezes por semana (graças ao meu abençoado dia de home office não eram cinco) parecia que ele estava lá o tempo todo, em cima de mim. Praticamente todos os dias depois que encerrávamos nossas atividades ele me convidava para algo diferente ou me segurava um pouco mais com qualquer desculpa. Nos primeiros dias, eu não tinha coragem de recusá-lo, ainda mais porque não sabia se aquilo afetaria muito meu cargo. Ao chegar à exaustão depois de uma semana que pareceu ter sido totalmente dedicada a ele, eu decidi que estava na hora de usar meu arsenal de desculpas esfarrapadas e agora Ez provavelmente imaginava que eu tinha uma vida um tanto absurda com o tanto de coisa que eu usava para despistá-lo.

Tendo ficado mais esperta depois das primeiras semanas, agora sempre que encerrávamos o que precisava ser feito eu já me punha de partida antes que ele pudesse fazer o convite. Talvez minha leveza ao lembrar que amanhã era dia de home office e que eu não precisaria vê-lo tenha levado o melhor de mim hoje, me deixando mais lerda e, como consequência, me fazendo ouvir:

— Você não gostaria de tomar um café na Clover Leaves? — eu havia interrompido meus passos na porta, olhando por cima do ombro o meio sorriso que Ez portava, como se aguardasse o que seria minha desculpa dessa vez, quase como se imaginasse que eu não havia mais o que eu pudesse dizer para recusá-lo.

Mas ele estava enganado.

— Ah... agradeço o convite, Sr. Broadbent. Mas, além de a areia da minha gata ter acabado, meu pai está ansioso para falar comigo por Skype quando eu chegar, então não posso me demorar — falei, o que mal era uma mentira, já que provavelmente era um bom momento para eu ligar para meu pai e conversarmos um pouco.

Honestamente, toda a coisa de chefe chamar funcionário para sair era errada e eu não entendia como ele podia tão abertamente insistir tanto nisso, ainda mais depois de eu recusá-lo tantas e tantas vezes. Mas o mundo de Ez parecia funcionar bem diferente do meu, pois tudo que ele disse, enquanto pegava seu casaco, era:

— Eu também tenho um gato, vamos juntos para a loja então. Também preciso de areia.

Eu tentei não ficar boquiaberta com o absurdo que aquilo soava, forçando-me a concordar com a cabeça e sair da sala sendo seguida por ele. Nos despedimos de outros funcionários remanescentes, Ez em voz alta e eu em um murmúrio, e chegamos ao carro dele. Eu sabia que não tinha como escapar dessa vez, então simplesmente sentei emburrada no banco de carona, sentindo aquele cheiro desagradável de cigarro começar a me enjoar.

— Você tem uma loja preferida?

— Gosto da Pet Stop, na esquina da Avenida Leonel. É perto e costuma ter artigos mais baratos — respondi, sabendo que o nível da loja provavelmente era baixo para alguém como Ez. Me perguntei se seu gato só comeria comidas chiques e caras, como tinha cara de ser. Ele não disse nada, ligando o carro e saindo dali.

Eu me perguntava por que diabos aquilo estava acontecendo comigo. Por que eu tinha que passar por aquilo? Se fossem só alguns convites ocasionais, eu ainda aturaria com mais paciência, mas não era só isso.

I - Quem Eu Quero EncontrarWhere stories live. Discover now