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Não sei quanto tempo fico sentada naquele sofá, digerindo o que acabei de escutar. Podem ter sido alguns minutos ou várias horas. Meus pensamentos não estão em ordem, mais um caos de gritos e palavras soltas do que ideias coerentes que eu consigo organizar. Sou esmagada por um sentimento crescente de desespero, que começa em uma espiral na minha cabeça e vai descendo como um tornado em direção ao meu peito, se espalhando pelas minhas veias, tomando conta de tudo.

Pego o celular. Encaro a tela desbloqueada, e abro a conversa com a minha mãe. Sua última mensagem de ontem continua lá, como se nada tivesse acontecido. Se eu perder minha mãe hoje, a última vez que falei com ela foi para dizer que senti saudades.

Procuro um contato para ligar, alguém que possa me ouvir. O plano é acordar Cinthia, mas, após dois toques, quem atende é Bruno.

— Alô? — ele diz, com uma voz sonolenta.

Fico muda. A voz trava na garganta, impossível de sair em meio ao desespero. Foi uma péssima ideia. Se eu abrir a boca agora, talvez comece a gritar e não pare nunca mais.

— Brina? O que aconteceu? — Bruno diz, então, e o jeito como me chama pelo apelido, como se tudo ainda fosse igual a antes, me quebra ao meio — Brina, você tá me ouvindo?

O choro, quando vem, não é bonito e silencioso como nos filmes. Ele sai de mim soluços altos que se misturam à falta de ar, em goles e mais goles de oxigênio que nunca chegam enquanto eu sofoco em lágrimas cada vez mais altas, ganindo como um cachorro ferido e segurando o celular grudado à orelha.

— Brina... amor... fala comigo...

A voz de Bruno, cada vez mais doce, me conduz mais e mais fundo no buraco que se abre dentro do meu peito. Não sei nem por onde começar a verbalizar tudo que estou sentindo, tudo que está acontecendo. Então só choro. Choro, e grito e tento fazer algum sentido de mim mesma.

Bruno não desiste, falando comigo em tom baixo e sussurros ininteligíveis, como se estivesse tentando tranquilizar uma criança, e não uma mulher adulta. Quando finalmente meu estoque de lágrimas começa a secar, o desespero é aos poucos substituído por algo igualmente obscuro, mas, de alguma forma, muito pior: uma letargia que se alastra pelo meu corpo, até que eu pare bruscamente de chorar e não sinta mais nada.

— Brina? Você tá aí ainda? — ele diz, quando passo um longo minuto em silêncio.

— Tô. — consigo dizer. Minha voz arranha na garganta seca.

— O que aconteceu?

Engulo em seco. O pranto beira meus olhos, mas não sai. Não sei se é ou não um bom sinal.

— Minha mãe foi entubada. — respondo, devagar, e falar em voz alta parece sedimentar que é real.

Entubada. Ela foi entubada. Nesse momento, dona Lisandra respira com ajuda de aparelhos. A qualquer momento agora, ela pode morrer.

— Puta merda. — ouço-o murmurar.

— É.

Um instante de silencio. Imagino Bruno pensando no que dizer, a expressão chocada, e, se meu peito não estivesse totalmente anestesiado agora, sei que esse seria o momento em que a falta dele bateria com força total. Mas não tem espaço para isso, então só seguro o celular e fico quieta, tentando entender o que acontece agora.

— Tem alguém aí com você? — ele pergunta, então.

— Não.

— Você quer que eu ligue pra alguém? Aquela sua amiga?

— A Cinthia? Eu ligo.

Ouço o som da respiração de Bruno do outro lado da linha e me pergunto se ele está fazendo o mesmo, prestando atenção em cada suspiro meu. Por fim, ele puxa o ar e diz:

De mala e cuiaOnde histórias criam vida. Descubra agora