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Pela primeira vez em semanas, ser a central de notícias não é desesperador. Hoje, quando ligo ou passo mensagem para as pessoas, é com boas novas!

Começo ligando pela pessoa que sempre me atende primeiro. O telefone chama só duas vezes antes de Cinthia responder:

— Alô?

A voz dela está ansiosa, e fico pensando se ela, assim como eu, também fica com receio de o telefone tocar e descobrir que minha mãe se foi. Mas hoje, não.

— Tenho boas notícias! — digo, de uma vez. Consigo ouvi-la soltar a respiração, aliviada, do outro lado da linha.

— Conta, conta!

— A oxigenação da mamãe melhorou! Estão estudando tirar ela dos respiradores!

Cinthia solta um grito contido, e consigo escutar uma criança falando coisas ininteligíveis perto dela. Então, ela começa a rir.

— Meu deus, que notícia maravilhosa! — exclama — Não é maravilhoso, filho? Meu deus, Sabrina, finalmente!

— Finalmente! — concordo, rindo feito boba com ela.

— E como que fica, ela vai sair da UTI? — Cinthia me pergunta, ecoando minhas próprias palavras de mais cedo.

— Ainda não, ela deve ficar em observação mais um tempo. Agora só temos que torcer!

— Agora só temos que esperar! — Cinthia me corrige — Ela já saiu dessa! Sua mãe é guerreira, daqui a pouco tá em casa aporrinhando vocês dois!

— Só eu, no momento. — digo, e mesmo sem querer, me sinto murchar um pouco — O Bruno voltou pra São Paulo hoje cedo. Saiu daqui tem algumas horas.

— Ué? Do nada?

Explico a situação para Cinthia, tentando ao mesmo tempo me lembrar de que não estou completamente sozinha e que isso não tem nada a ver com quando eu fui embora de São Paulo. É difícil estar em uma situação daquelas; sinto que meu coração e minha mente são incapazes de ver as coisas com clareza, misturando medos e ansiedades ao que é real.

— Bom, já, já ele está de volta! — Cinthia diz, por fim, me tranquilizando mesmo sem saber — Me avisa quando ele chegar que vejo de levar ele lá no laboratório, tá? Seguro morreu de velho.

— Pode deixar. Obrigada!

— Imagina! Quando isso tudo passar e a gente puder aglomerar de novo em segurança, vou aí visitar vocês!

— Será que passa? — pergunto, então, dando vazão ao que talvez seja a minha maior ansiedade de todas — Será que vai realmente acabar e a vida vai voltar ao que era antes?

— Olha... — Cinthia faz uma pausa, provavelmente para pensar em como responder. Solta um longo suspiro e só então continua — Às vezes eu acho que não, mas a real é que acho que não tem como voltar "ao que era", sabe? Vai ser diferente. Mas vai acabar. Sei que parece horrível agora, mas não é a primeira pandemia que esse planeta vive, sabe? Todas as outras passaram. Essa vai passar também.

— É horrível estar em um momento histórico. — desabafo, e Cinthia ri.

— Nem me fala. Espero que esse seja o último!

Eu sinceramente duvido, mas não argumento. Me despeço de Cinthia e deixo-a seguir com o seu dia.

~*~

Pela primeira vez no que me parece uma vida inteira, naquela tarde eu consigo sentar para trabalhar.

Minhas redes estão absolutamente abandonadas. Mesmo assim, ganhei um ou outro assinante novo, e sorrio ao ver que não apenas tenho dinheiro para receber, como que meus seguidores mais fiéis deixaram curtidas, comentários e mensagens para mim. Não consigo produzir nada, mas consigo responder um a um, e pesco algumas selfies nunca postadas para mandar como mimo para os mais queridos. Já é mais do que tenho feito em muito tempo.

De mala e cuiaOnde histórias criam vida. Descubra agora