— Você está erguendo a cabeça demais quando sobe pra respirar, filho — disse o treinador, lendo as anotações dele. — Isso te faz perder preciosos segundos. E lembra de expirar pelo nariz o tempo todo. Não use a boca. Eu vi você fazendo isso algumas vezes.
— Certo, treinador — disse, saindo da piscina. O nadador tirou a água do rosto e assentiu.
Enquanto Nelson caminhava até o bloco de partida, o treinador virou para Cris. O assistente, sentado na beirada com as pernas dentro d'água, assentiu logo e agarrou o cronômetro em volta do pescoço. Com o aparelho em uma mão e o tablet na outra, ele estava pronto para marcar o tempo de todas as voltas.
— Prepara... Vai! — A voz do treinador ecoou pela piscina interna aquecida.
Nelson pulou para frente no momento em que o treinador gritou. Ele sentiu o corpo bater contra a superfície da água e já balançava os braços e pernas, se impulsionando para o outro lado. O nadador perdeu a conta de quantas vezes fizera aquilo naquele dia.
Quando estava alcançando o outro lado, ele preparou-se para dar um giro, inclinando seus joelhos. Com o impulso das pernas, conseguiu ganhar mais velocidade na volta.
Ah, então era disso que o treinador tava falando, percebeu Nelson quando se pegou pronto para respirar. Sempre que erguia a cabeça acima da água, havia um pequeno atraso quando ele voltava porque usava a boca para respirar. É quase um piscar de olhos, mas por causa do arrasto quando respiro, fico um pouco pra trás. Só que se eu tentar isso...
Nelson se forçou a respirar pelo nariz. Não sei se isso vai fazer qualquer diferença... preciso perguntar se fez alguma de tempo pro Cris.
— Ok. Isso é tudo por hoje — anunciou o treinador quando as mãos de Nelson tocaram na parede. — Preciso ir agora. Tenho que encontrar com os sogros e já tô atrasado. Pelo jeito, a gente precisa preparar um quarto pro bebê agora ou não vamos ter mais tempo. Foi mal, não posso ficar e falar dos tempos, mas fiz anotações no que você pode melhorar. Pergunte pro Cris.
O celular do treinador tocou, ele atendeu e logo se foi.
— Bom trabalho — disse Cris, entregando uma toalha para Nelson.
O nadador hesitou em aceitar, olhando para a água enquanto mordia os lábios.
Cris ficou na ponta dos pés, pôs a toalha na cabeça de Nelson e forçou o atleta a olhar para ele.
— Não vou deixar que volte para a água hoje — ele disse, balançando a cabeça enquanto encarava nos olhos de Nelson. — O treinador falou, especificamente, pra não deixá-lo treinar mais hoje. Vai ficar exausto pra amanhã se fizer treinar mais hoje.
— Amanhã... — Nelson pegou a toalha e secou o cabelo, levando seu tempo no rosto para evitar olhar nos olhos de Cris. — O dia finalmente chegou.
— Na verdade, não. É só uma competição municipal, não é "o dia" nem nada parecido — disse Cris com um tom casual, dando de ombros. — Pela lista dos participantes, não tem ninguém que possa ganhar de você.
— É o que todo atleta gosta de ouvir. Vai vencer porque a competição é fraca. — Nelson soltou uma risada seca.
— Essa é, literalmente, a primeira vez que escuto alguém reclamar de ter uma vitória fácil — disse Cris, sorrindo e rolando os olhos de um jeito exagerado. Então ele suspirou e balançou a cabeça. — Nunca vou entender vocês atletas. Vencer já está de bom tamanho pra mim. E uma vitória fácil, então? Melhor ainda. Mas acho que um mero assistente não vai compreender a mente complexa de um nadador profissional.
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O nadador e o assistente
RandomO clube Prado Maranhão de desportos aquáticos, um lugar onde aqueles que miram o topo dos esportes aquáticos se juntam. Nelson, chamado no passado de garoto prodígio da natação brasileira, está perto de se recuperar de um acidente sério que quase ti...