Capítulo Cinco - Parte 3

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Encaro os prédios do outro lado da estrada, sentindo o vento do wyvern levantando voo nas minhas costas. Eu odeio que Maira esteja certa e que seja melhor eu não estar no castelo agora. Quero ajudar, mas... Não tenho certeza de que eu seria uma ajuda, agora.

Fecho as mãos, sentindo o tecido das luvas que Nai me passou. Não posso correr o risco de fazer alguma coisa assim de novo. E a pior parte não foi nem a explosão de poder. Foi o que eu pensei. A forma como nada além do poder parecia importar. Nada e ninguém. Eu só queria mais daquilo e mostrar o que podia fazer, sem me preocupar com nenhuma consequência e muito menos com os motivos para eu estar ali.

Nós temos espiões em Raivenera. Isso é sem a menor margem de dúvida. Eles são grandes demais para não terem plantado pessoal aqui. Se eu levar em conta o tempo que faz que Raivenera é um alvo, é óbvio que têm espiões. Então, mesmo que ninguém dos soldados e cavaleiros que escaparam tenha visto que fui eu quem fez aquilo, Zeli-Amare vai saber. E, se antes eu era um alvo secundário, alguém que era bom tirar do caminho mas sem tanta importância assim, isso vai mudar.

Ou seja, ficar em Raivenera agora seria concentrar todos os alvos prioritários em um lugar só, sendo que as defesas ainda não estão todas de pé de novo. Merda.

Nai solta o ar com força e me puxa, atravessando a estrada. Balanço a cabeça e vou atrás dela. Prioridades.

Ninguém presta atenção em nós quando começamos a andar depressa na direção do prédio de Nai. As ruas continuam cheias, com o mesmo movimento de sempre, como se nada de diferente tivesse acontecido. Nem parece que eu estava ouvindo gritos às quatro da manhã.

Ou não. Tem duas mulheres conversando em um dos becos entre megaprédios e vejo quando uma delas passa uma faca pequena para a outra. E mais para a frente, um grupo pequeno de pessoas juntas, conversando em voz baixa e olhando para os lados como se esperassem ser atacados a qualquer momento. E comentários sobre o toque de recolher. Isso sem mencionar as pessoas olhando para cima o tempo todo.

— Você está certa — Nai fala.

Balanço a cabeça, sem olhar para ela.

— O quê?

— Sobre espalhar a história toda.

O que falei com Augusto sobre contar exatamente o que está contando para os bairros altos. Com toda a confusão depois eu nem pensei em insistir nisso.

Nai não fala mais nada enquanto continuamos andando. O carro de Natasha ainda está parado na divisa entre a cidade central e os bairros altos, mas nenhuma de nós dirige, então não adianta de nada. Não que isso fosse ser uma diferença muito grande agora. A essa hora, é bem possível que seja mais rápido chegar no apartamento de Nai à pé do que de carro. E assim pelo menos conseguimos ter uma boa ideia da situação nas ruas.

— Você acha que consegue mesmo fazer um antídoto? — Pergunto.

Nai olha para mim e estreita os olhos. Levanto as mãos e acelero o passo. Certo, não devia ter perguntado. Mesmo que ela tenha passado esses meses todos aparentemente sem conseguir nenhum resultado.

— Eu testei possíveis anomalias no poder — Nai começa. — Existem formas de envenenar o poder e fazer ele se virar contra um draconem.

Eu acho que preferia não saber sobre isso.

— E a reação batia exatamente com isso — ela continua. — Testei todas as formas possíveis e catalogadas sobre isso e você não faz nem ideia do tipo de coisas que eu descobri enquanto estava pesquisando mais sobre a relação com o poder. Mas não existe excesso de poder para nós, então nem pensei que pudesse acontecer uma coisa dessas com vocês.

Nós. Vocês. Eu sei que não foi essa a intenção de Nai, ela só está evitando falar alguma coisa que chame atenção, mas mesmo assim... É uma linha clara.

— Você não tinha nem testado nada assim — falo.

Nai balança a cabeça depressa e me puxa assim que um dos carros na rua para.

— Não. Testei depois que você falou aquilo e funcionou. As amostras reagiram do mesmo jeito e... Se eu não tivesse sido jogado para fora da cama e arrastada para o castelo já teria um antídoto agora.

Ou seja, algumas horas.

É o suficiente. Tem que ser. Se Maira reunir todos os draconem infectados em um salão ou qualquer coisa assim, Natasha consegue manter o bloqueio o dia todo, sem problemas. Já vi ela fazer isso antes. E Zeli-Amare não tem como saber que já necromantes estudando a tal praga desde a morte da Domina. Eles provavelmente estão esperando Raivenera entrar em pânico e temos algum tempo até perceberem que isso não vai acontecer. O que vai vir depois disso é que me preocupa. E me preocupa demais.

Marcas de Sangue (Draconem 3) - DEGUSTAÇÃOOnde as histórias ganham vida. Descobre agora