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O café da manhã estava surpreendentemente bom

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O café da manhã estava surpreendentemente bom. Os remédios me acalmaram e não tive muita vontade de dar um tapinha.

Estava pronto para o início do dia.

Primeiro, a meditação.

Não era a individual que muitos acreditam, era com um cara. Doutor André.

Ele era bonito, completamente íntegro, polido. Usava óculos de armação quadrada e tinha cabelos curtos e grisalhos, era alto, mas passava a maior parte do tempo sentado na escrivaninha de madeira.

— Como tem andado, sr. Barbosa?

A piada sem graça saía de meus lábios antes que eu pudesse controlá-la.

— Com as pernas.

Dr. André riu soltando o ar pelas narinas.

— Vejo que está melhor — comentou e anotou algo na prancheta. — O que está achando da Casa?

Ah, a Casa. Era linda, definitivamente maravilhosa.

Era boa como tudo o que Regina tinha, mas era para mim.

Era amável como todo o amor que Regina recebia do pai e da mãe. Mas era para mim.

Eu amava estar ali, mesmo com todas dificuldades. Me sentia desconectado de tudo.

Crescendo em um ambiente hostil, não demorei muito para entender minha posição dentro da família.

— João, vá buscar gordura de porco, seu pai teve... um imprevisto!

Eu sabia que não era um imprevisto.

— João, busque um pouco de água na mina do seu Antônio, seu pai não vai conseguir chegar a tempo!

Ele provavelmente estaria no beco 13.

— Levanta, garoto! Temos que ajudar o Quéqué a bater a laje do Zéque e ganhar o dinheiro da nossa carne.

Nós tínhamos um frango inteiro no congelador.

Eu sabia que dentro daquele barracão que costumava chamar de casa eu nunca seria feliz, realizado ou amado.

Na escola, porém, era diferente.

Eu era João Barbosa, o melhor jogador de futebol da turma, o melhor em matemática e, claro, um dos mais bonitos da escola.

E tudo isso aos seis anos de idade.

Tinha amigos, uma namoradinha e medalhas pintadas de ouro que eu escondia de meu pai, achando que realmente eram revestidas do metal precioso.

A Casa era como a escola, só que melhor. Dentro dela eu não era nada, eu era só mais um drogado que eles cuidavam.

Sim, eu amava a Casa.

Encarei Dr. André satisfeito com meu discurso. Sorri singelamente.

Ele, porém, anotava algo em sua prancheta e não parecia tão feliz quanto eu. Não. Ele não tinha me ouvido.

Porra, eu não tinha falado!

Tinha feito a burrada de desassociar na frente do meu psiquiatra. 

Espelho, Espelho MeuWhere stories live. Discover now