NONO

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Seu coração batia com força, tornando o espartilho ainda mais apertado e como se sentisse seu desconforto, as mãos dele, fortes e precisas, desataram os nós que o mantinham firmes em seu corpo, assim como fizera com os grampos em seu cabelo e como estava prestes a fazer com as anáguas. Ela estava desnuda à sua frente, à mercê dele, como o corsário sempre desejara.

Se a vida era um grande livro, eu esperava que o leitor que um dia chegasse a ler minha vida sentisse, através das palavras do autor que a escrevia, o que eu sentia naquele momento. Esperava que ele sentisse o coração aos pulos e as mãos molhadas de suor e chuva. Desejava que ele sentisse a pele arrepiada pelo frio, a pele úmida com as peças de roupa colando contra ela, mas por dentro tão quente que se sentia febril. Apesar de tremer levemente, as bochechas denotando o calor que havia por dentro. Esperava que sentissem, cada um daqueles leitores, a pressão suave na cabeça enevoada pelo desejo, onde tudo parecia certo e errado ao mesmo tempo, porém incrível demais para cessar. Os lábios sensíveis, o corpo desejoso, a alma pronta para deixar-se invadir.

Eu jamais havia sentido tantas coisas ao mesmo tempo e algo me dizia que ainda havia mais para sentir. Tantas coisas desconhecidas que se descortinavam na frente dos meus olhos de uma só vez, julgando que eu estivesse pronta para vivenciá-las. Eu havia esperado tanto tempo, acreditando que aquilo era superficial demais, que era dispensável para os tipos de amor que eu imaginava e agora me questionava como eu passara tanto tempo sem sentir aquelas emoções.

Os lábios de Theodore deixaram os meus e sua mão prosseguiu segurando a minha enquanto me puxava, atravessando a areia, em direção a uma construção que eu já havia notado, perto do carro. Com todo o seu desleixo, as paredes mal cuidadas e a entrada caindo aos pedaços, eu não lhe dirigira um segundo olhar quando chegamos, mas agora, conduzida por Theodore, eu tinha plena certeza de que estávamos a caminho daquele casebre desmazelado e finalmente o visualizava por inteiro e não como apenas um ponto dentro de uma paisagem.

Nenhuma palavra foi dita por nenhum de nós enquanto andávamos apressados. Nada foi sussurrado enquanto ele retirava um chave enferrujada de seu bolso e abria o local, fazendo com que minha curiosidade se somasse aos milhares sentimentos que me inundavam. Eu deveria me questionar o que eu estava fazendo ali. Deveria parar tudo enquanto nada estava perdido. Porém me vi entrando através da porta que Theodore havia aberto, sendo imediatamente seguida por ele que fechou a porta atrás de nós.

Sua testa apoiou-se na porta e eu fiquei ali, parada, observando as asas em suas costas, nervosa. Eu deveria estar observando o local, verificando como as ações do vento e do tempo haviam destruído o espaço, porém suas asas exerciam a magia novamente. Eu que acreditava que o maior poder vinha das palavras, me via subjugada ao poder de linhas negras que formavam um desenho que não possuía qualquer razão lógica verbalizada para estar tatuada naquela pele.

Fora uma sequência de erros. Como uma dança elaborada onde o movimento de um dos bailarinos levava o outro a executar um movimento ainda mais arriscado até se verem em uma valsa da qual não poderiam escapar. E ali estava eu, escrevendo meu próprio nome em meu cartão de baile, dando o primeiro passo, cometendo o primeiro erro ao aproximar-me o bastante para estender meus dedos para as suas asas.

A sua pele era suave e estava úmida, fazendo com que meus dedos escorregassem ainda mais. Meu toque era delicado e incerto, trêmulo, ciente de que não deveria estar sendo executado. A respiração de Theodore se prendeu por alguns instantes e logo ele suspirou, ainda imóvel, a cabeça contra a porta de madeira já gasta, as mãos apoiadas no mesmo lugar, deixando os músculos de suas costas flexionados. Meus dedos moviam-se por conta própria, tocando até seus bíceps, onde as asas terminavam e voltando, sem saber o que fazer em seguida e esperando que aquele momento não terminasse. Eu não saberia como reagir se fosse questionada sobre os motivos que me levaram a tocá-lo. Como explicar que havia uma força que me puxava em direção a ele? Como poderia descrever que a sensação de magia tornou-se ainda mais real, afinal eu pude sentir um leve choque, uma coisa boa que pareceu acender todas as terminações nervosas de meu corpo, me tornando ciente de tudo ao meu redor, especialmente sobre como meus arrepios pareciam mais relacionados a prazer do que frio. Como minha pele estava em brasa e necessitada de toque.

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