PERPENDICULARES

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Não utilize o berço se alguma parte estiver quebrada, rasgada ou faltando. utilizar todas as peças presentes na caixa Certifique-se que todas as conexões de montagem estão apertadas e que as peças A, C e D estão perpendiculares.


- Você sabe ao menos o que significa perpendiculares, Theo?

- Ah, e por acaso você sabe? - gritou o de cabelos compridos para o irmão gêmeo que segurava uma das peças de montagem do berço sem muita vontade de realmente ajudar. Na verdade, o que Nate fazia era apenas brincar do passamento preferido de todo irmão: importunar o outro.

- Não sei, mas com certeza o meu namorado sabe.

Os olhos verdes de Theo estavam faiscantes quando ergueu-os para seu irmão, vendo-o se abanar com o manual de instruções para a montagem do berço, como se não houvesse dito nada demais.

- Você quer fazer uma competição sobre qual companheiro sabe mais? Porque se estiver interessado, terei o maior prazer em ver minha mulher dando um verdadeiro couro no seu namoradinho.

Nate riu alto e deixou que o irmão continuasse, em paz, a montagem um tanto atrapalhada do berço de seu primeiro filho. Por mais que estivesse provocando-o, não podia evitar passar longos períodos o observando cheio de orgulho, contente com a forma como Theodore havia amadurecido e se tornado um bom homem nos últimos anos.

Ainda tinha seus momentos complicados. Aqueles em que ele aparecia no apartamento no fundo do Cherry, com uma mochila de roupas, o cabelo revolto e uma expressão muito desgostosa, dizendo que não queria falar com ninguém, dormindo no sofá, para acordar cheio de dores nas costas e arrependimentos no dia seguinte. Evidentemente, ele e Jessica brigavam com uma frequência de assustar, mas eram tão devotados um ao outro que faziam com que essas brigas fossem mais uma comédia do que algo realmente a ser levado a sério.

Eles se amavam num nível que quase fazia Nate ter inveja. Quase. Como se fosse um livro bom, com uma daquelas histórias bonitas onde todos os personagens tinham finais felizes emocionantes, o seu destino finalmente havia trago a pessoa que ele sempre precisara. Na verdade, poderíamos dizer que o destino havia feito tal pessoa regressar. Depois de anos, Nate estava de novo nos braços de Peter. Da maneira certa dessa vez. Sem cédulas passando de uma mão para outra, sem segredos para a sociedade, sem lágrimas de arrependimento ou saudades quando tinham de se deixar. Dessa vez, os dois faziam do jeito certo. Pete havia admitido à sua família a sua verdadeira sexualidade e ainda que os nobres Mason não estivessem tão felizes com a escolha sexual do filho, Pete estava muito feliz ao lado de Nate, que finalmente havia deixado o seu sistema de acompanhante e estava fazendo companhia a apenas uma pessoa, a mais importante, em troca de algo mais valioso que dinheiro.

Ainda que nos últimos dias, ele e seu namorado estivessem passando mais tempo na casa de seu irmão e Jessica do que no apartamento nos fundos do Cherry. Porém, os dois tinham um bom motivo para estarem sempre ali. Paparicar e cuidar de todas as vontades da nova mamãe era imprescindível.

- Isso pra mim é transversal, Theo. Não perpendicular.

Theo ergueu os olhos de seu trabalho, mais uma vez, porém agora, ao invés de parecer irritado, como fazia com o irmão quando este o interrompia, seu olhar estava doce e havia, inclusive, com um sorriso em seus lábios.

- Mas não é a mesma coisa, Jess?

A cunhada de Nate riu e se aproximou do marido, segurando as peças que deveriam ser perpendiculares em suas mãos e as encaixando da maneira correta, sob o olhar atento de seu esposo para que ela não fizesse nada que a forçasse demais. Na verdade, se Theo já era superpreotetor apenas normalmente, saber que Jessica estava esperando uma filhinha dele havia tornado o homem ainda pior. Suas asas se abriram ao máximo e ele parecia se antecipar a cada desejo de Jess, qualquer um deles.

Ela não reclamava, sabendo que Theo era daquela maneira e ir contra ele apenas faria tudo pior, porém, em alguns momentos, ela tinha de tomar as rédeas da situação antes que ele ficasse paranóico demais, como acontecia com a montagem daquele berço. Ele queria que todos os mínimos detalhes estivessem em ordem para o nascimento da sua filha, ainda que faltassem mais de cinco semanas para isso.

Para o azar de Jessica, ele não era o único a super protegendo. Pete parecia surgir de trás dos móveis, pronto para impedi-la de fazer qualquer coisa, com medo de que ela se machucasse ou algo indizível acontecesse. Em alguns momentos, ela perdia o controle, gritava com todos eles e se trancava em seu jardim de inverno, o bule de chá fervente e algumas folhas de chá frescas eram tudo o que ela precisava para se acalmar.

Quando ela finalmente saia de seu exílio autoimposto, Theo estava apoiado no portal do jardim, com a expressão mais arrependida que podia e a puxava para um abraço quente, daqueles que faziam com que seus braços dessem a volta pelo seu corpo e que davam a ela a sensação de que não eram apenas seus braços e mãos que a seguravam, mas também suas asas a acalentavam. E nesse momento, abraçada à Theo, tudo estava perdoado. Ela sabia o quanto era importante para aquele homem, porque ele tinha a mesma importância para ela, quiçá mais ainda.

- Perpendiculares. - repetiu Nate e Pete aproximou-se, abraçando-o por trás e deixando que o namorado encostasse a cabeça em seu ombro, de uma maneira que eles sempre pareciam se encaixar. Sua boca inclinou-se sussurrando no ouvido do mais baixo o que a palavra significava e Nate procurou esconder, de todas as formas possíveis, o quanto o misto da inteligência de Pete, somada à sua voz rouca no pé de seu ouvido fazia com que ele ficasse excitado demais, ainda que não fossem o local ou momento adequados.

- O que seria de nós, garotos Newman, sem a inteligência de vocês. - gracejou Theo enquanto beijava a testa da esposa, suas duas mãos pousadas na barriga bem saliente, de uma forma que era natural e íntima para os dois. Theo havia, recentemente, descoberto que poderia amar duas mulheres ao mesmo tempo. Não de forma carnal, não, isso ele já havia feito antes, tinha sido bem legal, até, mas não se aproximava, nem de longe, com a emoção que ele sentia todas as noites, quando Jessica se aninhava a ele, seu corpo completamente colado ao dele, na famosa posição de conchinha, deixando que ele a abraçasse por inteiro e repousasse suas mãos em sua grande barriga, sentindo, ocasionalmente, a sua bebê chutar, como se soubesse exatamente que seu pai estava ali e quisesse cumprimentá-lo, dizer-lhe que estava ali também, fazê-lo senti-la, uma vez que ela o sentia.

- Eu que me pergunto o que seria de mim sem vocês.

- Grávida é que você não estaria. - brincou Pete e Jessica fez o favor de atirar o manual de instruções em sua direção, sendo puxada novamente para perto do marido que não queria que ela se exaltasse, nem de brincadeira. Ele alisou o seu pulso, onde estava uma tatuagem de asas, como a que ele tinha em suas costas, mas em uma dimensão bem menor, feminina, que combinava perfeitamente com Jessica.

- Obrigado, Jess.

- Eu não fiz nada, perpendicular é uma palavra difícil mesmo. - riu.

- Não por isso. Por tudo. - ele fez com que ela olhasse para o outro lado, onde Pete e Nate estavam conversando em voz baixa, as cabeças próximas demais, os olhos brilhantes incapazes de disfarçar a quantidade de amor que carregavam dentro de si. - Obrigado por me fazer ver a vida da maneira mais bonita. - ele acariciou a tatuagem novamente. - Por me salvar e me proteger, mesmo quando eu achava que não precisava de proteção, que não precisava ser salvo. Obrigado por me dar uma família grande, bagunçada e tão cheia de amor.

Ela viu que os olhos dele estavam um tanto marejados e limpou-os depressa, sorrindo radiante, deixando suas mãos caírem até segurarem seu rosto e assim poderem beijar seus lábios de uma maneira doce e cheia de uma entrega que era mais profunda do que as palavras pudessem descrever, ainda que quisessem.

Ambos sabiam dentro de si que estava tudo mais colorido e certo do que era possível. Sabiam que era amor.

E isso era tudo o que importava.



WingsWhere stories live. Discover now