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Novembro, 9

Ergui minhas pálpebras e encontrei pares de olhos amarelos, curiosos e ingênuos.

— Madame Mermaid sumiu! — Bardolf exclamou com a voz fanha.

O pequeno estava inquieto. Sentado sobre as pernas — e sobre mim —, o caçula Bewforest balançava o colchão sem parar. A cama já nem era das melhores para ser chacoalhada daquele jeito. Uni as sobrancelhas e tentei captar o sentido da sua frase, ainda sob sono profundo.

— O quê?

— Madame Mermaid!

— Quem?

— Minha boneca, Maddie. — Bardolf choramingou.

Ainda sem compreender totalmente, arrastei-me debaixo do seu corpo pequeno, porém pesado, e endireitei a coluna para encostar na cabeceira da cama. Estava sendo difícil manter meus olhos abertos, mas eu estava me esforçando, claro. Bardolf obedecia as leis irrefutáveis de dormir até mais tarde nas férias, então, para me acordar daquele jeito, algo sério estava acontecendo.

— Qual foi a última vez que você a viu? — disse. Era a primeira pergunta que fazíamos quando alguém perdia algo.

— Deixa eu pensar. — Ele fechou os olhos com força e raspou as mãos pelo rosto, tentando manter a calma.

Bardolf era pequeno para sua idade, mas muito esperto. Às vezes me surpreendia com o que ele falava, porque parecia que estávamos dialogando com outra pessoa, uma mais velha. Seus cabelos estavam ridiculamente ajeitados, mas eu sabia que ele nem havia passado uma escova em seus fios castanho-avermelhados.

— Encontrou algo na sua cabeça? — sussurrei, porque não queria atrapalhá-lo.

Ele choramingou mais. Abriu os olhos e agarrou-me pelo pescoço, aflito de verdade.

— Eu não sei, eu não sei, eu não sei!

— Ok... Posso te ajudar a procurar. Certeza que está em algum lugar da fazenda — murmurei, segurando-o. Eu nunca tinha visto a tal Madame Mermaid, mas esperava que fosse uma sereia. — Você não pode esperar um pouquinho até eu acordar pra valer?

— Não!

— Tá, tá... Ok, eu ajudo — falei, por fim.

Havia sido uma luta para me levantar da cama com meu irmãozinho preso em mim. Coloquei-o no chão na primeira oportunidade e tentei acordar com água gelada no rosto. Nem estava preocupada com o desaparecimento da boneca, mas me importava o suficiente para ajudá-lo naquela luta. Sem contar que, após Genevieve topar em me ajudar com algo mais perverso e profundo, eu não tinha mais o que fazer em Lockton senão buscar por brinquedos perdidos.

Eu e Bardolf passamos a manhã inteira atrás da Madame Mermaid, mas a bonitinha não aparecera de jeito nenhum. Liza e Hugh, também notando nossa compenetração na tarefa, juntaram-se à ajuda. E nada da boneca surgir. Bardolf estava ficando sem esperanças, mas prometi que voltaríamos depois do almoço.

Assim foi, mas nada veio. Madame Mermaid estava desaparecida e eu, ansiosa e sentindo-me desafiada, estava quase ligando para a polícia e dando parte de um roubo.

— Nós precisamos achar!

— É só um brinquedo estúpido, Bardolf — Liza, sem mais paciência, falou. Ela nunca tinha um filtro decente. — Compra outra.

— Não! Aquela é especial. Você não entende, Liza? Ninguém entende — Bardolf resmungou alto, louco para voltar para o quintal e retomar a procura.

Carmesim | LésbicoWhere stories live. Discover now