A próxima estação

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Vinicius era um jovem muito inteligente, era quieto e na maioria das vezes triste, embora fosse um rapaz bonito, ele se sentia feio e dava muita importância para a opinião dos outros, que na maioria das vezes tiravam um barato da cara dele mais pela sua reação, pois ficava extremamente zangado com a situação, corava e em algumas situações passava dias sem pronunciar uma só palavra.

Com as férias de inverno chegando e com suas boas notas, sabia que não ficaria de DP e mesmo com seus pais lhe oferecendo uma viagem, ele preferiu ficar em casa e maratonar suas séries preferidas, isolando-se do mundo e se livrando por um tempo do bullying da faculdade.

Após duas semanas praticamente sem sair do quarto, Vinicius começou a sentir uma profunda satisfação e proteção, tinha encontrado um lugar livre de piadinhas e livre de pessoas má intencionadas, naquele quarto ele era o dono e ninguém poderia perturbá-lo. O tempo passou e ele não conseguiu voltar para as aulas, sair daquele lugar seguro e confortável não fazia parte dos planos do jovem naquele momento. O tempo, que não tira férias, passou e logo seus pais, preocupados com a saúde do filho, tentaram dialogar e convencê-lo a voltar às aulas, todavia sem muito sucesso, Vinícius realmente não sairia mais de seu quarto.

Na manhã seguinte, seu pai extremamente esclarecido fora até a universidade investigar o motivo que precedeu o distanciamento do seu filho que sempre tivera boas notas e bom desempenho escolar. Conversando com um de seus professores chegou aos amigos mais próximos que na verdade não eram muitos e sim, apenas uma garota que por se sentar na frente dele, acabavam fazendo os trabalhos em dupla e assim conversava um pouco mais e poderia dizer algo útil sobre a situação do garoto.

- Prazer, meu nome é Rodrigo, sou o pai do Vinicius, podemos conversar por um instante?

- Sim, sou a Vanessa, aconteceu alguma coisa com ele? Ele não voltou mais...

- Eu e a mãe dele desconfiamos que ele está com depressão, ele está fugindo das aulas, raramente levanta da cama e anda bem tristinho nesses últimos dias e vim saber o motivo para conversar com o psicólogo antes da primeira sessão dele. Respondeu o pai.

- O Vini é muito inteligente, mas ele é muito introvertido, não sei se o senhor já reparou, mas quando ele se solta ele "desmunheca" e os meninos tiram sarro, por isso ele se fecha todo.

O pai nunca tinha reparado, pois o garoto, na frente dele depois da adolescência nunca mais havia se soltado e ele pensava que todo aquele comportamento era devido a sua idade.

- Hummm... Ele pode estar com dificuldades para 'sair do armário', concluiu o pai instintivamente.

- Vou tentar conversar com ele, mas sem dizer nada sobre nossa conversa. Respondeu a garota ao se despedir de Rodrigo.

O pai do garoto agradeceu e após conversar com sua esposa, marcaram uma consulta no psicólogo e explicaram o que estava acontecendo. Naquela mesma noite, durante o jantar, Vinicius fora informado sobre a consulta que haveria no dia seguinte.

Na manhã seguinte, sua mãe o deixou no consultório e foi para o trabalho, enquanto aguardava sua hora na recepção olhou em volta e observou a decoração do ambiente, quando saiu da sala uma garota toda vestida de preto e maquiagem pesada que provavelmente também estava ali obrigada por seus pais. Logo ele foi chamado.

O psicólogo, Doutor Mário se apresentou e durante sessenta minutos eles conversaram sobre os gostos do garoto, o que o motivava, suas preferencias e diversos outros assuntos, ao final do período se despediram e o doutor Mário pediu para que ele voltasse na próxima semana, já na segunda–feira para que pudessem papear mais. Drº Mário era jovem e extremamente simpático, tinha tatuagens no braço, era bem exótico e parecia um japonês, mas era brasileiro mesmo. Por não ter questionado nada sobre a faculdade, Vinicius não hesitou em voltar na segunda-feira e se sentiu muito bem em poder conversar com alguém sobre seu dia-a-dia.

Na segunda-feira ao entrar no consultório, a primeira coisa que Doutor Mário perguntou foi sobre a série que os dois estavam maratonando , logo após perguntou como foi o final de semana do garoto e depois completou dizendo como fora o dele.

- Eu também atualizei minha série no sábado e de noite fui ao aniversário de casamento de dois amigos meus que namoram desde a época da faculdade, o Leandro e o Fábio. Disse Doutor Mário.

Vinicius ficou meio sem reação após ouvir, mas automaticamente sabia que poderia se abrir com ele que não haveria preconceitos e nem julgamentos.

Doutor Mário emendou perguntando sobre o motivo do qual ele não estava indo mais as aulas.

- Pensa em mudar de curso? Escolher outra carreira?

- Não, eu gosto de jornalismo. Quero me formar logo. Respondeu Vinicius.

- Mas para isso você necessita ir às aulas, sabemos que você é bastante inteligente, por que não me diz o motivo?

- É complicado... Os meninos me zoam quando eu me solto demais, eu sei que "desmunheco", dá pra ver na cara que sou gay.

- E o que tem de errado nisso? Perguntou Doutor Mário.

- Não sei, no fundo não tem nada de mais... Mas fico ofendido e prefiro segurar...

Doutor Mário com sua sabedoria natural explicou ao Jovem que ao se segurar e se preocupar com que os outros iriam dizer, não aceitando quem realmente ele é, ele estava se prejudicando, se limitando e preocupando seus pais, que no momento, eram as únicas pessoas que se importavam e as quais ele deveria realmente se preocupar.

- Eu tenho muitos amigos gays, alguns são mais discretos, outros são mais extrovertidos, mas todos conquistaram o equilíbrio após se aceitarem e se amarem completamente, alguns tiveram desafios, lidaram com preconceitos, outros não, mas todos que decidiram se amar e se aceitar como eram se libertaram e hoje são felizes e alegres. Procure refletir sobre isso e converse mais com seus pais, eles me pareceram bastante modernos em relação ao assunto e acho que gostariam acima de tudo que você fosse feliz, afinal você é um garoto ótimo, porém vá ao seu tempo, na hora que sentir internamente que é o momento certo de tomar as atitudes necessárias, se posicionar e expressar suas opiniões, pensamentos e sentimentos, faça.

Vinicius refletiu o dia todo sobre o assunto. Aquelas palavras do Doutor Mário ecoaram na mente dele, eram coerentes e faziam sentido. No jantar ao ser questionado sobre a sessão, Vinicius respondeu que estava gostando muito, que estava pensando em voltar às aulas e perguntou aos pais se eles tinham algum amigo gay. O pai de Vinicius disse que o melhor amigo dele no trabalho era gay e casado com um rapaz há cinco anos, a mãe disse que só o cabelereiro dela era gay e ela só cortava o cabelo com ele já tinha uns dez anos.

- Filho se você for Gay, nós aceitamos naturalmente, só não queremos ver você triste e trancado no quarto, estamos em 2018, isso não é mais um tabu pra gente. Disse o Pai do garoto enquanto sua mãe confirmava balançando a cabeça positivamente.

Na manhã seguinte Vinicius levantou cedo, tomou seu banho, arrumou suas coisas e foi para aula, ao entrar no metro, sentou-se, fechou os olhos e deixou para trás aquele antigo e preocupado garoto e levantou- se para descer na sua estação.

Contos Gays UrbanosWhere stories live. Discover now