Na Estrada

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Ele acordou no meio da noite e preparou-se em silêncio.

Sua mãe lhe entregara uma sacola de couro com algumas roupas. Ele a abriu, examinou o conteúdo e vestiu as peças mais simples que encontrou: uma camisa comprida de linho branco, a túnica de couro azul marinho e uma calça de montaria. Roupas que ele costumava usar quando saía para às caçadas.

Estivera estudando o livro de Galeno, o antigo médico grego. Ele estava na mesa ao lado da cabeceira da cama e Robert o guardou na sacola, sentindo uma pontada de culpa. Padre Ralph ficaria louco de raiva quando percebesse que levara o livro. Por sorte, estarei bem longe quando ele descobrir...

 Colocou o arco que Jack lhe dera e a aljava com as flechas pendurados nos ombros, trespassou a sacola pelo peito e saiu do quarto, segurando as botas nas mãos. Não queria acordar os monges, pois tinha certeza de que tentariam impedi-lo.

O pátio do mosteiro estava vazio e escuro e as estrelas ainda brilhavam no céu.  Calçou as botas quando chegou próximo ao portão e o abriu com cuidado, mas apesar disso as linguetas de ferro soltaram um rangido estridente como se quisessem alertar sobre sua fuga.

— Maldição! — ele praguejou com um sussurro e esgueirou-se rapidamente para fora.

A madrugada estava fria e gotas de orvalho brilhavam na vegetação ao redor. Uma tênue claridade no horizonte prenunciava o nascer do sol. Ele andou rápido, procurando distanciar-se antes que todos acordassem.

Respirou fundo o ar gelado da manhã. Não tinha ideia do que faria, apenas de que precisava se afastar e ser livre pela primeira vez em sua vida. Isso com certeza iria curar a dor que sentia em sua alma. Para onde iria? Talvez Londres... Ou quem sabe mais longe ainda, até a França... Não importa! O importante é que poderei fazer o que quiser e que irei esquecer Marion e seu maldito casamento!

Tinha acabado de virar a curva da estrada que penetrava na floresta em direção ao sul quando ouviu um grito chamando seu nome.

Virou-se. Jack corria atrás dele.

— O que foi agora... — suspirou, esperando ele se aproximar.

Jack chegou reclamando.

 — Como se atreve a ir embora e não avisar ninguém?

— Não avisei exatamente por que não queria discussões como esta! — ele respondeu irritado.

Entretanto, reparou que o amigo vinha como ele. Uma sacola e o arco protegido por um pano pendurado às costas, uma espada presa ao cinto e outra na mão, envolta por uma bainha de couro.

— Tome! — Jack entregou-lhe a espada, — Padre Ralph pediu que as levássemos, ficou preocupado de andarmos nas estradas sem nenhuma proteção.

— Nós? — ele exclamou, — Não precisa vir comigo! E não preciso de proteção, posso muito bem me virar sozinho... E como padre Ralph sabia que eu sairia hoje?

Jack ignorou a primeira frase e respondeu apenas a segunda, começando a caminhar pela estrada.

— Estávamos em um mosteiro, esqueceu-se? É impressionante! Não podemos nem pensar em algo e todos já sabem!

Os lábios de Robert se torceram em descrença e ele voltou a andar, seguindo seu amigo.

— Padre Ralph me conhece bem. E eu disse a ele que não iria ficar parado, esperando Deus me apontar um caminho...

Jack soltou uma risada, — De qualquer maneira, há dois dias que tenho tudo preparado. Ele permitiu que eu o acompanhasse e adivinhei que você sairia nesta madrugada.

— É claro que ele permitiu... — Robert falou em tom amargurado. — "Siga-o e vigie-o, ele é o herdeiro, deve voltar são e salvo, não deixe que ele se meta em encrencas... Mande notícias!" Aposto que foi isso que ele disse!

— Sim! Foi assim mesmo! Não falei que é fácil adivinhar o que os outros pensam dentro de um mosteiro? — Jack brincou e deu mais uma risada contente. Depois, parou de repente, abriu sua sacola de couro e retirou um livro envolto em um tecido que o protegia. — Ia me esquecendo... Ele também lhe enviou este livro sobre plantas medicinais e pediu-me que o avisasse que se algo acontecer com o livro de Galeno, ele não o perdoará por tê-lo roubado — disse e estendeu-lhe o exemplar.

— Roubado? Peguei emprestado apenas! — Robert protestou e corou um pouco, sentindo-se envergonhado como um ladrão pego em flagrante. Porém, suspirou de alívio quando segurou o livro e encontrou uma pequena anotação: "É uma cópia, mas lembre-se que alguém passou meses para fazê-la e se algo acontecer a ela ou ao livro de Galeno, (sim, eu sabia que iria levá-lo, um bom mestre conhece seus alunos), você terá que se haver comigo. E que Deus o proteja!".

Ele guardou o exemplar em sua bolsa de viagem, sentindo o peso reconfortante dos livros transmitirem-lhe uma sensação de segurança. — Obrigado! Na verdade, fico feliz em ter a sua companhia — confessou ao amigo.

— Aonde iremos? Ou vamos apenas caminhar e nos deixar levar por nossos anjos? — Jack perguntou, voltando a andar.

A pergunta fez com que o medo que Robert tentava ignorar desde que decidira partir viesse à tona subitamente.  Seu futuro era incerto. Sem contar que também não tinha nem uma moeda... Ou uma montaria decente! Ele lembrou-se de seu lindo garanhão preto, Bucéfalo, com saudades e respondeu de maneira brusca, — Não sei para onde vou nem o que farei! Mas, com certeza, prefiro não depender de anjos e ser prático; agora vou até o mercado de Sheffield; então decidirei racionalmente, — frisou a palavra — para onde ir.   

— Os anjos também são seres racionais... Se não, como poderíamos confiar neles — Jack argumentou, sentindo-se um pouco ofendido com o comentário dele.

— Tudo bem... Pode me acompanhar! Mas, por favor, não fique falando em anjos na frente dos outros. Iriam achar que somos malucos!

Jack respondeu com um dar de ombros e um sorriso e, juntos, os dois seguiram pela estrada.



CONTINUA... 

Nota da autora: 

A versão Wattpad termina aqui.

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Obrigada aos leitores por terem me acompanhado até aqui. Os comentários de vocês me trouxeram muitos sorrisos e alegrias. Espero que estejam gostando!

Muitas surpresas, reviravoltas e aventuras estarão por vir.


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