1. Ninguém pode te matar melhor do que você mesmo

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02/02/2016

Hemingway teve pneumonia, hepatite, diabetes, câncer de pele, sobreviveu a dois acidentes aéreos, mas, para morrer, teve que se matar. Eu estava relembrando a vida dele enquanto folheava um exemplar de O Velho e o Mar que peguei na biblioteca.

É engraçado, sabe? Sempre pensei sobre como eu iria morrer. Desculpe-me se não é algo que você gostaria de ouvir. Isso costuma deixar as pessoas desconfortáveis, mas é assim que as coisas são. É assim desde que me lembro, e não sei dizer quando começou ou por quê. É algo que ainda estou tentando entender.

Ando pensando muito sobre começos. Sobre quando foi que as coisas começaram a desandar, mas não consigo me lembrar. Às vezes acho que nasci assim e as químicas do meu cérebro nunca funcionaram direito mesmo. Às vezes acho que não é a doença, que é assim que sou; que sempre fui. Mas tentam me convencer de que não é verdade. Nunca sei em quem devo acreditar, se em mim ou neles. É difícil parar de pensar em finais e procurar pelos começos.

Me disseram para colocar os pensamentos no papel, que me ajudaria a entender, e é isso que estou tentando fazer. Mas escrever é complicado, e as palavras sempre me escapam. Na semana passada entrei pela primeira vez no quarto do Théo. Falaram que esse era um passo importante.

Meu irmão também tinha um caderno, quase igual a este. Estou ensaiando ler o que ele escreveu, quero muito algumas respostas, mas me falta coragem. Tenho muito medo do que vou encontrar ali. Muitos meses se passaram desde o que aconteceu, e só espero que as coisas melhorem logo.

Na semana passada, encontrei alguns livros no quarto dele. Acho que estão me ajudando. Ele destacou algumas partes, então estou lendo tudo com calma. Consigo nos enxergar em cada um deles, o que é um pouco assustador. Tenho medo de muitas coisas, mas acho que tenho mais medo de como esses livros me fazem sentir.

Fiz alguns planos agora; disseram que planos são importantes. Comecei a universidade. Acho que Théo gostaria de saber que entrei para o curso de Letras. Não estou muito animado, mas achei melhor fingir. Minha mãe parece mais tranquila agora, não passa toda hora na frente do meu quarto para ver como estou. Está sendo bom passar algumas horas do dia longe dos meus pais e de casa. Estou tentando parar de pensar em certas coisas. Espero que meu esforço valha a pena.


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