DOIS - Parte 3

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Eu não consigo pensar em nenhum cenário em que esse plano de Meje seja uma boa ideia. Se é que posso chamar isso de plano. "Ah, não sei o que fazer, não sei o que tem lá, então deixa eu ir lá ver". Isso é a coisa mais idiota que já ouvi e olha que já fiz muitas idiotices nessa vida que achei que nada fosse superar.

Viro o resto de chá de uma vez, ainda encarando a porta fechada. Não tem estoque de chá de camomila que consiga me acalmar e não vou tomar mais chá de valeriana, porque isso só vai piorar.

O que é que eu estava pensando quando fui atrás de Meje? Que ele ia chegar aqui, dar uma olhada nas coisas e ter uma solução mágica pronta? Merda. Se é para ser honesta comigo mesma, era isso que eu estava esperando. Sempre foi assim. Ele sempre tinha as respostas. Por que seria diferente agora? Mas antes, os problemas eram outros. Eram coisas simples, do meu mundo e da minha vida. Das loucuras que fazíamos.

Eu devia ter pensado melhor, porque é óbvio que não ia ser tão simples assim agora. Se fosse, eu já teria dado um jeito nisso sozinha. Ou, na pior das hipóteses, teria convencido Alessio a me deixar usar seu espelho para falar com Marrein e dado um jeito nisso com a ajuda dela. Mas nem ela conseguiu entender o que estava acontecendo. Por que eu fui achar que um demônio - que Meje - fosse só olhar para a areia e saber como resolver tudo?

Um dos diabretes pula no meu ombro e se esfrega na minha bochecha. Levanto a mão livre e ele se esfrega nela. É. Estou tão ansiosa que até eles já estão notando. Ou seja, hora de fazer alguma coisa, mesmo que não tenha nada útil que eu possa fazer.

Coloco o diabrete no encosto do sofá e me levanto. Já faz quase uma hora que Meje saiu. Tempo demais para ficar parada assim. Não costumo fazer esse tipo de coisa.

Levo meu copo para a cozinha e paro. Tem uma panela no chão, o que explica o barulho que ouvi logo depois que Meje saiu. E meu celular continua em cima da mesa, com duas ligações não atendidas de Vanessa.

É isso. Se Meje demorar demais a voltar - e estou me forçando a considerar que uma hora não é muito tempo para entrar em um mundo desconhecido e identificar tudo o que precisamos, porque coisa demais pode acontecer nesse tempo - eu vou atrás dele.

Pego o celular e volto para a sala. Agora tem dois diabretes no sofá. Droga. Eles sempre se preocupam e não deveria ser assim. Especialmente não comigo.

— Volto daqui a pouco. Não quebrem nada, por favor.

Ou pelo menos nada que seja importante, porque não importa como eu tente guardar as coisas, eles sempre dão um jeito de abrir armários e portas.

Os dois diabretes se encolhem no sofá. Saco. Não posso ficar aqui. Se continuar em casa só vou ficar mais ansiosa e eles vão acabar ficando mais agitados porque vão ficar preocupados e no fim das contas isso tudo vai dar merda.

Pego a sacola de pano que estou usando como bolsa, jogada em cima do armário baixo que está no canto da sala, e coloco o celular dentro dela. Carteira, chave da picape, garrafa de água. Tudo o que eu preciso.

Saio de casa, tranco a porta e levanto todas as minhas defesas ao máximo. Posso até ter decidido confiar em Meje, mas não confio o suficiente para deixar ele sozinho na minha casa. Então, se ele voltar e chegar aqui antes de mim, vai ter que pensar e deduzir onde eu estou - não que isso seja difícil, já que a hospedaria é o único lugar onde ele sabe que eu vou.

O caminho até a hospedaria é rápido até demais, o que não é um bom sinal, porque quer dizer que estou mais distraída do que deveria. Não que isso faça tanta diferença com o trânsito inexistente de Lua Azul, mas eu não posso me distrair. Não assim. Muito menos agora.

Fogo e Névoa (Entre os Véus 3) - DEGUSTAÇÃOΌπου ζουν οι ιστορίες. Ανακάλυψε τώρα