Capítulo I

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A P R I L


O TÃO ESPERADO último primeiro dia de aula do ensino médio. Eu não poderia estar menos animada. No auge dos meus dezessete anos, eu havia acumulado primeiros dias de aula o suficiente para saber que aquele seria igual a todos os outros. Honestamente, eu não entendia o porquê das pessoas idealizarem tanto o ensino médio. Se aqueles eram os melhores anos da minha vida, eu estava fodida.

Não passava das oito da manhã quando eu me sentei no banco carona do Thunderbird. Eu arrumei a saia bem passada debaixo de mim e me recostei no assento de couro, estranhando vestir o uniforme careta depois de um verão inteiro livre de convenções. Atrás da direção, Indy Flemming também parecia sofrer para voltar aos trilhos do padrão disciplinar de St Clair. A loira retirava uma pequena ferradura metálica da cartilagem da orelha — um piercing menor que a unha do meu mindinho, mas que infringia pelo menos duas regras do código de vestimenta.

— Maldito colégio católico — eu murmurei.

— Melhor tirar agora do que ser recebida aos gritos — ela sorriu sem desviar os olhos do retrovisor. — Seria bom não começarmos o ano letivo em pé de guerra com os inspetores.

Mais cedo naquele dia, a loira se juntou à mesa de café da manhã da minha família sem causar nenhuma surpresa entre os presentes. Meus pais dificilmente teriam notado a entrada da hóspede clandestina na noite anterior. A essa altura estava claro que para eles não fazia diferença: Indy era uma figurinha fácil naquela casa, bem-vinda para ir e vir quando quisesse. No último dia de férias, nós duas costumávamos nos reunir para jogar conversa fora e assistir televisão até que a mais fraca caísse no sono.

Ela posicionou as mãos sobre a direção do Thunderbird e olhou para a estrada à nossa frente. Quando pensei que finalmente partiríamos, Indy quebrou o silêncio:

— Tive uma idéia — a loira flexionou os dedos, intensificando o aperto ao redor do volante — Vamos criar uma nova tradição esse ano. Podíamos matar aula ou algo assim.

— Não, não vamos.

Indy havia ganhado esse carro em seu aniversário de dezoito anos e desde então eu contava com uma motorista particular para onde quer que eu fosse. O Thunderbird fazia mais barulho do que um escapamento de caminhão e expelia provavelmente a mesma quantidade de fumaça, mas — para duas adolescentes que só conseguiam chegar aonde o transporte público permitia — o simples fato de sintonizar em mais de duas rádios já era de superar expectativas. E ai de qualquer um que ousasse falar mal do velho Thunderbird na frente da minha amiga.

A loira refreou um sorriso e eu soube que aquele era seu jeito de comprar alguns minutos antes de dar a partida no carro.

— Que mundo é esse que eu tenho que convencer April Wright a matar aula?

— O mundo em que sou matriculada naquela escola — eu olhei pela janela para esconder um sorriso — Tenho que manter as aparências de vez em quando.

A única resposta que recebi foi o ronco metálico do motor ganhando vida. Os dados de pelúcia pendurados no espelho retrovisor se agitaram com o primeiro tranco que o veículo deu para frente, estremecendo junto com toda a lataria do Thunderbird. Ela murmurou um pedido de desculpas para o painel, como se a máquina velha e temperamental pudesse ouvi-la.

— Muda de marcha logo — eu a repreendi — Mais um pouco e o meu irmão vai achar que nós precisamos de uma carona.

Foi uma provocação simples, mas o rosto da menina se acendeu em vermelho, cheio de fúria. Na primeira vez em que viu o velho Thunderbird, meu irmão sugeriu que nós chamássemos um guincho. Simples assim, o garoto entrou na lista negra de Indy Flemming. Para ela, se tornou uma questão de honra proteger aquele carro dos comentários maldosos.

BULLSHITWhere stories live. Discover now