Capítulo XII [PARTE UM]

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H U N T E R


MEU CORPO INTEIRO DOEU quando ela partiu. Minha pele ardia febril e meu sangue corria quente por minhas veias. Eu queimava por ela. Estava prestes a enlouquecer, mas a deixei ir. Eu queria desesperadamente ignorar a razão e ceder a cada um de seus pedidos sussurrados, mas não o fiz.

Havia um bom motivo para tal. Durante nossa pequena aventura no banheiro, eu me dei conta de que poderia facilmente me viciar na sensação do corpo dela pressionado contra o meu. Eu queria satisfazer April, mas fazer isso significaria perder o pouco de controle que tinha sobre ela. Entre tê-la uma vez para nunca mais e prová-la em pequenas e proveitosas doses, a escolha era óbvia. Eu não abriria mão de aproveitar cada segundo que me restava de sua atenção e seria assim até que o desejo se esgotasse de ambos os lados. Era um pensamento egoísta e desesperado, mas era real. Eu a queria. Devagar, por inteiro. De todas as maneiras possíveis. Eu precisava saber que April desejava aquilo tanto quanto eu.

Puta merda.

Mal saí da cama e já estou pensando em putaria.

"Parabéns, Hunter" eu pensei comigo mesmo "Faça exatamente o que todos esperam de você".

Debaixo do chuveiro, eu fechei os olhos com força. Como se não bastasse acordar antes do despertador, a água quente havia acabado. Gelo descia por meu corpo, castigando minhas articulações. Pelo menos, o choque de temperatura serviu para me ajudar a recobrar os sentidos. Saí do banho e vesti minhas roupas no automático, distraído por meus pensamentos.

Eu e April estávamos presos naquele joguinho há quantos dias? Duas semanas? Talvez três?

Isso não significava muito.

No fundo, eu estava fazendo uma escolha inteligente. Seria complicado lidar com um frenesi por uma garota diferente a cada quinzena. Exaustivo até. Aproveitar a fase rebelde de April Wright poderia ser vantajoso em mais de uma maneira para mim — se a menina rica estava curiosa, eu ficaria feliz em apresentar à ela o bom e velho sexo sujo.

Desci os degraus um por um, ouvindo a velha escadaria ranger sob meus pés. Era um som familiar, assim como o ruído estático do rádio da cozinha, sempre ligado na estação de notícias local.

Eu passei minha infância naquela casa. Morava ali há tempo o suficiente para saber qual tábua protestaria se eu pisasse com um pouco mais força. Era uma construção idêntica a todas as outras do quarteirão, espremida entre tijolos e concreto. O bairro residencial crescia verticalmente até no máximo três andares, com direito a jardins estreitos e arborizados. A pequena casa tinha espaço o suficiente para caber todos os quatro membros da família: eu, minha irmã, mãe e avó.

Cheguei na base da escada e inspirei fundo, suspirando logo em seguida. Era dia de bacon com ovos. O cheiro de café se espalhava pela casa inteira, invadindo minhas narinas e me chamando para uma boa refeição.

— Olha só quem acordou — a voz pertencia a Seth Montgomery, meu melhor amigo. De vez em quando eu era obrigado a aturá-lo desde cedo, invadindo a minha casa em busca de comida.

Eu entrei na cozinha fazendo algum esforço para não parecer muito derrotado. Fui cuspido para fora da cama às seis e quarenta da manhã e meu corpo ainda manifestava sinais clássicos de cansaço: passos arrastados, rosto amassado e voz rouca.

— Bom dia — resmunguei seco.

O cômodo estava preenchido por raios de sol, cheiro de bacon e pelo estalar de óleo no fogo.  As paredes brancas eram revestidas de ladrilhos retangulares como tijolos, contrastando com as janelas e os móveis feitos de madeira escura. Havia uma mesa de seis lugares posicionada no centro da cozinha, composta por um conjunto de cadeiras que não combinavam entre si e um tampo coberto por pratos e potes. Sentados ali estavam meu melhor amigo e Julie, a pestinha. Julie tinha quatro anos, cabelos pretos e fazia balé. Ela comia torrada com geléia, se sujando toda. No fogão, minha avó preparava a comida como em todas as manhãs. Minha mãe provavelmente ainda estava no andar de cima, se aprontando para o trabalho — ela trabalhava como enfermeira no hospital do centro da cidade.

BULLSHITWhere stories live. Discover now