Capítulo XVII

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A P R I L

PEQUENOS PEDAÇOS DE CINZAS semi-acesas flutuavam acima de nossas cabeças como flocos de neve, oscilando no vento até desaparecerem no céu noturno. Depois que o sol sumiu no horizonte, não demorou muito para que a temperatura na beira do lago despencasse. Aos poucos meus amigos se juntaram ao redor da fogueira em busca de calor, todos envolvidos por casacos grossos e mantas quadriculadas.

Eu estava tão próxima das chamas que meu rosto começou a ficar quente. A fumaça por vezes se revoltava contra a brisa e agitava meu cabelo, mas nada me incomodava mais que a dor de cabeça. Meu cérebro zunia como uma britadeira e eu me convenci de que aquele só podia ser um sintoma causado pela desidratação ou pelo estresse.

Depois de gritar na cara do Campbell como uma cadela desvairada, eu não dei tempo a mim mesma para me arrepender do que fiz: simplesmente corri todo o caminho até o lago, catei um cobertor limpo e separei um copo. Eu não estava acostumada a perder a calma daquele jeito e Hunter não merecia nem mais um segundo do meu tempo. Ainda mais naquele estado deplorável. Toda vez que algum pensamento insensato sobre a discussão aparecia, eu pegava um alfinete e o estourava como um balão.

Eu estava prestes a descer pelo caminho da autodestruição regado a álcool quando Zoe me achou. Jackie e Indy se juntaram a nós momentos depois, munidas de casacos quentinhos e algumas guloseimas. Permanecemos sentadas no mesmo tronco de árvore caído desde então, a poucos metros de onde o fogo lambia pedaços de papel e gravetos.

Por sorte, o assunto "treinos secretos de futebol" serviu como uma perfeita fonte de distração para minhas amigas.

— Elas fizeram o quê?— eu cheguei a pensar que Indy fosse precisar de alguns momentos para digerir a notícia — E você acha que isso é trabalho da Lexie — ela concluiu ao ler minha expressão.

— Quem mais poderia ser?

Eu não era ingênua a ponto de acreditar que tudo isso fora fruto de uma infeliz coincidência. Minhas suspeitas caíram imediatamente sobre Lexie. Foi como somar dois mais dois: além de pegar no meu pé, ela era a única com a influência e a criatividade necessária para articular aquela façanha.

Para alguns alunos esses pequenos dramas cotidianos faziam a vida valer à pena.

— Eu sempre soube — Jackie meneou a cabeça, partindo um pedaço de marshmallow que se desfazia na ponta do graveto — Ela nunca me enganou.

— Nunca te enganou? — Indy conseguiu abrir um meio sorriso — Menos de três horas vocês estavam conversando como velhas amigas.

Não falei nada quando vi que Lexie havia conseguido conquistar a simpatia de uma das minhas melhores amigas. Eu não queria soar imatura. Antes de conversar com Finch essa tarde, eu ainda não tinha confirmado minhas suspeitas sobre Lexie, mas agora as coisas eram diferentes: eu tinha provas concretas de que aquela garota realmente me odiava.

— Fazia parte do meu plano — ela retrucou antes de lamber um dedo sujo de marshmallow derretido.

— Só admita que ela te enganou, Jacqueline Foster.

Jackie apenas virou o rosto para o lado e nos deu uma bela visão de uma das maçãs perfeitas de seu rosto, recusando-se a admitir que tinha confraternizado com o inimigo.

Aquele pareceu ser o fim da discussão. Logo o estalar do fogo se tornou o único som que nos isolava da festa ao nosso redor. A música escapava dos alto-falantes de um dos carros, onde um pequeno grupo de pessoas se reunia — eu imaginava que a bebida se concentrava ali também.

Ergui meu copo até a boca só para me dar conta de que estava completamente vazio.

— Eu não sei o que fiz para essas pessoas — minha voz soou embriagada. Era como se as palavras estivessem com preguiça de sair da minha boca, se arrastando para fora em um resmungo.

BULLSHITWhere stories live. Discover now