Michael POV
A sensação que antecede a descoberta é interessante. Você sente que está próximo de algo grande, relevante, e caminha naturalmente até isso. Isto é, se tiver nascido com aquela predisposição para o mistério.
Desde criança, eu ansiava por sentir essa coisa, essa sensação. O sabor de desvendar algo era indescritível. Um misto de orgulho com algum outro pecado pelo qual sempre tive apreço.
- O piso é bem antigo - Luke esclareceu, assim que abriu a porta dos fundos de sua casa, que nos colocou direto na cozinha. O piso era de taco, mas parecia ter sido colocado há séculos, portanto rangia a cada passo que dávamos.
Havia uma jarra d'água em cima da pia, vazia, ainda que o copo ao seu lado estivesse pela metade.
Quem?
O silêncio e o breu tornaram a cozinha maior. Como se o cômodo pudesse - e realmente fosse - me engolir a qualquer instante. Minha garganta de repente pareceu mais seca, de forma que a saliva não teve escolha senão acumular-se na boca.
Luke estava de costas para mim, e ele parecia bem mais alto agora. Talvez mais velho. Ou talvez apenas menos inocente. Ele olhou para as portas abertas dos armários pendurados à parede, e sacudiu a cabeça em negativa, parecendo alheio.
Por que?
Como ia dizendo, eu era uma criança esquisita. Ainda loiro natural na época, e de poucos quilos acima da média, isso pouco me destacava das outras crianças australianas. Embora, na hora da recreação, na sala de brinquedos, a coisa mudasse de figura. Que criança optaria por jogar detetive com seis anos de idade? Muito poucas. A maioria apenas pegaria as armas em miniatura para usar nos Max Steel.
Mas eu gostava disso. De desvendar mistérios, montar quebra-cabeças de mais de mil peças, achar padrões, respostas, culpados. A sensação, Deus, como eu a apreciava. Aos treze, a coisa ficou mais séria. Eram rodadas de detetive na varanda de Calum com um cigarro entre os lábios, e as garrafas vazias nos primeiros degraus. O pai de Calum voltaria apenas às onze, de forma que tínhamos horas suficientes para encher a cara enquanto descobríamos o assassino do prefeito.
Ele me guiou pelo corredor sem pressa alguma. Como se esperasse minha investigação visual absorver o máximo possível de pistas no ambiente.
Onde?
Não era possível escutar o som de nenhuma televisão, ou mesmo música. A casa estava no mais completo silêncio, embora eu pudesse sentir olhos fixos em mim o tempo todo. Alguém nos acompanhava aquela noite, eu podia sentir.
- Você disse que morava com sua mãe. - eu comentei, porque não me contentava com investigações sem direito à questões.
Luke pareceu decepcionado, ou ao menos foi o que sua linguagem corporal revelou. Eu não podia ver o seu rosto, já que ele andava à minha frente. Estávamos ao pé da escada para o segundo andar quando ele parou, seus olhos vagando pelas fotos penduradas à parede.
Segui seu olhar até uma foto específica. Luke estava no meio dela, eu podia facilmente identificá-lo, o mais novo entre os três meninos loiros. Um deles segurava uma bola de futebol, e o outro mantinha as mãos no boné de basebol. Apenas Luke parecia detestar estar ali, fazendo uma careta que seria fofa se não fosse...
Suspeita. Tal como tudo nele.
- Nunca disse isso - ele respondeu, num tom que não transparecia nada além de indiferença. Sua mão encontrou o corrimão com leveza, e ele usou o indicador e o médio para caminhar através da extensão do objeto, num ato estranhamente infantil para sua personalidade. Seus olhos fixos nos dedos, ignorando minha presença. - Mas, sim, eu moro com ela.
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HQiller ☂ [Muke Clemmings]
FanfictionMichael é um viciado em quadrinhos que tem algumas teorias a respeito do serial killer à solta em Sydney. A começar pelo fato de que o tal assassino teria alguma influência no épico vilão de Batman, Pinguim. O que ele não sabe, é que talvez seus pal...