Kartini e Isabella são mulheres bem diferentes.
Se Kartini era negra, militante e feminista ativista, Isabella era uma princesinha, sonhando com seu conto de fadas e vivendo um amor com um verdadeiro príncipe encantado. Kartini gostava de Marx, rap...
"É o ato de questionar a sociedade em que vivemos, as expressões que usamos, a forma como falamos sobre determinados assuntos. É discutir para entender se algo é "politicamente correto" ou se fere a dignidade de uma pessoa (ou uma instituição)."
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A festa na casa de Vênus tem mais gente do que achei que teria. E acabamos nos reunindo no terraço do prédio do namorado dela, cada um com seu grupo normal de afins, embora todos se encontrem vez ou outra quando vão pegar uma bebida. Eduarda e eu estávamos observando as pessoas que já estavam ali, enquanto bebíamos.
Não parecia nada promissor.
— Porra, só tem aluno de psicologia aqui – reclama Eduarda – Estou sentindo minha mente ser invadida.
— Esses alunos são imbecis demais para bancarem o Xavier, Duda, relaxa – reviro os olhos.
— Adoro como você defende seu próprio curso.
Dou de ombros.
O curso de Psicologia na UFBelo é tão elitizado que era difícil, mesmo, defender. Conseguia salvar umas poucas pessoas como suportáveis, e menos ainda como alguém para se ter contato. Vênus era uma delas, claro. O que é uma ironia e tanto, se considerarmos que a garota devia ser uma das mais ricas da sua sala, e, pior do que isso, namorava um dos caras mais ricos da cidade.
— Já te falaram que você é muito chata? – Duda se encostou na pilastra atrás de si – Você já deu chance pra alguma dessas pessoas?
Não preciso olhar de novo para ver.
A maior parte deles me olharam torto por mais tempo do que eu gostava, quando cheguei na cidade, e abriram uma frente de crítica ainda pior quando comecei a me posicionar nas aulas do curso. "A negra problemática" era o que a maioria deles diziam, em sua pose de quem ainda gosta de manter uma Casa Branca que devia ter acabado com a abolição da escravidão. A "moreninha que se acha preta" é outra parte dos adjetivos, como tentativa de manter a Senzala mental de que devo me subordinar a eles.
Ser negro e fazer faculdade é viver, constantemente, numa solidão que a maior parte das pessoas não compreende. A solidão é uma merda, porque deixa a gente não só insegura, como paranoica.
E, claro, seria eufemismo dizer que isso não era nada bom.
— Algumas – inclino a cabeça para o lado – Mas pelo menos não há muitos esquerdomachos – levo o copo de cerveja a boca – Acho que nunca te perguntei como você acabou se tornando amiga de Vênus. Quer dizer... é inusitado, no mínimo.
— Imagina se você soubesse que uma das minhas melhores amigas é herdeira do clã Vale – Eduarda revira os olhos e eu arqueio a sobrancelha – É uma longa história. Mas eu me aproximei primeiro do Pedro – ela aponta a cabeça para ele, que acabou de aparecer na porta do terraço – Meu TCC foi sobre a narrativa sobre o feminino na mitologia. Um professor do curso de Letras me indicou ele, para tirar umas dúvidas. Mas depois disso aconteceu tantas tretas... sério, você não vai querer saber.
