*** capítulo sem correção ortográfica ***
Nuno
Olho pela janela da pequena cafeteria que fica na Avenida Guido D’Agostinni em homenagem ao meu avô e um dos fundadores da cidade, não é a mais bonita, nem mesmo a maior, mas com certeza é a mais movimentada da cidade e também a minha favorita, venho aqui desde que era criança, a lembrança do bolo com chocolate quente são uma das mais fortes da minha infância.
Ivan sai do banheiro secando as mãos na calça jeans, seu cabelo tá molhado e esquisito e penso por um instante se devo ou não avisar, mas esse é o Ivan e sinceramente ele não liga muito para essas coisas.
— E ai. — ele senta no banco a minha frente e retira o celular do bolso, observo seus dedos se movendo rapidamente na tela, provavelmente marcando de encontrar alguém na Boca do Diabo, a clareira onde vai ser a festa de hoje. — Tem certeza que não quer ir?
— Tenho, tô de boas hoje. — Baixo o olhar para o guardanapo em minhas mãos e começo a picota-lo.
— A Cindy já está lá. — ele diz ainda digitando. — Tá perguntando se você não vai.
Cindy é nossa amiga desde que me lembro, linda, loira, arrogante, rica, mimadinha, é o sonho de consumo de metade dos homens dessa cidade. A outra metade ela já pegou.
— Sem chances.
— Ela disse que a Gabi tá perguntando de você. — ele ergue seus olhos da tela.
— Ivan... — olho para meu amigo implorando mentalmente para ele nem começar, para minha sorte ele parece entender e desiste de tentar me fazer sair essa noite.
— Ah que merda, você também é foda viu. — ele resmunga enquanto passa a mão no cabelo piorando a situação que já estava ruim.
O problema é que apesar de saber que vai ser legal, que a maioria dos meus amigos estarão lá e de as chances de me dar bem essa noite são grandes, eu não estou no clima para festas. Principalmente a parte em me dar bem.
Gabi é linda e gostosa pra caralho, mas o sexo foi tão morno que em alguns momentos tive a sensação de estar sozinho na cama. Nossa química foi tão ruim que demorei uma eternidade para gozar e quando tudo acabou, cada um se vestiu em silencio, saímos do quarto como se fossemos dois estranhos e desde então tenho evitado encontra-la, sinceramente não sei como agir quando vê-la novamente. Sei que parece meio covarde da minha parte mas que se foda, não tô dando muita atenção para isso no momento, não fui e nem serei um babaca com ela, apenas não tô pronto para esse encontro, não por enquanto.
Tento ignorar esse fracasso, todos os dias digo a mim mesmo que tudo bem não ter dado certo, nem todas as pessoas conseguem sentir a mesma conexão uma pela outra, não significa que um de nós tem algum problema, só não temos química.
Tudo bem, talvez eu esteja com algum problema, deve ser o estresse e a ansiedade pelas coisas que estão por vir, ando agitado e dormindo mal e tenho certeza que isso está influenciando meu desempenho. Tenho certeza que é isso, é só uma fase, vai passar. Não tem absolutamente nada a ver com uma tal garota que me fez enlouquecer apenas com as suas mãos em um beco escuro.
Não, absolutamente nada a ver.
— Certo, então vou indo. — Ivan se levanta, mas continua olhando para mim com uma cara de piedade que está me fazendo ter vontade de soca-lo.
— Vai lá, divirta-se e se cuida.
— Tem certeza que vai ficar bem aqui sozinho?
— Sim, você sabe que vou e não tô sozinho. — aponto para o salão cheio e meu amigo me mostra seu dedo do meio.
— Certo... — ele olha para o balcão, depois olha para o lado de fora no instante em que mais um carro para na frente da cafeteria.
— Se manda caralho. — Resmungo e ele finalmente começa a se mexer.
— Qualquer coisa me liga. — Ele diz mesmo sabendo que não vou ligar, eu morreria antes de encher o saco do meu amigo por uma besteira.
Ivan acena para Beth que está no caixa e bagunça os cabelos da garotinha que está pulando no meio do salão antes de abrir a porta da cafeteria. Lá fora um grupo de pessoas estão se preparando para sair, conheço a maioria deles, já sai com duas das garotas que estão sentadas no capô de um Ix35, em uma noite normal eu estaria lá com eles, com um baseado na boca e uma garrafa de vodca na mão, mas hoje não, hoje só quero ficar aqui, comer meu pedaço de bolo, tomar o chocolate quente, mesmo estando uma noite fresca e ficar sozinho com meus pensamentos.
Hoje é dia de lembrar.
— Noite animada. — Beth diz pouco tempo depois, enquanto vemos os carros se afastarem e o silencio inundar a rua a nossa frente.
— Sexta feira né.
— Pois é, algumas coisas não mudam nunca. — Ela sorri enquanto empurra o prato com o pedaço generoso de bolo na minha frente. — Será que eu errei alguma coisa nessa receita? Não me recordo a última vez em que você não comeu um bolo meu.
— Você não erra nunca, o problema sou eu. — Admito.
— Esse problema tem a ver com garotas ou o motivo é o dia de hoje?
Pego um pedaço do bolo e coloco na boca, como disse, está delicioso, mas parece areia quando desce por minha garganta.
— Nenhum dos dois, você sabe, já faz tanto tempo.
— Sim, seis anos é bastante tempo quando se é tão jovem.
Balanço a cabeça concordando com ela, seis anos e mesmo assim a dor parece igual, como se nenhum dia tivesse passado, imagino que para ela não seja tão diferente, acho que perder alguém que se ama nunca é simples, nunca passa, nunca.
Conversamos mais um pouco sobre dor, saudade, lembranças, ela me faz rir quando conta algo do qual eu não me lembrava sobre ele e o tempo passa sem que eu me dê conta. Rael, seu filho, se junta a nós, a cafeteria vai se esvaziando aos poucos, até que sobram apenas eles e eu.
— Acho que vou indo. — Digo me levantando.
— Deixa eu pegar o bolo da sua mãe. — Beth também se levanta e vamos até o balcão.
— Aqui está. — Ela me entrega a sacola e dessa vez nem tento pagar, ela se recusa a receber meu dinheiro no dia de hoje, é seu jeito de me dizer que ela sente muito e eu agradeço.
As vezes tudo o que a gente precisa é saber que alguém zela por nós.
Despeço-me dos dois e saio.
Mais uma noite.
Mais um ano.
ESTÁ A LER
NUNO
RomanceAs vezes a vida encontra uma forma engraçada de fazer a gente encontrar a pessoa certa. Um desvio no caminho de casa, um atraso por culpa do despertador, uma ligação errada. No meu caso foi um desafio, minha irmã disse que eu não sabia viver, só me...