CAPÍTULO 2 - QUINTA-FEIRA

6 1 0
                                    

1

Por muito tempo Davi quis ingressar na polícia civil e neste dia completa uma semana que ele conseguiu o que tanto queria. As rondas militares, principalmente pela madrugada, são tranquilas, no entanto cansativas pelo fato de não conseguir dormir direito durante o dia com tanto barulho lá fora, principalmente quando resolve passar a manhã com seu enteado no parque, que fica em frente à delegacia, até a hora da aula. Agora, sempre que chega do trabalho, o garoto também acabou de chegar da escola e eles podem passar o final da tarde juntos e mais a esposa até a hora de dormirem, tendo a paz da noite inteira para descansar como se deve. Para Davi está perfeito.

Bem, não tão perfeito. Os dias são mais agitados do que as noites. Mesmo uma cidade pequena e organizada como esta possui seus problemas de ordem. Se antes seu trabalho limitava-se em cuidar dos vagabundos que saem à noite para picharem, drogarem-se e fazerem arruaças, além de algumas confusões domiciliares que resultam em brigas e até ferimentos graves, agora passa a ser crimes de assassinatos e roubos que já aconteceram e exigem o máximo dele para descobrir uma coisa passada. Mas como o passado não mostra as respostas de forma clara e objetiva como o presente, ele precisa, conversar com as testemunhas, coletar os fatos e depois sentar-se para quebrar a cabeça em cada um dos mínimos detalhes. Trabalho esse que ele trocaria por mais uma ronda, sem pestanejar. Principalmente quando entra alguém na delegacia gritando ensanguentado pelos seus direitos ou uma pessoa irritada e com pressa para dar queixa de algum roubo. Tudo isso sempre acaba distraindo sua atenção dos serviços investigativos. À noite, pelo menos, não havia muita dessas perturbações para lhe tirarem a atenção. E por ironia do destino, hoje não está sendo diferente. Neste instante acaba de entrar na delegacia uma mulher com um olho completamente inchado e a boca sangrando, além de haver muito sangue nas pernas da calça.

Ela caminha quase se arrastando até que chega ao centro da recepção, ali se estaca e grita por socorro. Ao verem a situação da mulher e já prevendo o resultado daquela cena, os policiais vão rapidamente ao seu auxílio enquanto ela se solta no ar, deixando-se cair à própria sorte e sendo amparada nos braços de seus anjos salvadores que a pegam a tempo, antes que tombasse no chão por completo. Um dos policiais que a segurou diz que a levará ao hospital. Imediatamente Davi se interpõe dizendo que irá junto, pois precisa sair um pouco da delegacia antes que enlouqueça. Logo ele pega a moça junto com o policial que está com ela e a colocam na viatura. Assim que chegam ao destino deles, gritam por um médico.

Dois enfermeiros aproximam-se com uma maca e a levam para a emergência. Logo na sequência aparece um dos médicos do hospital e Davi o olha sentindo o conhecer de algum lugar. Seus olhos o perseguem fixamente, intimidando o doutor que acaba por sentir o peso do olhar sobre ele.

— Bem, agora é sentar e esperar para podermos pegar o seu depoimento – comenta o policial que olha o hospital.

— Como é? – Davi parece acordar de um sonho antigo.

— Ah, esquece. Venha, vamos ver onde conseguimos um café bom até ela poder conversar conosco.

2

Dentro de uma das salas de emergência uma luta é travada para que a paciente não morra. Enquanto uns tentam parar a hemorragia entre suas pernas, o cardiologista luta para que ela recobre os sentidos. Seu coração está muito fraco, quase parando, mas isso é algo que ele não permitirá que aconteça.

— Vamos, mocinha! Vamos! Você não vai morrer aqui e no meu turno sem que eu assim queira. Na minha presença ninguém parte sem vida sem a minha permissão. – Roberto usa de todos os artifícios médicos para estabilizar os sinais vitais da mulher. — Aqui comigo, na morte MANDO EU, então trate de recobrar a consciência JÁ!

Sob os olhos da MorteOnde as histórias ganham vida. Descobre agora